Casa Maldita

Na cidade de Sumaré, estado de São Paulo, morava uma família que tinha vindo da capital paulista havia pouco tempo. César era o membro mais comunicativo e saiu logo no primeiro dia da mudança para tentar fazer amizades com os novos vizinhos. Ele tinha dois irmãos que se chamavam Bianca e Gabriel, ambos eram gêmeos e tinham dez anos, enquanto César tinha oito. Seus pais se chamavam Mariana e Rodrigo.
O pai deles tinha sido transferido de São Paulo para Sumaré para uma empresa que abriu nas proximidades do bairro Maria Antonia. César disse:
 — Pai, mãe, vou sair para conhecer os vizinhos no bairro, quero fazer novas amizades.
— Sim, filho, pode ir, mas tenha muito cuidado, não sabemos quem são os novos vizinhos — respondeu dona Mariana.
 — É filho, sua mãe está certa, temos que ter informações sobre a nova vizinhança para sabermos como são as pessoas daqui — disse seu Rodrigo.
— Eu mesmo farei isto pai, não se preocupe.
E César saiu para a rua, a fim de conhecer algum vizinho novo. Seus irmãos não quiseram sair com ele naquele momento, preferiram ficar no computador, jogando aqueles jogos que crianças adoram.
Foi então que o garoto avistou um menino usando uma roupa toda rasgada e suja. César se aproximou dele e perguntou:
— Olá garoto, como vai? Você mora aqui?
— Sim, moro! Vivo naquela casa logo adiante — respondeu o outro menino com a cabeça baixa,  apontando para uma casa estranha, velha e com as janelas quebradas.
— Como você se chama? — perguntou César.
— Eu me chamo Joaquim, por que tanta pergunta? — disse o garoto olhando com o semblante nada amigável para César, e foi neste momento que ele percebeu a sua aparência cadavérica. — Não se aproxime de mim outra vez ou irá se arrepender — e saiu correndo para dentro da casa.
Na primeira tentativa de se aproximar de um vizinho, César já teve uma decepção. E como já estava anoitecendo, resolveu entrar em casa.
Ele dormiu, mas durante a madrugada ouviu um barulho estranho, vários gritos de uma só vez vindos daquela mesma casa onde morava Joaquim, o garoto misterioso. E mesmo naquele horário, César resolveu ir averiguar sozinho, escondido dos pais e dos irmãos, foi então que Bianca e Gabriel perceberam os passos do caçula e pegaram-no no flagra saindo de casa. Bianca disse:
— Para onde você vai, moleque?
— Vou ver o que está acontecendo naquela casa, vocês ouviram a gritaria? — disse César.
— Claro que sim, por que acha que estamos acordados? Vamos com você, também queremos saber o que está acontecendo — disse Gabriel.
Os três garotos saíram escondidos dos pais e foram até a esquina, isso por volta da 1h da manhã. Eles se aproximaram com cautela para não serem notados pelos habitantes da casa. Se esconderam atrás de uma caixa d’água vazia abandonada no quintal. Gabriel foi com cuidado para uma das janelas e teve uma surpresa, não havia nada na casa, ela estava totalmente vazia. Então como um relâmpago um homem muito estranho e com aparência de cadáver surgiu na janela, dando um grito bem alto, desaparecendo logo em seguida. Os seus irmãos, assustados, também viram a dantesca cena. Eles iam sair correndo mas de repente caíram num buraco, quando perceberam, estranhamente estavam dentro da casa.
— Como viemos parar aqui? — disse Bianca aos prantos.
— Não faço a mínima ideia — respondeu César.
— Vê-ve-vejam só, meu Deus do céu! — disse Gabriel.
Quando eles perceberam, Joaquim e o homem que apareceu na janela surgiram na frente deles com olhares ameaçadores. O menino disse:
— Não disse para não se aproximar de mim, agora sofrerão as consequências, eu te avisei, este é meu pai, Roberto.
— Por favor, deixem a gente ir embora, por favor! — gritou Bianca.
— O meu filho avisou para seu irmão, ele não lhe deu ouvidos, agora nunca mais sairão daqui — disse Roberto.
— Deve ter alguma forma de nós sairmos deste lugar maldito — disse César.
— Viu só onde a gente foi se meter? O que faremos agora? — disse Gabriel. E como num passe de mágica, caiu uma jaula sobre eles.
— Vocês têm que morrer para nós sairmos daqui e irmos definitivamente para o outro mundo, depois de muitos anos finalmente iremos embora de uma vez por todas e vocês serão os próximos fantasmas a assombrarem esta casa — disse o homem.
— O que aconteceu a vocês que morreram e ficaram assombrando esta casa?
— Fomos assassinados, mas não conseguimos nos lembrar por quêm. E estamos aqui desde então, esperando a oportunidade de sairmos daqui e irmos para o outro mundo. Morremos há trinta anos atrás, mas infelizmente ninguém tinha coragem de entrar nesta casa. Eu e meu filho metíamos medo em todos que tentassem se aproximar.  Nós não queríamos deixar ninguém neste lugar, a não ser que fossem cabeças duras como vocês que se aproximaram mesmo sendo avisados. Depois de trinta anos, vocês foram os primeiros.
— Deixe a gente ir embora, deve haver um outro jeito de vocês irem para o outro mundo — disse César.
— Não, agora que estão aqui, ficarão para sempre.
César, Gabriel e Bianca pensaram em alguma forma de tentarem fazer algum acordo com os fantasmas e poderem se livrar daquela situação complicada.
— E se nós descobrirmos quem foi o assassino? — disse Gabriel, depois de discutir a ideia com os seus irmãos.
— Bem, então podemos pensar no assunto, não é, pai? — disse Joaquim.
— Mas quero ver vocês descobrirem, já se passou trinta anos, vocês nem eram nascidos.
— Mesmo assim, podemos investigar, pode acreditar na gente — disse Bianca.
— Mas só um de vocês pode sair daqui, como garantia dois ficarão, combinado?
— Sim, eu vou sair — disse César. Seus irmãos concordaram e ele se foi.
 
No outro dia, pela manhã, César disse a seus pais que seus irmãos estavam esperando na esquina e que iriam dar um passeio pelo bairro. Os pais ficaram desconfiados porque eles sairam sem tomar o café da manhã, mas César explicou que os três iriam comer pastel, pois era domingo, dia de feira, foi então que eles se convenceram. Felizmente a mãe não quis ir desta vez porque tinha que arrumar a casa junto com seu marido, pois haviam acabado de se mudar.
César saiu pela vizinhança, foi perguntando a muitas pessoas se elas moravam lá durante muito tempo, mas a resposta era sempre negativa. Até que finalmente ele encontrou um velho que morava no bairro já fazia mais ou menos quarenta anos, então perguntou se ele conhecia a história da Casa Maldita, que era como o povo chamava o casarão que ficava no bairro. O velho, que se chamava Simão, disse que ali vivia um pai e um filho que tinham conseguido ganhar aquela casa de um patrão que morrera e deixara a casa como herança ao bom empregado que se chamava Roberto, o pai do Joaquim. Como o patrão não tinha família, deixou a casa para o seu melhor funcionário.
Outro empregado ficou com inveja e assassinou ambos, pai e filho ali mesmo na casa, após ela ter sido deixada como herança para outro funcionário e não para ele, pois este se achava ter mais direito por trabalhar durante mais tempo no casarão. Depois dos assassinatos ele fugiu do bairro. Simão sabia onde ele estava, mas tinha medo de represálias. O velho também não dizia a ninguém sobre este assunto, pois na época fora ameaçado pelo assassino. Ele era a única testemunha dos assassinatos. Mas o menino explicou todo o ocorrido para o velho que mesmo desconfiado resolveu ajuda-lo.
— Hoje ele mora em um bairro vizinho, você deve atraí-lo para cá dizendo que eu estou na Casa Maldita e que revelei à polícia toda a verdade de trinta anos atrás, deste modo ele virá para dentro da casa, seus irmãos serão libertados e Roberto acertará as contas com ele.
— Muito obrigado, seu Simão, valeu mesmo pela ajuda, vou fazer o que o senhor me sugeriu.
Chegando na casa de Jordão, era este o nome do assassino, César disse para ele tudo o que Simão tinha lhe sugerido. Jordão ficou furioso e foi até a Casa Maldita. Ele não acreditava em assombrações, e dizia que casa assombrada era coisa de gente que não tinha o que fazer. Furioso, foi até a casa.
— Onde está você, velho maldito, está querendo me denunciar para a polícia, é?
— Não, ele não te denunciou para a polícia, ele o denunciou para mim — respondeu Roberto.
— Chegou a hora da minha vingança, vamos acertar as nossas contas, seu covarde.
Jordão tremeu descontroladamente e sem palavras, caiu morto. Ele teve um enfarte. Roberto tinha conseguido o que queria. Então finalmente, em paz, ele foi embora com seu filho para o outro mundo, mas antes disso, como gratidão, se despediu das crianças, agradecendo-as pelo favor.
Foi então que os três irmãos voltaram para suas casas e jamais esqueceram a aventura apavorante pela qual passaram. Mas eles souberam que a Casa Maldita ainda continuava assombrada por uma entidade, não pelo espírito de Roberto, muito menos do seu filho Joaquim, mas pelo fantasma de Jordão que tinha sido morto lá havia alguns dias, então prometeram entre eles mesmos jamais se aproximarem do local outra vez.

(Conto publicado na antologia Sobrenatural - Contos fantásticos, organizada por Ademir Pascale, Editora All Print 2011

Cadu Lima Santos
Enviado por Cadu Lima Santos em 16/08/2009
Reeditado em 12/01/2011
Código do texto: T1756383
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