O Poço

---Ei, Roberval, olha só esse poço!- falou o Genésio, um bêbado para qualquer farra, que nesse dia estava incomumente sóbrio.

Roberval era um sujeito mais romântico do que dado aos garrafões da venda do outro lado do bairro e olhava para a colina verdejante e salpicada de flores campestres, quando o amigo achou o poço encoberto pelo mato.

---Que poço, Genésio? Não tem poço nenhum aqui!

---Aí, não, por isso eu falei deste aqui embaixo- e apontou para a boca escura no chão.

Roberval foi até ele e confirmou que era mesmo um poço, bem sujo por sinal.

---Caramba, ninguém nunca falou deste buraco. 'Tá descoberto e se alguém cair vai ser um horror...Genésio! Não chegue tão perto assim, homem, não acabei de dizer que é perigoso?

---'Tá,tá. Só queria ver, caramba...

---Melhor a gente sair daqui e avisar a prefeitura sobre isso- decretou Roberval e arrastando um relutante Genésio, desceu até a estrada.- Eles vão ter que fazer alguma coisa a respeito disso.

Naquela tarde, a Prefeitura tomou connhecimento do tal poço e prometeu cobri-lo o mais rápido possível. E o prefeito era conhecido por cumprir sua palavra...

O Genésio de noite já tinha bebido todas e lembrou-se do bendito poço (descoberto por ele) e cantando (uma canção dele) tomou o caminho da colina e foi cabaleando estrada à frente, na escuridão.

Não foi difícil encontrar o lugar, a Prefeitura colocara um aviso luminoso ao redor do buraco para que ninguém caísse dentro dele, por acidente e o bêbado ao avistá-lo trotou contente em meio ao mato. Trançou as pernas e caiu de boca na relva com um baque surdo.

---Ai,ai, minha bunda, meu Deus- isso porque ele caiu de cara. Ele estava tão embriagado, mas tão embriagado que olhou para uma das mãos e achou que ela fosse um pedaço estranho de pau.

Gemendo como um condenado, Genésio se arrastou até a beira do poço e agarrando-se a madeira do aviso ficou em pé.

---É pocinho, pocinho, ainda bem que eu vim te ver antes que a Prefeitura te tampe...aaaaauuuuuiiiii!

A proteção de madeira ao redor daquele poço partiu-se como que por mágica e o bêbado desapareceu na escuridão dentro dele.

Havia pouca água no fundo, mas o bastante para aparar a queda de Genésio e impedir que ele se quebrasse todo.

---Ai,meu Deus, o que eu fui fazer? Que droga, eu estou ferrado, e agora, meu Deus?

Em resposta uma mão gélida pousou em sua canela.

---MEU DEUS, SOCORRO- o efeito da bebida foi completamente apagado de seu organismo, ele agora estava mais sóbrio do que o amigo Roberval (que não o deixara ver o poço enquanto ainda era dia).- AI, MEU DEUS SÓ PODE SER O DIABO, MEU DEUS!

Outras mãos o seguraram enquanto ele se debatia e chutava os donos das mãos.

---SAI, CAPETA, SAI! EU SOU UM TEMENTE A DEUS E ELE ME PROTEGE, COISA-RUIM!

Alguma coisa viscosa cobriu-lhe a boca, algo como um tentáculo, e ele calou-se, mais ou menos. As mãos prenderam com mais força, espremendo-o contra o lodo e afogando-o enquanto Genésio se contorcia.

---Então, esse é o poço?

---Claro. Ou você está vendo mais algum?

---Ô, seu ignorante, cadê a proteção em volta? Asno, tinha uma proteção, não tinha?

---Sei lá...

---Que saco, seu burro. Claro que tinha! Pega lá o concreto pra gente selar essa coisa, anda. Antes que algum mané caia aqui.

Andhromeda
Enviado por Andhromeda em 28/04/2009
Código do texto: T1564482
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