FOBIA
 
“É surpreendente a capacidade humana de criar situações constrangedoras para si e para seus semelhantes.”


 
Há na vida humana momentos difíceis de lidar. Herdeiros que somos de nossos antepassados, existem medos arraigados que podem nos apavorar, como o de ataques predadores a nos ameaçar a sobrevivência.
Forças poderosa da natureza, no entorno do cotidiano, podem redespertar os instintos ancestrais. Mesmo hoje, na contemporaneidade, é patente determinados momentos em que sentimos impotência diante de forças que
se interpõem maiores, que surgem e que parecem quase impossíveis de serem vencidas, num terror recalcitrante. Quem não sentiu um certo pavor de ser atacado pelas perturbações que podem nos remeter à angústia, ao desespero? São instantes delicados, onde temos maiores dificuldades de manter o controle de nossas mentes, diante daquilo que representa perigo para nosso ser; quando precisamos de um corrimão defronte ao precipício para nos ancorarmos e evitarmos a queda.
É o desespero, a agitação, um palpitar inconstante que produz taquicardia, seguida de uma sufocação e, por fim, total paralisia. O medo, nesse momento, se transforma em pânico até que, no possível, retome-se o controle, lute-se contra o medo, acreditando-se capaz de vencer, cercando o inimigo, dissipando as sombras que existam em nossa mente, numa atitude pró-ativa.
Assim ocorreu comigo e agora, vencida a angústia, posso escrever livremente, não me responsabilizando, porém, de agora em diante, pelas sensações que essa experiência transcrita possa provocar no leitor.
Era uma noite de transição entre o verão e o outono e começava a chover. Insone, estava eu sentado no sofá da sala, diante da TV, de onde assistia um filme do qual gostava muito. Eu já sabia quase todos os detalhes da trama e das falas do filme mas, inevitavelmente, retomei a assistí-lo quando “zapeava” os canais. Fiquei ali, entre um suco de frutas e um salgadinho, revezando goles e mordidas. Vez ou outra, esticava o corpo observando a janela de onde podia ver a vizinhança distante. De fato, minha casa, no alto da colina, distava pelo menos uns duzentos metros das residências mais próximas. O que me desconsolava nessa visão era um matagal que havia florescido em dois terrenos próximos, pelo qual já havia notificado à prefeitura, mas sem retorno condizente com o problema. Me conformava saber que aquilo fazia parte do preço de residir numa espécie de paraíso. Após retomar o assento, estava prestando atenção numa determinada atriz, que agora estava bem mais madura, quando começou a trovejar, ao mesmo tempo em que uma bateria de relâmpagos jogava clarões intermitentes. A seguir, a energia elétrica caiu, apagando a luz em todo o bairro e a intensidade dos trovões e relâmpagos aumentou, estremecendo a casa, com o céu fazendo cair uma tempestade. Tudo mergulhou numa escuridão entremeada de sombras, imagináveis como assustadoras. Os ventos sopraram mais forte provocando ruídos indistintos.
De repente, senti um calafrio percorrer todo o meu corpo, desde a nuca até a base da espinha dorsal. Uma agitação começou a tomar conta do meu ser e o coração disparou. Eu senti-me sufocar, quase tomado de desespero. Tentando retomar a lucidez, repetia intimimamente “controle-se, você pode mudar a situação, controle-se...”. Num esforço de luta e coragem, verificando a situação que ocorria diante daquela visão terrível, que parecia indomável tal a sua absurdidade, meu cérebro, consciente, retomou o controle, fazendo com que eu conseguisse resolver o drama. Tudo se passara como num filme em câmara-lenta: a energia elétrica havia retornado de repente, a tela da TV se acendeu, fazendo surgir a visão dantesca de um “reality-show”. Felizmente, com a retomada da serenidade, conseguira pegar o controle remoto e trocar de canal. Estava passando mais uma dessas propagandas idiotas de condicionamento físico com aqueles aparelhos que servem apenas para aumentar o volume dos ferros-velhos, ruim como sempre, mas pelo menos pude me livrar do demônio em forma de programa imbecil que, algumas vezes, insiste em invadir o lar de pessoas honestas. Graças a Deus!