Tiro no Escuro
“Memórias que desaparecem; Um tiro no escuro!
Um passo atrás de você! Apenas um tiro no escuro.
Não há nada que você possa fazer”
Ozzy Osbourne
Depois de cinco anos consegui sair de casa!
Desde a morte da minha esposa numa tentativa de assalto trancafiei-me em mim mesmo. A Síndrome do Pânico me assaltou. Levou minha liberdade, minha alma, meu eu.
Sou militar aposentado sabe? Vivo numa casa modesta, mas bacana. Gosto de ler, escrever e ouvir música.
Várias vezes conversei com minha esposa morta. Visita-me de quando em quando.
Depois de velho tive acesso à Internet. Compro tudo sem sair de casa. Uma maravilha para pessoas como eu.
Hoje vivo armado. As janelas da casa são parafusadas, algumas soldadas. Na porta fechadura especial e trincos. Confiro tudo, cinco vezes, sempre. De noite acordo e confiro de novo. Debaixo do travesseiro minha Magnum .357, companheira fiel, dedicada, fria, calada. Sem ela não sou ninguém. Acompanha-me por todos os lados.
Numa noite acordei assustado.
Um barulho na porta. Alguém tentava entrar. Levantei-me. Tudo escuro.
Impressionantemente o impostor já estava dentro de casa.
Caminhei como um gato atrás dele. Cheguei bem perto com minha companheira e acertei-lhe a nuca. O safado caiu estatelado.
Cinco anos sem sair de casa! Cinco! Para mim não fazia tanto tempo assim.
Nesse dia tive que sair. Fui a um funeral. Praga! Odeio funerais! Foi com muito esforço e insistência de alguns que acabai indo... Que droga!!
Quem estava no caixão era um rapaz de uns 26 anos. Havia sido morto com um tiro na nuca por uma Magnum.
Não me lembrei que tinha um filho e que... Morava comigo...
Quando o vi, ali no caixão, serenamente pálido lembrei-me: Quando ele caiu morto na sala e o sangue saindo-lhe aos borbotões vi minha velha acenando para eu parar. Depois ela o recebeu nos braços e ambos foram embora.
Eu? Na hora fiquei parado sem entender nada!
Só fui reparar que matei meu único filho quando me levaram para a delegacia.
Continuo preso em mim mesmo. Enclausurei-me para escapar da podridão do mundo e me afoguei em mim mesmo.
Depois do enterro serei recolhido para a Penitenciária Militar Federal. Tomei o cuidado de colocar uma meia forte e comprida o suficiente. Meu objetivo é evitar que se rompa com meu peso e eu não reencontre minha mulher e meu filho.