O Suicídio

Suspiro. Milhares de dúvidas e emoções dos mais variados tipos correm pelo meu corpo e surgem como pinturas renascentistas em minha mente. Fecho bem os olhos e questiono: Será este o melhor caminho? Será iminente e sem escapatória? Ou será covardia e fuga dos problemas? Será fraqueza?

Olho ao meu redor. Nada. Vazio total. Ninguém aparece para impedir um ato como este. Nenhum herói colorido surge em sua glória das cinzas da solidão. Nenhum ser humano aparece em uma das janelas deste velho prédio abandonado e tenta me resgatar. Nenhum grande conselheiro corre em minha direção e puxa meu braço, contrariando minha vontade. Nenhum ombro amigo se sujeita a sentir meus desabafos. Não! Ninguém se importa. Sozinho entrei neste mundo, e sozinho hei de sair.

Desorientado, perdido, deprimido. Fecho os olhos, mais uma vez. O caminho em direção ao parapeito do prédio é longo. Ao andar, pensamentos confusos e reflexivos se mostram. Nunca pensei que recorreria a sair, assim. Nunca esta porta havia antes se aberto a mim. Porém, é a única que me apetece. Ela reluz e me atrai com uma sedução feminina que, em comparação ao indecoroso fardo que o destino pôs em minhas costas, é um aparente paraíso. Não aguento mais. É o meu futuro que está lá embaixo.

Sento-me. Preciso sentir a vida. Não posso mais suportar a agonia de meus atos. Ainda de olhos fechados sinto o grosseiro concreto que cobre este prédio de oito andares por entre meus dedos. Este, que já foi um belo e luxuoso prédio comercial não passa hoje de um abandonado centro de obscenidades e criminalidades. Algo extremamente familiar aquece minha cabeça e meu coração. Sim, eu sou este prédio. Arruinado, destroçado, dilacerado. Não há mais vivacidade por aqui. Tudo se arrasta. E o mundo só cultiva a indiferença. Uma indiferença mortal. Uma indiferença alheia a qualquer sentimento. Mesmo assim, me surge uma ponta de arrependimento no meio da indiferença, um feixe de luz na escuridão, como uma semente que começa a brotar entre os espinhos. Reconstrução? Tarde demais. Logo, logo, os espinhos sufocarão a semente. Qualquer esperança que seja veio tardiamente. Perdi tudo, e nada voltará.

É agora, penso comigo mesmo. E levanto, de olhos abertos, mirando o negro e enfumaçado céu noturno. Suspiro. É agora. Suspiro. Quando de repente ouço um grito de mulher. E muitas vozes se aglomeram. Uma multidão a gritar, a gemer, a chorar. Vieram me buscar, pensei eu. Afinal, alguém parece se importar. Eu estava enganado. Enfim, a semente pode brotar mesmo entre os espinhos. Creio que um sorriso começou a crescer em meu rosto. Porém, para o meu estranhamento, não havia ninguém ali por perto. Nada. E ouvia mais e mais gritos.

Andei em direção ao parapeito do térreo em que estava. E notei que os gritos vinham lá de baixo. Sim, de lá. E havia realmente um caos instaurado. Mas não olhavam para cima, para mim, não se importavam para o vazio que aqui havia. Olhavam para algo no chão, algo que eu não conseguia distinguir pelo aglomerado que o encobria. Até que se espalharam e pude ver. Empalideci por completo. Um sentimento gelado subiu pela minha espinha. E isso fez jus ao que sou hoje. Isso explicou tudo o que me tornei. Explicou o meu fazer antes de pensar, explicou minha ruína. Explicou toda minha destruição. Entrei em choque. Involuntariamente, pus a mão na cabeça. E notei o que tinha nas mãos: Sangue, sangue, e mais sangue. Sim, agora eu vejo. Agora eu compreendo. É o meu passado que está lá embaixo.