O HOMEM DE NEGRO

Moro na fronteira do Brasil com o Uruguai, e já faz algum tempo que anda por aqui uma conversa sobre um tal Homem de Negro. Um uruguaio, que de acordo com o que o povo conta, parece ser uma mistura de lobisomem com Batman e Homem Aranha. Dizem que ele veste uma capa preta, que corre numa velocidade incrível, que sobe nos telhados, que uiva pra lua, que os olhos dele brilham no escuro e que nunca ninguém conseguiu alcançá-lo. Enfim, só falta o povo dizer que o tal homem voa. Mas o caso é que eu nunca tinha visto, nem ouvido falar na criatura até os acontecimentos que vou narrar a seguir.

Era um dia nublado de outono, quando eu e uma amiga saímos pra fazer nossa caminhada diária. O sol já estava se pondo, em breve iria escurecer, então decidimos fazer nosso exercício físico do outro lado da fronteira, pois o lado uruguaio além de ser mais iluminado, tem mais carros e gente transitando pra lá e pra cá, então seria mais seguro. O fato é que nos empolgamos demais com a caminhada e passamos do horário previsto. De modo que no caminho de volta, a cidade já estava um tanto quanto “morta” e talvez porque a noite estivesse muito úmida, havia uma espécie de névoa no ar.

Estávamos há umas três quadras do cemitério, quando senti uma presença nas minhas costas. Olhei pra trás e vi um homem pra lá de sombrio. Muito alto, muito magro, pele morena, olhos verdes, vestido de preto dos pés a cabeça. Falando assim, você, caro leitor, até pode pensar que era um homem bonito, mas não era. Até que tinha certo charme, mas era muito feio de rosto. Pra dizer bem a verdade, quando olhei pro rosto dele tive a impressão de que tinha se batido com o diabo, de tão feio que era. Minha amiga, que vinha totalmente distraída, falando até pelos cotovelos, não percebeu a presença do homem.

Ele nos seguiu por umas dez quadras. Num dado momento, quando ele já estava quase colado nas minhas costas e não havia mais ninguém caminhando na rua além de nós três, minha amiga olhou pra trás e tomou um susto. Começamos a caminhar cada vez mais rápido, mas foi pior, se apressávamos o passo ele também apressava, se diminuíamos, ele também diminuía. Decidimos então atravessar a rua, mas ele atravessou logo atrás. Foi quando, com a graça dos Deuses, do evangelho, de todos os santos e de todos os orixás, avistamos uma oficina, que estava aberta e cheia de gente. O pessoal estava fazendo um churrasco. Paramos bem em frente, com a desculpa de que eu precisava amarrar os tênis e ele se viu obrigado a passar reto. Seguiu caminhando bem devagar, olhando pra trás, nos engolindo com os olhos. Ficamos ali paradas durante algum tempo e decidimos, então, chamar um táxi.

Alguns dias depois, minha amiga estava no salão de beleza, quando comentou com o cabeleireiro o fato ocorrido. Um policial uruguaio, que estava esperando para cortar o cabelo, ouviu a conversa e disse:

- Você e sua amiga são doidas. Vocês estão pedindo uma garoa com vento. Se vocês querem fazer caminhadas, então caminhem durante o dia, e nunca mais vão pros lados do cemitério depois da caída da noite. Provavelmente, o homem que perseguiu vocês é um estuprador que o povo chama de Homem de Negro. Estamos atrás dele há meses e não conseguimos prendê-lo. Ele se veste todo de preto, tem pernas muito compridas, corre muito rápido e salta pelos telhados.

Enfim, se era mesmo o tal Homem de Negro ou não, eu até hoje não sei. Mas que o susto foi grande, isso foi.

A Alquimista
Enviado por A Alquimista em 29/04/2008
Reeditado em 18/09/2009
Código do texto: T966635
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