Amor, ódio e vingança

A vida de Leandro sempre foi simples, sem novidades, emoções ou aventuras. Um rapaz caseiro, tímido, sem muitos amigos, um pouco a cima do peso, cabelos curtos e negros estilo militar, olhos castanhos, nada fora do comum. Um típico adolescente brasileiro.

Ia sozinho para a escola, sob os olhos do astro-rei, soberano ao meio-dia e ao anoitecer voltava para sua humilde casa num bairro distante de Manaus.

Seus dias eram monótonos, sua rotina se repetia um dia após o outro. Pessoas passavam por sua vida, mas nunca a marcavam até conhecer Helena.

Uma menina de sua escola, sorridente e extrovertida, fora uma das poucas pessoas que o notara, conversara com Leandro. Não era uma moça muito bonita, pele pálida, corpo delgado, sem curvas que chamasse atenção de outros rapazes. Mas mesmo sem tais atributos físicos, fizera Leandro apaixonar-se cegamente por ela.

Se tornaram amigos e a cada dia que passava mais próximos ficavam. Leandro já não retornava para sua casa solitário, Helena morava uma rua após a sua. Passavam bastante tempo juntos conversando e dando boas risadas. Mas para a tristeza de Leandro, estava evidente que ela não o amava, mas ainda sim ele não desistira, contudo não podia arriscar uma de suas mais preciosas amizades de sua vida inteira.

Passadas algumas semanas, percebeu que Helena estava com um olhar distante, suspiros intercalados de sorrisos distraídos. Leandro voltara a ir para sua casa só, já que Helena sempre ficava até um pouco mais tarde no colégio. Ele não entendia o que se passava, era uma situação totalemente estranha para ele, uma vez que nunca tivera amigos.

Passados mais alguns dias, Helena chega na escola de mãos dadas com um menino mais velho, forte, com traços bem desenhados, comunicativo e bem-humorado. Exatamente o oposto de Leandro. Mas isso não importava. Ele estava aturdido com a cena dos dois caminhando pelo portão de entrada sorridentes, atraindo olhares dos curiosos. Seu mundo desabara, perdera a pessoa que mais amara na vida. Seu peito doía, uma estranha sensação do seu estômago tomara conta. Ver Helena dando um tchauzinho tímido por trás dos ombros de seu acompanhante foi o máximo que conseguiu ganhar dela.

A aula começara, seu corpo estava lá mas seu pensamento viajando a quilômetros dalí. Logo que foram liberados voltou para sua casa como se estivesse sem rumo. Naquela noite não jantou e para cama cedo foi. Lágrimas envolvidas de tristeza e ciúmes eram derramadas em abundância. A noite passara lenta. Seus olhos inchados, agora já não tinha mais vontade de chorar. A tristeza se transformara em ódio, e agora um sorriso malicioso brotava em seu rosto.

Nos dias seguintes evitara olhar para Helena e seu namoradinho borçal.

Queria vingança... aquele que havia roubado a única pessoa que amara iria pagar por fazê-lo sofrer. Mas lhe faltava coragem, sim, coragem era o que precisava, contudo era o que mais lhe faltava.

Então fora para a biblioteca central procurar por alguma coisa que o ajudasse. Encontrou um livro velho, de capa marrom, páginas amareladas pelo tempo, película de poeira sobre o mesmo que o impediam de visualizar o título. Assoprou suavimente e murmurou "O Segredos dos Espíritos".

Curioso folheou o livro vagarosamente, passando os olhos zelosos por cada uma das páginas envelhecidas. Então encontrou algo sobre um espiríto mercenário, que fazia qualquer coisa por aquele que o invocava, mas não era dinheiro que recebia em troca, mas sim a dor das pessoas.

Leandro voltou para casa veloz e ansioso. Trancou-se em seu quarto e começou o sinistro ritual. Ao fim, não sentiu nada de diferente, nenhum sinal. Nada.

Desapontado não tardou em dormir.

Em seus sonhos encontrou-se numa sala ampla e abandonada. Olhou em sua volta e num canto escuro avistou um vulto negro, disforme com olhos azuis brilhantes brotando do topo da silhueta a qual esboçou um sorriso banhado de maldade.

O ser sinistro não se demorou quieto e começou a falar:

- Foste tu que me acordaste criança?

Leandro assustado com a figura não sabia o que falar e disse baixinho:

- Sim...

- E o que queres de mim?

- Vingança. Quero me vingar daquele que roubou a pessoa que eu amava, mas me falta coragem.

- Entendo - disse o espírito malicioso - posso resolver isto facilmente, mas devo avisá-lo, que não faço nada de graça. Quero sua dor em troca e por sete anos o farei sentir dor, uma dor extrema, que diariamente o será cobrada.

- Eu aceito, dor pior a que sinto agora não pode existir!

O ser macabro soltou uma gargalhada alta e longa e terminou:

- Que assim seja...

Leandro acordou com o sol já alto, estava suado e um tanto confuso, mas se sentia bem, bem como há tempos não se sentia. Logo dera a hora de ir para o colégio e como todos os dias poe-se a caminhar sob o impiedoso sol de Manaus.

Uma sensação de estar sendo seguido constantemente o acompanhava, mas não o incomodara, sabia o que era.

A tarde passara rápida. Ao sair de sua sala avistou o namorado de Helena, dela se despedindo. Um impulso o consumiu, seus olhos estava sem foco e sem brilho, Agora flutuava ao lado de seu corpo que sorria estranhamente. Não entendia o que estava acontecendo. Mas tudo foi explicado com uma voz ecoando em sua mente.

- Agora eu assumo.

A voz se foi seguida de uma risada breve.

Leandro nada pôde fazer e apenas acompanhou o que se passava.

Seu corpo agora possuído pelo espírito mercenário seguia discretamente o caminhar do rapaz em direção a sua casa.

Ao entrar em um beco estreito o esbelto rapaz cessou sua caminhada e olhou para trás. Lá estava o espírito que possuia o corpo de Leandro, que se ocupara em apenas observar.

Uma névoa densa agora consumia o beco, juntamente com um interminável silêncio.

Agora os olhos do corpo de Leandro brilhavam azuis e um sorriso enloquecido o acompanhava, avançou com uma velocidade sobrenatural e agarrou o pescoço do rapaz que se debatia no ar sem força e sem emitir nenhum som, apenas uma expressão desesperada em seu rosto. Demônios emergiam do solo com presas e garras afiadas e olhos avermelhados e desferiam ataques seguidos no corpo imóvel da vítima sem defesa. Jatos de sangue jorravam violentamente, porém a vida teimava em deixá-lo. Parece que o espírito se divertia com o sofrimento que via. Espasmos e contrações involuntárias do corpo atacado tornavam o bizarro espetáculo cada vez mais violento, mas Leandro não se incomodava com o que via, estava gostando, se sentia ótimo, era o que esperava a dias, ver seu inimigo sofrer.

O Show não tardou em terminar. Agora o corpo sem vida da vítima jazia no chão alagado pelo líquido vermelho-escarlate.

Uma semana se passou desde o incidente. Helena já não ia mais para a escola. Sua vida voltou a ser monótona, deixar de vê-la era muito triste, e logo seu sofrimento voltou. Então pensou, estava fadado a viver solitário. Dar fim em seu rival só piorara as coisas, mas para o espírito mercenário isso não importava.

Um dia voltou a visitar Leandro. Mas agora para cobrar sua dívida.

E trouxe dor, uma dor extrema para ele.

Agora em seus sonhos, revivia aquele dia da tortura. Mas pior que isso

todos os dias era torturado em seus sonhos e toda dor era sentida. Seu corpo flutuava enquanto era lentamente cortado por milhares de navalhas por todo seu corpo, gritar era inútil. A cena era horrenda.

Ao acordar a dor não cessava imediatamente, e sempre quando o deixava. ouvia distante uma voz que murmura "mais uma parcela está paga".