A última
Eu sabia que nunca deveríamos ter entrado naquele cemitério e sei também que a idéia foi minha, porém, não imaginava que aquilo seria tão pavoroso e nem que minha vida se transformaria num inferno.
Eidi foi a primeira a entrar, seguida por Luíse, Gerard, Jake, os trigêmeos, e em fim eu.
Confesso que fui por último porque estava tomada por um medo incontrolável que só veio a cessar quando saímos de lá.
Assim como foi a primeira a entrar, Eidi, foi a primeira a morrer.
No acidente envolvendo a moto dela e mais outro carro não encontraram o motorista e nem informações sobre nenhum carro com aquela placa.
Luíse foi a segunda a sofrer as consequências.
Ela treinava todos os fins de semana no rio para o campeonato anual de natação.
Naquele sábado encontraram o corpo dela nas margens do rio com hematomas nas pernas, como se ela tivesse sido segurada debaixo d’água.
Os dois irmão dela, Gerard e Jake, davam aulas de alpinismo e no domingo os dois foram sozinhos, acho que foram sozinhos na intenção de espairecerem um pouco.
Depois de terem despencado do morro a polícia, que na nossa cidade nunca trabalhou tanto em homicídios, constatou que não foi um acidente e as cordas foram cortadas.
Agora era minha vez.
Não suportava mais a idéia de que eu ainda estava viva e meus amigos tinham morrido por vingança de uma maldita fantasma.
Fantasma sim.
A que ponto cheguei. Logo eu que duvidava até mesmo da existência de Deus.
Gerard tinha se apoiado na lápide do túmulo e sem querer a quebrou, mas isso não teria acontecido se eu e minhas idéias estúpidas não tivéssemos agido naquela noite.
Meus pais tinham saído de casa e eu sabia que não poderia enfrentar a morte sozinha.
Eu estava cansada física e psicologicamente, mesmo tendo passado o dia inteiro deitada.
Me lembrava de cada segundo ao lado de Gerard, de cada fim de semana na casa de Eidi e de cada minuto que passei conversando com Jake e Luíse.
Levantei-me da cama e segui em direção a cozinha.
Olhei para o espelho e notei os seguintes escritos “Não restará nada”. Estremeci.
Saí do quarto com a cabeça girando e tentando me esconder na ilusão de que fora apenas mais um mistério em volta da nossa mente.
Mentira. Estava enganada. Era tudo concreto como mármore.
A casa estava escura e a escada por onde eu passava todos os dias sem ao menos notar já me parecia alta demais.
Fui tomada por uma tonteira absurda e me faltava o ar.
Desci as escadas pulando alguns degraus e descendo meio desajeitada.
Quando em fim estava na cozinha busquei por água e sentia uma ardência enorme quando a água descia pelo meu esôfago.
Senti uma força puxando meus cabelos para trás e depois percebi que entre os cachos do meu cabelo havia uma mão gélida e de pele pálida.
Fui sendo arrastada e consegui me libertar por uma fraqueza repentina da mão que me segurava.
Corri para a biblioteca mas não consegui fechar a porta porque a garota branca de cabelos pretos e olhos escuros se enfiara entre a porta e o fecho.
Corri até a estante e quando me virei ela estava em minha frente.
Caí no chão.
O grampeador da mesa veio flutuando até sua mão e ela sem dó alguma começou a perfurar minha pele.
Começou pelo braço e depois do quarto furo fui ficando entorpecida pela dor.
Fechei os olhos e depois de mais alguns segundos não estava mais ali.
O que aconteceria com minha mãe a me ver naquele estado?
A última coisa que senti foi o sangue escorrer pelo pescoço e começar a formar uma poça que molhava meus cabelos.
Parei de respirar.
Pronto.
A morte chegara para finalizar seu trabalho.