PARA SEMPRE! (PRIMEIRA PARTE)

Fabio estacionou o carro em frente ao prédio da namorada como sempre fazia quando eles não saíam no sábado à noite.Deu dois reais ao guardador e entrou no edifício.Dentro do elevador tirou do bolso da jaqueta jeans uma caixinha negra,abriu-a e certificou-se de que as alianças estavam lá.Elas simbolizavam o compromisso que estava prestes a assumir após dois anos de namoro.

Ao contrário do que esperava,ele não sentia medo,mas sim uma serenidade e harmonia internas.À medida que os andares eram vencidos pela cabina móvel,a certeza de que havia encontrado a parceira ideal aumentava.

Apertou a campainha do apartamento 606,e logo depois sua futura sogra abriu a porta.Com a voz anasalada de pessoa gripada,a senhora de cabelos ruivos e olhos miúdos o saudou:

__Boa noite;tudo bem meu filho?

__Tudo dona Ana.

Fabio fez menção de beijá-la mas foi impedido:

__Não me beija que eu estou muito gripada.Não quero que você fique também__disse ela.

__Mas que besteira!__contrariando a sogra,deu-lhe um beijo na testa.

__Você heim!Vai lá que a Sofia está te esperando no quarto__deu um tapinha carinhoso nas costas dele.

Fabio limpou os pés no capacho e entrou,passou pela sala e cumprimentou o padrasto de Sofia,que lia um livro.Era um homem alto e largo.Lembrava o fisiculturista que fazia o incrível Hulk num seriado televisivo dos anos setenta.O pai biológico da moça havia morrido quando ela tinha apenas três anos.O assunto era tabu naquela casa,e Fabio resolveu que não perguntaria nada até que a namorada,futura noiva,decidisse contar.

O quarto de Sofia estava na penumbra e o aparelho de CD tocava uma música de Gilberto Gil.Fabio entrou devagar e sentou-se ao lado da namorada,que estava deitada na cama tirando uma soneca.Ao sentir a cama balançar,a moça acordou do cochilo.Ao ver o namorado,acendeu a luz do abajur e sorriu,mostrando as covinhas do rosto.Depois falou:

__Eu não ouvi você tocar a campainha.

__Sua mãe abriu para mim.Você melhorou do mal estar?

__Mais ou menos.Tomei uma aspirina e a dor de cabeça diminuiu.

__Foi por isso que você não quis sair hoje?

__Foi.Não tem graça sair assim,não é?

__Realmente...Olha;eu peguei um filme no vídeo__mostrou uma sacola plástica contendo um DVD.

__Legal.Do jeito que eu estou com sono preciso de alguma coisa que me distraia para eu não apagar.

__Está tão ruim assim?

__Está.Pedi até para a mãe colocar logo o lanche para nós.Comer espanta o sono.

Nesse momento,a mãe de Sofia entra no quarto trazendo um prato de cachorros quentes e uma garrafa de coca cola.Pede licença,acende o lustre e coloca tudo em cima de uma mesa de armar no centro do cômodo.Deseja bom apetite ao casal e sai.Sofia levanta-se e abre o refrigerante.Ao sentir a temperatura da garrafa,diz:

__Mamãe não colocou isso para gelar com antecedência.Vou na cozinha colocá-la no congelador e pegar um pouco de gelo para você.

__Você é tão boa para mim__brinca Fabio,ao ver a preocupação da moça com ele.

Sofia leva a garrafa e retorna com o copo já cheio de coca cola e gelo.Fabio o pega e bebe a metade do conteúdo de um só gole.O prato de cachorros quentes é devorado rapidamente enquanto os dois vêem o filme trazido por Fabio,uma comédia romântica.

Lentamente,uma sensação de moleza apodera-se de Fabio.É uma mistura de fadiga e sono.Pede à Sofia que o deixe esticar-se na cama.Em outras ocasiões,já havia cochilado antes na casa da namorada.Como nos outros dias da semana,também acordava cedo no sábado para trabalhar.Assim,o silêncio do apartamento de Sofia,que ficava no décimo quinto andar,"cobrava" as horas não dormidas acumuladas.Confortável e seguro,deixou-se levar por aquele torpor agradável e dormiu.

Com o fim das trevas veio a dor de cabeça.Sentindo-se apertado e sem ar,Fabio abriu os olhos.Para seu espanto,tinha as pernas e braços amarrados por cordas de nailon,e sua boca selada por um esparadrapo.Encarando-o,estavam Sofia e a mãe.Ao vê-lo acordar,a sogra falou para a filha:

__Eu falei para você dar o sonífero todo.Agora ele acordou antes do tempo.Vai dar mais trabalho para transportá-lo até a clínica.

Fabio gelou.Sonífero?Clínica?O que estava acontecendo?Olhando para baixo,sem encará-lo,Sofia pediu à mãe que os deixassem a sós.Visivelmente à contra gosto,a mulher saiu.Não tinha mais o olhar carinhoso com o qual Fabio acostumara-se.Sofia,então,começou a falar:

__Você deve estar se perguntando o que é tudo isso,não é?

Os olhos arregalados de Fabio concordaram com ela,que continuou:

__Lembra quando eu te contei do problema hepático/degenerativo da minha família?

Fabio balançou a cabeça positivamente.

__As vezes ele pula gerações,e como meu pai o tinha,esperava que eu estivesse a salvo;mas uns exames que fiz há dois anos revelaram que não só o possuo,como é num grau avassalador.Se eu não fizer um transplante total de fígado,posso morrer em menos de um ano.

Fabio levou um choque.Doente?Sofia esbanjava saúde!Nunca a vira cair de cama ou faltar à faculdade por enfermidade nos dois anos em que a conhecia.Como aquilo podia ser verdade?Parecendo adivinhar os pensamentos do namorado,Sofia explicou:

__Minha aparente saúde é mantida à base de remédios caríssimos vindos do exterior.Como você sabe,meu padrasto trabalha numa grande compania aérea e tem mais facilidade de trazê-los.Estou na espera do órgão.Minha vez estava próxima,mas o critério foi mudado e,por ironia,minha "saúde" jogou-me para o fim da fila.Estava com medo que não tivesse resistência para aguardar até que chegasse a minha vez.Aí você apareceu.

O padrasto de Sofia apareceu na porta do quarto e a chamou.Fabio é deixado sozinho no escuro.Grogue,ele tenta soltar-se,mas tudo que consegue é apertar ainda mais os nós.Minutos depois,a luz do cômodo é novamente acesa,o padrasto entra e,sem esforço algum,retira Fabio da cama e o carrega para fora como se fosse um saco de batatas.O prisioneiro tenta se debater,mas é punido com um tapa na cabeça que o deixa mais tonto ainda.Na sala estão dois homens que ele nunca vira antes.O mais baixo,de barba grisalha,pega um lenço e o umedece com um líquido de cheiro forte.Depois tampa as narinas de Fabio com ele.Apenas três segundos são suficientes para "apagar" novamente o cativo.O outro homem,mais alto e calvo,pergunta para o padrasto:

__Você já preparou tudo?

__Sim!Vamos descer pelo elevador de serviço direto para a garagem.Eu separei uns plásticos pretos que usaremos para disfarçar o "mané".Ele vai virar um tapete persa.

Os três riem diabolicamente.Sofia e a mãe interrompem a selvageria ao entrarem na sala.Com a fisionomia séria,Dona Ana dá a ordem:

__Vamos acabar logo com isso!