Apartamento 13
Tudo estava programado para ser exatamente como nas outras vezes, exatamente como os outros fins de semanas.
Marcelo tocava violão e a voz grossa e firme de Eduardo acompanhava a melodia trazendo a letra da música conhecida por todos naquela sala.
Pela porta aberta da cozinha veio Mariana com algumas garrafas de cerveja, sentou-se no sofá e serviu-se.
A semana fora cansativa para todos ali, por isso os fins de semana na casa de Gabriela e Marcelo eram indispensáveis.
Todos que estavam ali estavam fazendo o que mais gostavam, Marcelo tocava seu violão antigo e preto com a intimidade e a felicidade de quem se distrai, Eduardo soltava a voz chegando até a fechar os olhos, Gabriela olhava o irmão enquanto tomava alguns goles de sua cerveja e Mariana sempre apaixonada olhava com seu par de olhos extremamente azuis para Eduardo.
Para aquelas pessoas, Elvis continuava vivo, para aquelas pessoas Elvis estava ali, naquela sala, acompanhando suas músicas ao som do violão que fora apoiado na parede ao término de Hound Dog.
_ Gabi, onde estão as cervejas - perguntou Eduardo ao ver uma garrafa vazia.
_ Onde acha que elas estão?
Caminhou devagar até a cozinha dando as costas para o resto da turma.
A janela estava aberta e trouxe uma brisa fria que veio de encontro com o rosto quente de Edu. Uma tontura repentina fez com que o rapaz se segurasse na pia.
_ O que foi Edu? - Mariana estava acariciando os cabelos do rapaz que escondia o rosto entre os braços esticados na pia.
_ Não sei, estou começando a suar.
Os braços dela puxaram o rosto de Eduardo para cima e ela notou que o rosto além de pálido e suado possuía algumas veias ressaltadas.
_ Vá até o banheiro e passe uma água fria no rosto. Você tomou algum remédio hoje?
_ Um para dor de cabeça, nada muito forte.
_ Ai meu Deus, Eduardo você sabe que não pode tomar bebida alcoólica por cima de remédio nenhum. O que você tem é alguma reação alérgica do remédio.
Com algum esforço para manter-se de pé Eduardo deu um beijo em Mariana e seguiu para o banheiro no fim do corredor.
Acendeu a luz do corredor e entrou no banheiro. Trancou a porta.
Sentia o sangue ardendo nas veias e a cabeça latejava.
Com a toalha branca do banheiro enxugou o rosto e depois sentou-se apoiando as costas na parede.
Marcelo o chamava da sala.
“ Edu, vou cantar Jailhouse Rock sozinho?”
_ Não estou me sentindo bem Marcelo, canto outra depois!
Escutou a voz do amigo dizendo “tudo bem” e logo em seguida a música começou.
Conseguiu escutar apenas a introdução e depois a cabeça emitia dores que interceptavam as notas musicais.
O nariz começou a esquentar e sentiu algo quente e úmido escorrendo em seu rosto. Agora o nariz sangrava e ele não tinha condições de ficar em pé devido a dor que sentia.
Eduardo olhou para baixo e notou que algumas gostas vermelhas manchavam a camiseta branca que havia por baixo da jaqueta preta de couro.
Aquele mal-estar foi passando e ele já se sentia em condições de ficar em pé.
Tomou impulso com as mãos e abriu a porta assim que se levantou.
Notou que o olhar de Mariana voltara a brilhar mas de repente tudo aquilo desapareceu.
_ Edu? Está tudo bem com você?
Ele tentou responder mas não conseguia, ela não o ouvia.
Mariana passou correndo por ele e nem o notou, correu para o banheiro e de repente escutou o grito aguda que ela soltara de lá de dentro.
Marcelo e Gabi correram até ela.
A primeira a sair do banheiro foi Gabi que logo em seguida tentava manter Mariana numa posição firme.
Marcelo saiu do banheiro carregando o corpo de Eduardo.
_ Gabi abra a porta e pegue a chave do carro, preciso levá-lo para o hospital agora.
Ela não se movia.
_ Rápido Gabi. Rápido!
A porta fazia barulho nas mãos de Gabi, no entanto não se abria.
_ Faça força Gabi!
_ A porta não abre, a fechadura escorrega - os olhos de Gabi estavam úmidos e vermelhos. Não se notava nada nas expressões deles além do desespero.
O corpo de Eduardo foi colocado no sofá enquanto Marcelo chutava a porta.
_ Por favor Edu, acorde, por favor! Você precisa acordar.
Um frio fez Mariana arrepiar.
_ Mariana o que está acontecendo? - Eduardo chorava e tentava fazer com que Mariana olhasse para ele.
_ Você tem que acordar... Não pode me deixar aqui.
Marcelo e Gabi empurravam a porta, mas nada acontecia.
_ O que está acontecendo aqui? Isso não pode ser sério.
Marcelo estava nervoso e esmurrava a porta.
_ O telefone está mudo! - o fio cortado estava nas mãos de Gabi.
Mariana correu para o banheiro e o susto foi tão forte e tão intenso que não conseguia gritar, a garganta estava fechada.
“ Vocês não devem querer que alguém morto volte...”
A frase jazia em sangue no piso branco do banheiro.
_ Mariana, a porta abriu! Corra!
Por mais que quisesse Mariana não conseguia se mover e muito menos falar.
“ Encontrados quatro corpos em um apartamento do prédio Residencial Osasco” - jornal do dia 5/07/2001.