CAÇADA NOTURNA PARTE 2 - TRYSTANNA - A VINGANÇA DA ALCATÉIA

Deitado em sua cama, com a janela do quarto aberta, conseguia vislumbrar o céu claro de uma noite estranhamente limpa, e de lá, da parte alta da casa, conseguia enxergar a copa das árvores, que se estendiam até o pequeno vilarejo, a floresta era bem fechada naquela área. Era de lá que vinham as feras que caçava, ele sabia que se organizavam durante o dia, e partiam em caça nas noites de lua cheia.

Mas, para o azar das bestas, ele e seus fiéis seguidores não permitiriam nunca que esse mal vingasse em sua região. Não, ele não permitiria que fizessem estragos em seu quintal, e em sua sala estavam expostas as provas de que era ele quem mandava ali, as cabeças pregadas na parede serviriam de aviso para qualquer adorador da lua.

Lua essa que se apresentava diferente naquela noite, seus contornos, estranhamente avermelhados, transmitiam uma sensação de mau agouro. Ele teve a impressão de ter ouvido algo, mas não haveria de ser nada, afinal, seus homens sempre montavam guarda todas as noites, e a garantia da prata estava em seus rifles.

Mas, de fato, aquela seria uma noite diferente, os gritos que se seguiram comprovaram o seu pressentimento. Som de disparos ecoavam pela propriedade, o caçador correu com a arma carregada e pronta em seus braços. Ao chegar no lado de fora, seu sangue gelou, até mesmo ele, homem experiente no assunto, ficou perplexo, vários corpos despedaçados, o chão de pedras manchado em vermelho, e o que um dia foram seus homens, não passavam, agora, de um monte de retalhos humanos, mas algo o intrigava, as feras não os devoraram, qual seria o motivo? O onde elas estariam? Por mais estranha que fosse a idéia, ele decidiu seguir para a mata, e ao olhar para trás, ainda conseguiu visualizar uma grupo de pessoas que se preparava para atear fogo em sua casa.

Já no meio da floresta percebeu a fumaça que indicava que toda a história da sua família ardia em chamas. Decidiu que não fugiria, se fossem as feras, ou se fossem humanos, não importava, ele acabaria com todos.

Engatilhou a arma e se preparou para enfrentar o inimigo, sabendo que a essa altura poderia esperar qualquer coisa. Uivos foram ouvidos, os rosnados estavam próximos, segurou o cano do rifle com a mão esquerda, posicionou o dedo indicador no gatilho, fazendo mira na direção da clareira aberta, por onde viera. Sua respiração era entrecortada, fazia uma prece, se lembrou da fé nessa hora, o suor da tensão brotava em sua fronte, logo pontos amarelados começaram a surgir a sua frente. Não hesitou, começou a disparar, sua vida dependia disso, porém, antes que se desse conta, recebeu uma patada nas costas, tão violenta que o levou ao chão com imensos cortes onde recebera o golpe. O sangue jorrava farto, procurou a arma, mas uma pata peluda e com garras imensas interrompeu sua investida.

A fera estava de pé, e nessa posição, chegava fácil aos dois metros de altura, era horrenda e estava cercada por várias outras de sua espécie. O ser da noite agarrou o caçador pelo pescoço, e o mordeu no ombro, apesar de não ter usado toda a força de sua mandíbula, o osso omoplata e a clavícula foram partidos facilmente. Não havia palavras para descrever a sua dor, fora jogado ao chão, e qual não foi sua surpresa ao presenciar a transformação da fera à sua frente. O som ouvido era parecido com o de ossos quebrando, os pêlos caíram e aos poucos a fisionomia se tornava mais parecida com a de uma pessoa, ao fim revelara-se por completa.

- Caçador, meu nome é Trystanna, sou líder deste clã, e saiba que aquele que você matou, luas atrás, seria o meu sucessor. E saiba, também, que a carne dos que matamos hoje não serve nem para nos alimentarmos. Você deve estar se perguntando o porquê de suas balas de prata não terem resultado no efeito usual hoje, e eu te respondo, veja – a mulher apontava para a lua no céu, extremamente vermelha – ela é chamada lua de sangue, e nessa lua, caçador, nós somos invencíveis, veja, hoje eu posso me converter como bem quiser, e temos domínio sobre as nossas ações, não ficamos escravos do instinto.

As outras feras permaneciam ao redor rosnando e uivando, ameaçando o homem caído.

- Não tenha medo, caçador, nós não vamos te matar, o seu castigo será outro, eu provei da sua carne, logo você será um de nós. Mas, sempre há uma alternativa – olhou para a arma caída – você ainda é humano, em você fará efeito.

A alcatéia correu livre pela noite, instantes depois, o som de um disparou ecoou pela mata.

Flávio de Souza
Enviado por Flávio de Souza em 09/02/2009
Reeditado em 28/10/2009
Código do texto: T1430064
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