As Moedas do Além

Num antigo casarão em Córdoba, há muito tempo viveu uma família muito abastada que tinha uma filha pequena. A menina era extremamente mimada e caprichosa e tinha várias criadas à sua disposição.

Uma noite, enquanto a pequena burguesa dormia, escutou uns barulhos estranhos no corredor. Intrigada, decidiu investigar o que se passava. Levantou-se, abriu lentamente a porta de seu quarto e olhou o corredor que comunicava os quartos.

Aquele corredor, assim à noite, tinha um aspecto realmente tétrico. Era muito comprido e escuro. O chão era revestido por grossos e pesados ladrilhos de mármore, amplos e vistosos. As paredes eram decoradas com diversos quadros que, ao invés de embelezar o ambiente, só o deixava mais carregado e mórbido.

A menina foi andando pelo corredor e, ao final, viu algo estranho: um menino levantando uma daquelas placas de mármore do chão e jogando algo dentro do buraco que havia no solo. Esse garoto era mais ou menos da idade dela. Sua pele era escura como a de um índio, e estava muito suja. Os cabelos negros estavam tremendamente embaraçados. Ele estava descalço e trajava andrajos. Toda aquela aparência miserável daquele garotinho contrastava bruscamente com o luxo daquele casarão.

A espantada garota não podia crer no que seus olhos viam. Um calafrio percorria sua espinha de cima a baixo. Contudo, o que a assombrava não era a estranha aparição à sua frente. O motivo de seu espanto era outro, e se deu quando a tênue luz que entrava pela janela revelou o que havia nas mãos do misterioso visitante: moedas de ouro! Sim, brilhantes e valiosas moedas de ouro maciço, que brilhavam em raios vivazes.

O intruso parecia ignorar totalmente a presença da menina que lhe observa, estancada no corredor. Sem o menor abalo, recolocou a placa de mármore no lugar e saiu, desaparecendo da mesma forma como tinha aparecido.

Eufórica, a menina, a passos rápidos, se dirigiu ao local precioso. No mesmo instante, apareceu uma das criadas, com uma vela enorme. Ela também havia presenciado o que se passou e queria tirar proveito disso.

As duas decidiram que não diriam nada a ninguém. Ficou combinado que todas as noites voltariam ao local e com a ajuda da luz da vela, levantariam aquele ladrilho e retirariam todas as moedas, gota a gota, até esgotá-las.

Assim, todas as noites as duas se encontravam ali. A menina, pequena e franzina, prontamente se metia naquele oco no solo e ia dando as moedas à criada, que com muita destreza e empolgação ia guardando tudo em um enorme saco.

As noites passavam e aquele tesouro parecia não acabar nunca. Cada noite que passava, a vela ia se consumindo mais e mais, e elas nem percebiam. Por outro lado, as moedas continuavam saindo a pares e as duas gananciosas não queriam deixar nenhuma para trás.

Foi então que numa noite, em meio ao seu incessante trabalho, a vela começou a piscar, dando seus primeiros sinais de esgotamento. Foi então que a criada disse:

- Saia desse buraco, senhora. Já temos ouro de sobra!

A menina prontamente seguiu o conselho da criada e abandonou o esconderijo. Porém, no ultimo momento, uma moeda caiu do saco, indo parar no buraco. Assim, em um gesto de avareza e sem pensar duas vezes, a menina se meteu de novo no buraco. A criada, aflita, tentou agarrá-la, mas não conseguiu. Gritava desesperada:

- Por favor, saia daí e deixe essa moeda!

Dessa forma, em meio a toda essa gritaria, a vela terminou de se extinguir. No justo momento em que o ultimo raio de luz saiu da vela, diante dos olhos arregalados da criada, a placa de pedra moveu-se sobrenaturalmente e fechou aquele buraco no solo, deixando a menina dentro.

Assustada, a criada decidiu não dizer nada a ninguém. Os pais deram a filha por desaparecida e o assunto foi-se esquecendo com o tempo.

Entretanto, ainda hoje, dentro daquela casa, à noite ainda é possível ouvir os gritou de socorro da menina, que se repetem noite após noite no corredor:

- POR FAVOR!!! SOCORRO!!! TIREM-ME DAQUI!!!

A polícia já tem acudido dezenas de vezes, ante as chamadas de vizinhos que escutam a desesperada voz pedindo ajuda. Mas ao chegarem ao velho casarão, a única coisa que sempre têm encontrado é uma vela velha e consumida, posta bem no centro de uma placa de mármore...

* Essa é uma tradução de uma famosa lenda hispânica. Adicionei mais detalhes para deixar a narrativa mais interessante.

Dama dos Mistérios
Enviado por Dama dos Mistérios em 27/11/2009
Código do texto: T1947887
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