ESPÍRITO DE PORCO

ESPÍRITO DE PORCO

Em todo lugar sempre há um espírito de porco. Apartidário que se empenha em semear a discórdia ao seu redor e não gosta de ver ninguém feliz, nem a si próprio...

Quebrou o cofrinho em forma de porquinho e contou quantas moedas tinha., subindo até o topo de uma favela para buscar seu pó. Foi péssimo pai de família, batia na esposa, roubou a mãe, bebia uma garrafa de cachaça por dia, e depois de esvaziá-la por completo, começava o calvário e o inferno de todos, tudo fugia ao controle, quebrava louças, jogava toda a comida no chão, sumia de casa e ia arrumar confusão na rua, para preocupação da família, ficando fora às vezes por vários dias. Nunca bateu um prego e ainda cantava de galo. Estava muito gordo e era um homem novo, ainda ia completar vinte e sete anos, acontece que quando subia a enorme ladeira, para chegar ao seu objetivo, a polícia começava a realizar uma batida no local e surgiu de repente a cerca de dez metros atrás de onde estava, os traficantes vendo as autoridades, começaram a atirar e o que se seguiu foi uma intensa troca de tiros com armas pesadas. O herói solitário então, numa atitude insana, encontrou uma carcaça de carro, na calçada à esquerda de quem sobe, no meio de uma encruzilhada, talvez resultado de um desmanche e resolveu usá-la ( a carcaça) como trincheira, brincando com a sorte, não tomou partido de nenhum dos dois lados, tirando por baixo das pernas das calças jeans dois fuzis, suas mais recentes aquisições ( já tinha doze assassinatos nas costas, provocados por seu trêsoitão de estimação) presos por tornozeleiras e atirou insandecidamente para os dois grupos rivais, gargalhando, parecia até o coisa ruim, quem escutou as risadas ficou mais com medo delas do que daquela guerra, por horas seguidas, talvez umas três. Acredita-se que ele mesmo tenha sido o X9, o pivô de tudo aquilo, pois as autoridades foram até o local por causa de uma denúncia anônima. Tudo acabou quando se encheu da posição e correu para uma outra carcaça a dois metros de distância para cima. No trajeto caiu durinho no chão. Teria sido atingido? A batalha cessou e houve um enorme silêncio por alguns minutos. A polícia resolveu recuar, diante de uma possível revolta dos moradores, por terem matado um habitante do local. Os meliantes desceram o morro e cutucaram o indivíduo. Descobriram que não havia marcas de perfuração à bala e que estava morto. Levaram suas armas e deixaram o corpo ao relento. Lá em cima havia uma vara, uma grande criação de suínos clandestina que abastecia diversos açougues, um deles fugiu, correndo ladeira abaixo, por um quilômetro, encontrou o defunto e com fome e fúria alimentou-se dele.Transeuntes vendo a horrível cena tentavam afastar o bicho, afinal, jogado na sarjeta estava um ser humano sendo devorado por uma fera grunhindo e babando, avançando em quem tentava afastá-lo, um pai de santo e um pastor evangélico disseram que ele estava possuído pelo espírito ruim do morto, e rezaram, cada um do seu jeito, mas nada adiantou., consumira a refeição até o fim e prosseguiu ladeira abaixo numa velocidade descomunal, saiu da favela e ganhou as ruas da cidade na hora do rush, subindo uma grande ladeira. Com olhos arregalados, trabalhadores, crianças, estudantes se desviavam do animal para não serem atropelados por ele - já pensou que vexame, ser atropelado por um porco!? - uns encostavam-se nas paredes, nos muros, os escalavam, entravam em casas, prédios, botequins,qualquer brecha que representasse segurança. Desviou-se para o meio da pista no sentido contrário dos carros, quase colidiu com um, que freiando bruscamente, provocou um engavetamento de mais de trinta carros. De uma hora para outra, já na calçada, caiu da mesma forma como deu passagem sua refeição, mortinho da silva. Uma família carente levou a iguaria para casa e preparou um grande banquete com direito a quinze convidados que levaram caixas de cervejas. No fim da festa, do nada, surgiu uma briga generalizada tão grande que é melhor nem contar o fim da história, é deprimente...

LYGIA VICTORIA
Enviado por LYGIA VICTORIA em 08/09/2009
Reeditado em 16/10/2009
Código do texto: T1799627
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