OS OLHOS VIVOS DO INCONSCIENTE

Sentado na cama, ele olhava para o telhado, ainda imerso na penumbra entre o fim da madrugada e o início do alvorecer. A sensação era de que seu corpo levitava, como se algo agisse sobre si automaticamente. Mas tudo parecia tão normal.

Levantou-se e pegou o short e a camisa que sempre deixava próximos à cabeceira da cama. Calçou os tênis e estava pronto para sua caminhada matinal. Não tinha o hábito de sair de casa naquele horário, e uma certa estranheza pairava no ar — ele podia sentir. No entanto, ao mesmo tempo, uma força maior, inconscientemente, o incentivava a seguir caminho.

Abriu a porta e, assim que colocou os pés na rua asfaltada, a sensação de anormalidade foi aumentando, fazendo seu corpo quase tremer de inquietação. Não conseguia compreender por que continuava caminhando, enquanto suas pernas pediam para parar.

Ninguém nas ruas. Nenhum gato, nenhum cachorro. Sem ronco de motores ou buzinas. Nada. Um silêncio total!

Aos poucos, seu corpo foi se acostumando com o momento, e ele seguia de cabeça erguida, seus passos ritmados na aparente normalidade. Seus olhos fixos na estrada, nada mais o preocupava. Nem mesmo algo que pudesse surgir das laterais do asfalto. Alguma força superior o guiava em direção à lagoa, e sua consciência dizia que não adiantava lutar contra. Sabia que não teria forças para tanto.

O homem continuava seu caminho, e sua vista para o nascente o fazia perceber o sol tentando nascer, mas aquela força estranha parecia impedir o dia de clarear. Assim, ele chegou à lagoa.

As águas sempre lhe causaram pavor, mas nem isso conseguia demonstrar. Sentia dificuldade em olhar para os próprios pés, numa tentativa de parar e evitar se aproximar da margem. Tudo em vão! Parou a menos de um metro da água e ali ficou imóvel, olhando para o final da lagoa. Não entendia o porquê daquele gesto. Simplesmente mirava fixamente o horizonte.

Passados alguns minutos, viu emergir do fundo da lagoa uma luz forte e brilhante. Uma bola de fogo, que permaneceu estática a um metro da lâmina d’água. A luz e o homem encaravam-se mutuamente, como se estudassem um ao outro com o olhar. Em frações de segundos, ele teve lapsos de consciência, compreendendo, por um instante, as nuances do que acontecia. Seu corpo tremia de medo, e seu olhar traduzia a percepção de que havia chegado o seu momento final.

Ele não conseguia pronunciar nenhuma palavra, mas a pergunta estava estampada no pavor de seu rosto. A luz, apesar de intensa, não iluminava as águas da lagoa — tudo permanecia na escuridão e no mais absoluto silêncio.

O tempo passava, e o dia não clareava. De repente, o homem percebeu que, aos poucos, a luz se aproximava dele. Ele não conseguia mexer as pernas, e seu olhar estava fixo na esfera incandescente, cada vez mais próxima.

Num esforço sobre-humano e por puro instinto de sobrevivência, conseguiu mexer um dos pés. Seu corpo suava, e ele sabia que não podia desistir de si mesmo. Quando a luz chegou ao centro da lagoa, ele soltou um gemido rouco de alívio, no instante em que deu um passo para trás. Nesse momento, a luz cresceu e parou. O homem recuou mais três passos e, então, virou-se em direção à saída da lagoa.

Caminhou apressado para sair dali, e, de tempos em tempos, olhava para trás. A luz permanecia no mesmo lugar. Quando finalmente alcançou o asfalto da estrada, como num passe de mágica, o sol brilhou pleno, o ronco dos motores ressoou de todos os lados, e ele, enfim, pôde respirar aliviado — com vida.

Henrique Rodrigues Inhuma PI
Enviado por Henrique Rodrigues Inhuma PI em 21/03/2025
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