O ninho dos mortos
A viatura parou frente ao local indicado por uma denuncia anônima, dentro dela quatro soldados checavam se aquele era realmente o endereço; depois de confirmado, todos desceram do carro; a casa era muito antiga, porém muito grande, o terreno no qual ela estava era enorme, na frente o muro de pedras empilhadas, muito bem feito; alto, tapava a visão da totalidade do terreno, mas o portão feito de grades grossas de aproximadamente dois metros e meio de altura que culminavam em pontas de lança no topo, mostrava frontal e nitidamente a aparência pouco habitável na qual o domicílio se encontrava. No portão uma corrente muito grossa estava com um dos elos partidos; um cadeado se encontrava fechado e unindo outros dois elos.
Os policias ficaram em alerta visto que a rua onde estavam era pouco movimentada, as luzes dos postes foram quebradas e isso tornava aquele local perfeito para uma emboscada idealizada por maus elementos, bandidos que rondavam essa parte do município; esse bairro da cidade era uma das zonas mais arriscadas de se andar, quanto mais a noite se aprofundava pior ficava. O que eles não sabiam era que naquele exato momento uma trama terrível estava se fechando sobre suas vidas; a mesma pessoa que efetuara a denuncia sobre aquela localidade, agora já os tinha sob controle, incutindo nas mentes de cada um o desejo enganoso de entrarem para averiguar os fatos dentro daquela casa abandonada. Nenhum deles nunca teria tempo para pensar a respeito e descobrir que aquela vontade não partia de suas próprias mentes.
Entrando sorrateiramente pelo quintal da casa, embora nenhum dos policias pudesse ver algo que não fosse mato e capim alto, as árvores grandes, algumas sem folha em seus galhos e com uma aparência retorcida ladeando a casa e a total escuridão do ambiente, como se um manto de sombras tivesse envolvido todo o terreno; parecia noite eterna, mas algo estava ali, a forte sensação de estarem sendo observados calava fundo nas mentes de todos eles. Após passarem pela grama alta do quintal na frente do casebre em estilo antigo, provavelmente erguido no início do século passado, os quatros soldados chegaram à varanda que estava em péssimas condições assim como todo o resto do imóvel e foram surpreendidos pelo rangido estridente de ferro enferrujado causado pelo portão que fechava lentamente empurrado por uma leve brisa noturna; os poucos segundos em que se fez presente o barulho; pareceram minutos intermináveis.
Havia algo muito errado naquela propriedade e cada um deles já tinha percebido. Aproximando-se da porta da frente que estava apenas encostada os policias sacaram suas armas por medidas de segurança. Sobre a porta, uma placa com dizeres estranhos entalhados nela aos quais eles não conseguiam discernir; novamente o vento surgiu do nada e açoitou todos em uma lufada rápida, um pouco mais forte do que a primeira.
Um dos policias empurrou a porta exatamente como tinha sido treinado para fazer e entrou na casa seguido de perto pelos outros três; dentro do cômodo escuro eles permaneceram juntos e era possível ver algumas saletas, vez por outra um deles julgava ter visto alguma sombra mudando de lugar, como se estivesse se movendo. E estavam.
O barulho surgiu em um canto da sala; no canto mais escuro; baixo e ritmado como a respiração ofegante de uma pessoa, e todos se voltaram para aquele local do cômodo pensando tratar-se de um viciado em drogas ou vagabundo que utilizava a casa como abrigo.
__ Quem está aí? É a polícia. __ disse um dos policias com a arma apontada para o local em meio à escuridão.
A respiração aumentou, e uma segunda surgiu do outro lado da sala; mais ofegante do que a primeira, em seguida um vulto surgiu na porta vindo do quintal com uma velocidade espantosa e ali ficou, parado; os policias começaram a dar voz de prisão as supostas três pessoas que dividiam a sala com eles, mas nenhuma delas se movia um milímetro que fosse, tampouco nenhum dos soldados estava com coragem suficiente para dar o tiro de advertência; eles já sabiam que haviam caído em uma armadilha e que se não agissem rápido acabariam sendo abatidos naquela casa abandonada vítimas desses vagabundos. De repente, passos extremamente pesados começaram a soar nos outros cômodos e aumentavam na medida que as pessoas que os estavam produzindo se aproximavam da sala onde se localizavam os policias.
A essa altura algumas das sombras inanimadas da sala pareceram tomar vida. A sala parecia estar abarrotada de gente, cada soldado podia realmente ver que isso era verdade e que outras pessoas vinham dos outros cômodos com seus pesados passos e se amontoavam aos arredores do grupo de invasores da lei. Depois de um repentino silêncio os soldados começaram a ouvir as vozes das pessoas que ali estavam; elas cochichavam entre si em tom muitíssimo baixo, sussurravam coisas como:
_Por quanto tempo ainda teremos que fazer isso?
E então outro respondia:
_ O tempo que durar a guerra entre eles.
Outros diziam coisas do tipo:
_ São policiais.
E até mesmo:
_ Estou com medo; posso ouvir seus pensamentos e sentir suas sensações.
Ao ouvir tais frases sussurradas por aquele bando de pessoas que os cercava, um dos policiais caiu em desespero, atirando várias vezes em todas as direções, no intuito de afastar ou acertar qualquer um dos agressores em potencial. Os tiros realmente acertaram dois ou três deles em um total de aproximadamente vinte, mas o resto avançou como uma manada de animais furiosos, emitindo todo tipo de ruídos como gritos e bramidos; os tiros e os gritos se misturaram e ecoaram dentro de toda a casa; os jovens soldados batalharam ferozmente por suas vidas, mas estavam enfrentando um bando de inimigos que não poderiam vencer. Três deles sucumbiram logo após os primeiros minutos de peleja visto que não suportaram os ferimentos poderosos contra seus corpos, provocados pelos “filhos da noite”. O quarto policial resistiu a toda a pancadaria a qual fora submetido, mas acabou por se entregar ao sentir os pares de pressas extremamente afiada perfurando seu pescoço.
As criaturas do ninho haviam finalmente se alimentado.
***
Parte do meu livro "Noites sem lua".