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•Tânia Linhares, mãe de Jonas Linhares Filho.
    “Meu filho sempre foi muito quieto. A gente achava aquilo tudo muito estranho. Não tinha muitos amigos e vivia assistindo televisão. Com dezoito anos ele começou a trabalhar numa loja de roupas. Não ficou um mês no emprego. Brigou com um cliente e o feriu gravemente. O cliente o ofendeu. Apesar de quieto, Jonas sempre foi muito explosivo...”
 
•Jonas Linhares Souto, pai de Jonas Linhares Filho.
    “Quando o Jonas fez quinze anos ele queria morar sozinho. Parece besteira, mas seu ideal de vida perfeita era ter uma casa, uma televisão imensa, um sofá confortável e ninguém para atrapalhá-lo enquanto assistia televisão. Não podíamos deixá-lo morar sozinho por conta daquele comportamento dele.Mas devido as constantes brigas entre eu e minha ex-esposa, e o evento desagradável na loja de roupas,misturados com um histórico de confusões explosivas, Joninha saiu de casa aos dezenove anos. Achávamos que aquele lugar seria a solução para os problemas dele. Que se ele sentisse seu sonho realizado, pelo menos por hora, melhoraria seus problemas. Só que os problemas só estavam começando...”
 
•Tânia Linhares, mãe de Jonas Linhares Filho.
   Era cercado de amigos quando pequenininho...”
 
•Jonas Linhares Filho.
    “Desde cedo eu queria morar sozinho. O clima em minha casa não me agradava. Constantes brigas e agressões entre meus pais estavam me fazendo pirar. Eu precisava sair de casa logo, ou iria enlouquecer. Nunca fui de ter amigos. Se eu tivesse uma boa televisão e algum filme bom para assistir, eu ficava tranqüilo. Mas não havia mais silêncio. Não havia mais calma naquela casa. Meu pai bebia, minha mãe o agredia quando tinha que buscá-lo na sarjeta, completamente bêbado e empapado no próprio vômito.”
    “Me restava sentar no quarto e ficar ouvindo MP3. Mas nunca deixei minha vontade de morar sozinho de lado. Tanto que comecei a trabalhar em uma loja de roupas, o salário era bom, dava para manter sem a ajuda de meus pais. Queria esta independência. Não depender do dinheiro dos outros. E precisava dar o primeiro passo. Pena que não fiquei muito naquela loja. Por não me dar muito com os funcionário, todos adolescentes metidos à modelos, cambada de escrotos, meu humor ficava alterado. Como eu ficava uma bomba de tempo curto, qualquer cliente chato me irritava mais do que o normal. Um, em especial, me tirou do sério. Eu trouxe diversas camisas, todas escolhidas por ele, porém o cara sempre negava, sempre dizia que não havia gostado. Aquilo foi me dando nos nervos. O cara estava a fim de me chatear. Foi então que peguei aquele bolo de roupas e joguei contra seu rosto. Ele reagiu pulando para cima de mim. Me acertou um soco no rosto. Eu o empurrei contra o espelho do provador e soquei a cara dele. Foram preciso mais do que aqueles jovens idiotas para me segurarem. Quase matei aquele filho da puta.”
    “Meus pais não gostaram da minha atitude, e a polícia também não. Foi então que minha mãe resolveu me dar um quarto. Meu sonho estava se realizando. Foi em novembro que cheguei ao apartamento. Era pequeno. Não havia janelas. Apenas um basculante que me dava a visão de uma outra janela cinza de vidros escuros e cianóticos. Tinha uma escrivaninha, uma televisão de vinte e nove polegadas acoplada à um aparelho de DVD de uma marca sem muito nome no mercado. Mas eu estava satisfeito. Eu teria meu silêncio. Eu teria minha privacidade. E por um mês eu não pretendia sair de casa.”
    “Antes de sair de casa, gastei meu primeiro e último salário em comida e filmes. Comprei uns quinze DVDs, a maioria filmes de ação e terror. Comprei até clássicos dos gêneros, como “A Hora do Pesadelo” e os primeiros três filmes do Jason. Estava ansioso para chegar em casa. Meu pai me levou de carro. Me deu um beijo na testa. Seu olhar estava estranho. Parecia triste. Foi então que um homem se aproximou. Alto, forte, se identificou como o porteiro, seu nome era Magno. Abracei meu pai rapidamente. Iria pular dentro do quarto de alegria por sair de casa. Por não ter que aturar aquela merda daquela família.”
    “O homem me levou para o quarto. Era perfeito. Eu poderia me fazer ali. Ninguém iria me atrapalhar. Larguei minha bolsa de roupas sobre a cama de solteiro confortável, e me sentei sobre ela. Do outro lado, coloquei a sacola da loja onde havia comprado meus filmes e algumas comidas de rápido preparo. Se eu tivesse amigos, eles estariam se contorcendo de inveja. Quem mais, aos vinte anos, estaria morando sozinho. Tudo bem que meus pais estariam pagando o aluguel. Nesse ponto tive que deixar meu orgulho de lado. Valia mais morar sozinho do que meu orgulho. Magno saiu do quarto. Ele parecia se importar comigo. Provavelmente meus pais o haviam mandado ficar de olho em mim. Odiava aquela super-proteção deles. Tudo bem que meu comportamento é inflamável, mas eu nunca faria nenhuma loucura. Ou simplesmente não ficaria louco. Agora eu estava aonde queria estar, e meu humor ficaria melhor com certeza.”
 
•Magno Vicente Novaes – “Porteiro”
    “O Jonas era um rapaz tranqüilo. Pelo menos na primeira semana ele não deu problema. Dormia cedo, ficava no quarto o dia inteiro. Quando eu achava tudo muito quieto, eu ia até o quarto ver se precisava de alguma coisa. Certa vez ele simplesmente estava sentado na escrivaninha olhando para uma folha de papel. Saí do quarto e o deixei lá parado. Gostava daquele rapaz. Mas chegou uma hora que as coisas mudaram...”
 
•Jonas Linhares Filho.
    “Eu estava adorando aquela vida. O silêncio era enorme. Mas certa noite algo aconteceu. Dizem que é no silêncio que ouvimos as piores coisas. Principalmente durante a noite. Era sexta-feira e eu não conseguia dormir. Havia acabado de assistir “A Chave Mestra”, filme legal sobre espíritos escravos e rituais de magia negra. Não sinto medo de filmes de terror. Eu os adoro! Mas naquela noite, algo estava estranho. Deixei a luminária acesa. E comecei a escrever. Meu braço estava doendo mas eu precisava escrever alguma coisa. Gostava de escrever sobre filmes. Escrevia para eu mesmo ler. Depois guardava na gaveta embutida na cama de solteiro. Naquela noite, eu não conseguia dormir e nem escrever. E, para variar, a tinta da caneta estava acabando. Foi então que ouvi algo vindo de dentro do guarda-roupa. Pensei ter ouvido coisas, ou que simplesmente fosse a madeira se dilatando. Fazia muito calor e, provavelmente a madeira estaria se dilatando. Foi então que ouvi algo quase próximo ao meu ouvido. Virei o rosto no momento exato e pude ver uma espécie de vulto passando para dentro do banheiro. Me levantei devagar. Algo caiu da mesa mas não liguei. Continuei andando na direção do banheiro. Somente a luz da lamparina próxima da cama iluminava o lugar. O chão de madeira rangia enquanto eu andava, ou seja, o que quer que estivesse no banheiro, saberia que eu me aproximava.”
    “Andei até a porta e parei. Um vulto passou próximo a mim outra vez, acompanhado de uma voz rouca repetindo meu nome e sorrindo. Virei-me na direção da voz, e me assustei ao ver algo atrás de mim no espelho. Não pude identificar, mas era um homem. E parecia que ele saía de dentro do espelho e caminhava na minha direção. Caminhava sorrindo e tendo alguns tiques. Seu pescoço ficava estalando e suas mãos vinham na minha direção, esticadas como a das múmias dos filmes. Aquilo segurou no meu pescoço e começou a me enforcar. Eu não conseguia gritar. Aquela sombra estava me suspendendo no ar e eu não conseguia alcançar o chão com meus pés. Balançava-os a fim de fazer barulho. Aonde estaria o porteiro? Estava quase desacordando quando o monstro me soltou. Caído no chão comecei a me arrastar por ele na direção da cama. Me escondi sob os lençóis. Aquele silêncio estava assustador. A luz do quarto se apagou. Pude ouvir o barulho da luminária caindo no chão. O silêncio continuava. Estava agoniado. Não sabia se aquilo estava se aproximando. Senti algo quente na minha nuca. Me virei devagar e pude ver o rosto da criatura. Um rapaz com um enorme corte no pescoço e olhos fundos. Suas veias saltavam das suas mãos e um hálito podre saía daquela boca com dentes esverdeados e cobertos de um tipo de musgo. Foi aí que desacordei.”
 
•Tânia Linhares, mãe de Jonas Linhares Filho.
    “Quando o Magno ligou lá para casa no meio da madrugada dizendo que o Jonas havia tido um ataque e estava desacordado, minha primeira vontade foi tirar meu filho daquele local. Mas não pude. Antes de ir até lá, recebi um telefonema nada bom. Pelo menos naquele momento, eu não poderia tirá-lo daquele quarto.”
 
•Jonas Linhares Souto, pai de Jonas Linhares Filho.
    “O Magno nos informou que encontrou meu filho caído no quarto e com os braços cheio de manchas roxas. Parecia que alguém o tinha agredido. Quando cheguei no local, a vontade que tive era de tirar Jonas de lá. O quarto se encontrava em estado deplorável. Fedia a esgoto e havia papéis espalhados pelo chão. Coisas estranhas estavam acontecendo naquele lugar, e depois, conversando com meu filho, ele me disse que havia sido assombrado por alguma espécie de fantasma irritado. Eu sempre acreditei em fantasmas. Às vezes tinha a impressão de que alguém me observava. Mas achei que Jonas estava impressionado com os filmes que assistia. Morando sozinho, esses filmes deviam o deixar mais impressionados ainda. Quando contei o que havia acontecido. Ele começou a tentar fugir. Queria correr. Jonas reagiu assim após eu contar que o rapaz qual ele havia agredido na loja, morrera durante a madrugada no quarto do hospital que estava internado. Meu filho chorou muito naquela hora, mas não parecia arrependido. Acho que tinha certeza de que o rapaz estivera no quarto naquela noite, e queria vingança contra ele por tê-lo assassinado. Já contei que quando novo somente eu via um homem velho fumando cachimbo no quintal de minha casa?”
 
•Tânia Linhares, mãe de Jonas Linhares Filho.
    “Eu sinto pena do Jonas. Queria ter dado uma vida melhor a ele. Acho que nossa superproteção de tentar não deixá-lo interagir com o mundo desencadeou aqueles problemas todos. Tínhamos medo da violência. O Rio de Janeiro estava entregue às gangues. Pessoas morrendo, tiroteios em plena luz do dia, aquilo tudo estava deixando eu e meu ex-marido angustiados. Crescemos em um estado tranqüilo. Podíamos ficar na rua madrugada à dentro sem nos preocuparmos. Nos mudamos para um condomínio fechado na Barra da Tijuca. Cercado de muros eletrificados e com tudo à nossa disposição. Tinha até um shopping lá no prédio. Apesar disso tudo, acho que atrapalhou o desenvolvimento dele. Por isso ele era tão complicado. Por isso me sinto tão culpada pelo rumo que as coisas tomaram.”
 
•Magno Vicente Novaes – “Porteiro”
    “O dia mais estranho que vi Jonas, foi quando ele me disse que estava escrevendo um conto de horror. Nele, um rapaz era aprisionado em uma cisterna. Um homem o observava e assistia ele se afogando aos poucos com um enorme sorriso. Uma história completamente sádica como podem ver. Nunca gostei de filmes de terror. Acho que há pessoas que são muito sugestionáveis. Como aquelas que assistem filmes de tiroteios e depois pegam uma arma e correm para um cinema. Há doidos por aí. Mas Jonas era estranho. Ele me convencia de que tudo aquilo poderia ser verdade. Como da vez que disse que homens entravam em seu quarto...”
 
•Jonas Linhares Filho.
    “Eu não estava conseguindo dormir direito. Magno,à pedido de meus pais, às vezes me trazia alguns calmantes. Aquele quarto estava me deixando louco. Era comum eu me virar subitamente e ver alguém na janela, alguém se olhando no espelho,e, o mais comum, ver um homem com um corte no pescoço me encarando com um olhar de ódio, esperando apenas eu dormir para me enforcar outra vez. Meu passatempo era escrever com minha caneta Bic de tinta vermelha. Adorava a cor vermelha. Além da cor da paixão, era uma cor insinuante. Uma cor que na medida certa poderia deixar assustado.Eu escrevia sobre um rapaz mantido preso em uma cisterna por um maníaco. Mas não saía nada da minha cabeça. No começo as cenas vinham na minha cabeça e eu só passava para o papel. A história aparecia como um filme de suspense sádico. Eu estava escrevendo bem, só que aquelas vultos estavam me atrapalhando. Eu precisava aprender a ignorá-los. Certo dia...”
 
•Magno Vicente Novaes – “Porteiro”
    “Certo dia o Jonas disse que as coisas no quarto haviam sumido. Mas sumido mesmo. Desapareceram dando lugar a um cômodo branco, vazio e claro. Tudo que ouvia eram passos no corredor lá fora. Ali eu vi que ele tinha problemas...”
 
•Jonas Linhares Filho
    “Não havia simplesmente nada no quarto. Somente o papel aonde escrevia estava ali na minha frente. Senti meus pés se molharem. Olhei para baixo e algo estranho acontecia. Meus pés estavam cercados de cadáveres boiando de barriga para baixo. E o volume da água ia subindo. Olhei para o banheiro e pude ver a pia aberta. Levantei para ir desligá-la, mas ao pisar no chão, afundei. Algo impossível para quem ouve, mas aconteceu. Era como se uma simples poça d’água tivesse cem metros de profundidade. Eu ia afundando e os cadáveres me segurando. Todos machucados, todos furiosos com alguma coisa. Em certo ponto, começaram a surgir animais mortos e mutilados. Vi meu cachorro Lego. Ele morreu atropelado. Sem querer o atropelei. Mas ele andava estranho. Estava avançando em todo mundo. Eu não o achava mais legal. Foi uma ironia do destino.”
    “Senti que estava chegando à superfície e não afundava mais. Quando coloquei meu rosto para fora da água, não estava mais no quarto. Pelo menos não parecia meu quarto. Não havia mais o chão de madeira, nem minha escrivaninha. Havia apenas uma mesa de alumínio. Resto do quarto estava branco. Como o maldito quarto de um hospital. Comecei a vomitar, e tudo que saía de minha boca era água. Um liquido amarelado começou a sair também. Não conseguia parar de vomitar. Os cadáveres estavam todos sentados. Eram zumbis me observando e aplaudindo. Parecia que eu vomitar daquele jeito era uma porra de uma peça de comédia. Eles sorriam mostrando seus dentes podres. Eu queria gritar, mas não conseguia parar de vomitar. Até sangue começou a escorrer dos meus olhos.”
    “Dois homens se aproximaram de mim. Eu tentava pedir a ajuda e gritar, porém a voz não saia. O som que saía era o de um gargarejo. Se aproximaram e entrei em pânico ao ver que seguravam seringas com um conteúdo amarelado, do mesmo tom do líquido viscoso que saída da minha boca. Um deles me segurou enquanto o outro me perfurava com uma agulha enferrujada. ‘Não vamos te machucar, Jonas.Estamos aqui ´para ajudá-lo’. Não fiquei calmo quando disseram aquilo. Ás vezes pessoas falam coisas boas só para nos fazer o mal. Comecei a me debater. Estava me sentindo cansado. Meus olhos pesados. Eles provavelmente haviam me drogado.”
 
•Jonas Linhares Souto, pai de Jonas Linhares Filho.
    “Eu sempre quis o bem do Jonas. E colocá-lo naquele quarto foi uma tentativa de salvá-lo daquele mal que o acometia. Ele sempre fora muito criativo. Sempre gostou do gênero de filmes de terror. Eu não entendi aquele interesse por filmes assim. E até hoje não sei explicar. Quando criança, ele corria para nossa cama no meio da noite. Tinha pavor ao Freddy Krueger. Mas eu achava tudo aquilo normal. Depois de grande, ele não dormia mais. Assistia aos filmes e não dormia. Magno disse à ele que naquele quarto, um assassino em série havia morrido após matar mais de vinte e cinco pessoas. Acho que aquela história não o fez bem. Mesmo quase acreditando que ele poderia estar sendo assombrado por fantasmas dessas pessoas, eu sabia que era algo mais sério, algo mais real...”
 
•Jonas Linhares Souto, pai de Jonas Linhares Filho.
    “Eu fui a primeira a chamar a atenção do Magno. Ele estava ali para ajudar e não tornar as coisas ainda piores. E mais piores elas ainda poderiam ficar. O delegado que cuidava do caso da morte do jovem na loja de roupas apareceu na nossa casa dizendo ter descoberto mais coisas. Um de nossos vizinhos, um senhor de setenta anos havia desaparecido e seu corpo fora achado na noite anterior, dentro da cisterna do prédio. Dentro do bolso do senhor, havia uma caneta vermelha com uma etiqueta de papel enrolada em sua carga. Na etiqueta havia o nome completo do meu filho. Minha reação foi de pânico. Meu filho era capaz de fazer mais coisas do que eu imaginava.”
 
•Magno Vicente Novaes – “Porteiro”
    “Me senti envergonhado por ter falado daquela história. Mas o Jonas era uma espécie de amigo meu. Eu odiava ter que tratá-lo como paciente. Porém as coisas foram piorando. Eu precisava fazer algo, ele precisava sair daquele quarto. A polícia veio até mim e contou o que haviam achado. Jonas provavelmente havia matado um senhor afogado. Era estranho pois batia com a tal história do rapaz afogado na cisterna. Enquanto ele tomava banho, entrei no quarto sozinho. Pedi para que os policiais ficassem esperando na porta, pois Jonas não reagia bem à estranhos em seu quarto. Fui até o armário e vasculhei algumas gavetas. Haviam diversas canetas vermelhas, todas com a carga completa como se nunca tivessem sido usadas. Não havia o tal texto. Fui então até as gavetas da cama de solteiro. Lá, eu vi algo assustador. Eram vinte páginas escritas em vermelho. Li o começo da história e parecia uma espécie de confissão. Era como se ali, Jonas dissesse exatamente o que sentia quando cometera o crime. Minha avó uma vez disse que muito do que lemos são fantasmas internos do escritor. Que um escritor sempre coloca algo de sua vida em seus contos. Ali, Jonas narrava com riqueza de detalhes e sentimentos como havia realizado a morte do homem. O matou por o olhar demais quando estavam no elevador. Porém o mais impressionante não era o modo que narrava, e sim como havia escrito. Não era tinta. Era sangue. Sangue do próprio Jonas. Sangue que ele conseguia ferindo partes do corpo,principalmente seus braços. Dali pra frente não podia mais ajudá-lo. Passei ele para o doutor Mathias, chefe da ala psiquiátrica aonde Jonas estava internado. Acho que tanto eu para ele, quanto ele para mim, foi a coisa mais próxima de um amigo naquele hospital”
 
•Jonas Linhares Souto, pai de Jonas Linhares Filho.
    “Nunca tive vergonha do Jonas. Mas se soubesse que iria chegar a tal ponto, tinha o internado antes. Conhecendo a sua natureza agressiva, combinamos com o doutor do hospital que aquilo teria que parecer para nosso filho como a realização de um sonho. Como se realmente ele estivesse se mudando para o seu quarto. O médico concordou, porém não podia fazer as alterações necessárias. Não pode dar televisão,DVDs ou uma escrivaninha. Mas poderia fingir que aquilo era um quarto, e que Magno era o porteiro do prédio. Doeu muito saber que as alucinações continuaram dentro do hospital. Meu filho deixou sua imaginação o enlouquecer. Deixou que seus pesadelos o parecessem reais. E me culpo todos os dias por não ter feito nada para ajudá-lo enquanto ainda havia tempo. Mas sei como ele se sentia. Sei exatamente como meu filho se sentia...” 
 
•Jonas Linhares Filho
    “Odeio meus pais. Odeio eles do fundo do meu coração. Me enganaram! Hoje, mais cedo fui olhar pela janela. Ao invés de ver aquela janela de um cinza estranho, meio azulado, vi uma janela de vidro e lá dentro, os vi conversando com os dois homens que me aplicaram aquelas injeções, e mais um outro todo vestido de branco e com um olhar arrogante. Estão todos juntos nessa. Estão todos contra mim. Filhos da puta! Vou me vingar. Preciso sair desse quarto e colocar os planos em prática. Mas o Magno nunca mais veio me ver. Provavelmente eles o proibiram. Ainda mudaram tudo nesse quarto. Agora ele é branco. Não tem mais espelhos,não tem mais canetas. Consigo ouvir gritos de pessoas. Elas parecem sofrer. Ainda ouvirei a vaca da minha mãe gritando desta maneira. É só eu conseguir sair desse quarto maldito!”
 
•Tânia Linhares, mãe de Jonas Linhares Filho.
    “Os médicos decidiram mudá-lo de ala. Ele quase feriu os doutores. Encontraram-no todo molhado sobre a cama,gritando que haviam mortos por todo quarto. E seus braços sangravam. Depois eu soube de algumas coisas que me deixaram impressionada. Jonas deixou que sua imaginação o sugestionasse. Ele criou um mundo naquele quarto. Ele via coisas que não existiam. Não tinha chão de madeira. De onde ele tirou aquilo? Por Deus! Ele escreveu uma confissão em forma de conto de terror com seu próprio sangue! Os filmes criaram monstros ainda piores dentro da cabecinha dele.Eu nunca imaginei que ele fosse capaz de matar alguém friamente, afogado... Agora não posso visitá-lo. É considerado perigoso. Os médicos encontraram bilhetes e desenhos feitos com sangue. Ele quer nos matar. Nos odeia. Não consigo mais dormir. Meu filho único enlouqueceu. Meu ex-marido teve uma crise nervosa e se encontra internado. Ontem o fui visitar. Ele jurou que havia visto alguém entrando pela janela. Parece que nosso maior medo havia se realizado. Que o mal que meu marido sofria passasse para nosso filho. Um mal imaginário que para ele seria real. Ele sempre dizia que a maior inimiga dele era a sua imaginação,sua própria cabeça.”
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                                                                        Fim
 

 
 
 
 

Fael Velloso
Enviado por Fael Velloso em 12/10/2009
Reeditado em 28/10/2009
Código do texto: T1862838
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