EU VEJO GENTE MORTA

Sou como aquele guri do filme O Sexto Sentido, sabe?

- Eu vejo gente morta.

- Com que freqüência?

- O tempo todo.

Vejo tanto, que ás vezes, quando ando na rua fico meio confusa, pensando:

- De todas essas pessoas que estou vendo, quantas são vivas e quantas são mortas?

Algum leitor cético, neste momento pode estar pensando:

- É mentira. Afinal, porque ela conseguiria ver fantasmas se eu mesmo nunca vi nenhum?

Não sei. Não faço a menor idéia. Não me pergunte por que isso acontece comigo, mas o fato é que acontece.

A história que vou narrar a seguir foi verídica e tenho duas testemunhas pra comprovar.

Aconteceu num sábado à noite, quando duas amigas me convidaram pra ir ao pagode. Não gosto muito de pagode, mas eu não tinha nada melhor pra fazer, então fui.

Dançamos a noite toda e bebemos algumas cervejas. Apenas algumas, não muitas. Quero deixar bem claro que não estávamos bêbadas. Ficamos até o final da festa, porque uma das gurias queria “bater um papo” com o vocalista da banda.

Quando quase todo mundo já tinha ido embora, decidimos ir ao banheiro, mas o banheiro estava ocupado e de dentro dele vinham as vozes de três mulheres:

- Me empresta o batom?

- Bonito esse vestido preto.

- Parai que eu vou arrumar melhor o seu cabelo.

- Você viu com quem ele estava?

- Vi sim. Há, há, há.

- Deixa estar que ele vai me pagar caro. Ah se vai!

- Há, há, há.

Nós esperamos pacientemente por algum tempo, mas a conversa estava demorando muito e resolvemos bater na porta. Elas continuaram conversando sobre mil e um assuntos, dando gargalhadas e não nos deram a menor importância. Forçamos a maçaneta da porta, mas estava trancada à chave. Ficamos nervosas e começamos a gritar:

- Saiam daí gurias! A gente ta apertada.

Batemos, gritamos, fizemos um escândalo, mas mesmo assim elas não saíram. Continuavam conversando alegremente como se não estivéssemos ali:

- Não gostei daquele baixinho. Muito sem graça pro meu gosto.

- E o moreno? O que você achou?

- Hum! Não sei. Talvez...

Mais uma vez nós forçamos a porta e então, ela se abriu. Olhamos pra dentro do banheiro, as luzes estavam ligadas, mas tudo estava no mais absoluto silêncio.

- Cadê elas? Onde estão?

- Não tem ninguém aí dentro.

- Mas como não?

Simplesmente não havia ninguém no banheiro. Ficamos mudas e pálidas por alguns segundos. Lentamente fomos entrando, verificando tudo, tentando encontrar uma explicação lógica pro que tinha acabado de acontecer.

Não havia nenhuma outra porta, ou mesmo uma janela pela qual elas pudessem sair sem serem vistas. Havia apenas uma basculante, através da qual não passava nem sequer o meu braço.

Minhas amigas ficaram desorientadas. Uma delas perguntava sem parar:

- Vocês ouviram o que eu ouvi, não ouviram? Tinha gente aqui dentro, não tinha? A porta estava trancada, não estava? Eu não estou louca, estou?

Não. Ela não estava louca. Nós três presenciamos a mesma coisa. Não havia como negar.

Eu, que já estou acostumada com essas coisas, fiquei muito tranqüila e decidi usar o banheiro mesmo assim. Depois fomos embora. Elas nunca entenderam direito o que aconteceu, e pra dizer a verdade, eu também não entendi muito bem.

Eu só sei dizer que dessa vez, não vi gente morta como de costume, mas ouvi. E mais gente ouviu comigo.

A Alquimista
Enviado por A Alquimista em 07/05/2008
Reeditado em 26/11/2009
Código do texto: T978514
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