COORDENADOS
Alfeu desceu do helicóptero com outros cinco soldados na base aérea de São Simplício, no Estado Central. Apresentou os documentos de dispensa e seguiu para o número 35 da Rua Prudente de Morais, no Conjunto HAB-14 em um táxi de cor prata, placa AYR-0F16.
Alceu desembarcou na Rodoviária de Horizonte Azul às 10h38. Conseguiu desenrolar-se com seus tickets rapidamente. Chegou ao ponto de táxis em oito minutos. Levou outros dez para descer diante da lanchonete “O Bom do Pedaço”, defronte a boca de entrada da Estação Avenida do metrô.
Alfeu passou sob a Unidade Habitacional, saindo pelo portão traseiro, acessando a Rua Washington Luiz e a garagem de número 112. Entrou em um Fiat 147 branco, placa CGF-1247. Trocou as roupas, embalando-as em um saco plástico preto que jogou no contêiner junto ao lixo doméstico. Saiu depois em direção ao centro da cidade. Já estava disfarçado como um idoso de cabelos brancos, ralos, com barba por fazer.
Alceu desceu do metrô a duas estações do Edifício Esplanada. Passou pelo salão de barbeiro do Antunes Fontes. Marcou hora para cabelo e barba a partir das 14h30. Entrou na quitanda, comprou tomates. Entabulou uma conversa com o proprietário a respeito de temperos para um molho do macarrão. Já no edifício, retirou um envelope na portaria antes de subir para o apartamento. Bateu os tomates com alguns temperos. Cuidou de deixar o copo do liquidificador na pia para lavar. Pistas.
Alfeu estacionou o Fiat na esquina das ruas Salesópolis e Ribeirão Preto as 11h08, sob uma árvore sexagenária. Prendeu no painel, deixando aparente para qualquer fiscal de trânsito a carteira de isenção de taxa de estacionamento para idosos. Subiu a Ribeirão Preto, dobrando à esquerda na Rua São José. Entrou na lavanderia do número 340, apresentando um ticket para retirar uma camisa social azul em nome de Ernesto Pereira. Caminhou então até o número 492, duas quadras adiante. Anunciou a entrega destinada ao apartamento 93 do Edifício Almirante Barroso ao porteiro. O homem interfonou e um gravador previamente preparado do outro lado da linha, autorizou a entrada do entregador.
Alceu deixou o apartamento por volta das 12h41 em um Monza vermelho, placa BIN-9214. Vestia o uniforme da companhia telefônica disfarçado como um homem de cabelos vermelhos. Estacionou diante do Hotel Continental. Apresentou o registro de inspeção do roteador de sinal de internet, com data do dia anterior. A solicitação foi da recepcionista em serviço. O porteiro o liberou sem questionar. Desceu até a central telefônica no subsolo. Enfiou-se entre dois carros, tirando o disfarce e embalando-o como lixo.
Alfeu vestiu luvas cirúrgicas após livrar-se da câmera de segurança do elevador. Entrou no 93 com a chave recuperada no bolso da camisa da lavanderia. Foi até a janela e contemplou a paisagem que se oferecia aos olhos. Fixou-os na multidão aglomerada à cerca de 250 metros, diante da corda de isolamento do Museu recém reformado. Teria pouco mais de meia hora para preparar a arma.
O verdadeiro funcionário da companhia telefônica acenou para um manobrista do hotel ao subir a rampa a pé após finda a inspeção. Alceu já estava no quarto 902, montando o AW50. A janela daquela suíte lhe dava visão plena do púlpito de onde seu alvo discursaria para a multidão que já se aglomerava na Praça da Liberdade. Enquanto encaixava as peças do fuzil, rememorava suas próximas instruções.
A ponta de um silenciador surgiu entre as cortinas do apartamento 93 do Edifício Almirante Barroso, exatamente as 14h08 do sábado, três de abril. Alfeu deixava o prédio sete minutos depois. Do outro lado do país, o procedimento se repetia na suíte 902 do Hotel Continental. Alceu saiu do elevador no lobby, as 14h18.
Em outro lugar do país, a tela dividida de um computador mostrava imagens em simultâneo. O discurso do Presidente da República durante as comemorações da independência do lado esquerdo do vídeo. O discurso do Governador da Província de Marisales, líder da oposição, na reinauguração do Museu, à direita.
Quatro coisas aconteceram então. Um homem ergueu uma pistola e disparou dois tiros diante do Governador, no momento em que cortava a fita cerimonial. Uma bala de fuzil ponto cinquenta cravou-se numa placa de granito no piso. Em sincronia, na capital, uma mulher disparou três tiros no Presidente, acertando dois. O terceiro furou a cobertura de lona do púlpito. Uma bala de fuzil ponto cinquenta acertou o ombro do Chefe de Gabinete quando corria para tentar se interpor diante das balas da agressora.
Os cabeças estavam mortos conforme o planejado. Mas para desgosto do General, suas balas erraram os alvos. Jogou o controle remoto dos AW50 no chão e pisoteou-os. Os políticos permaneceriam no comando e pouco se faria a respeito de balas ponto cinquenta cortarem o ar no mesmo instante dos assassinatos. A investigação sobre elas, se arrastaria a passos lentíssimos.
A bagunça da nação permaneceria a mesma. Sem qualquer menção ou possibilidade de estourar uma Guerra Civil entre o grupo dominante e os militares. Uma revolta na qual apenas o General Porfírio Siqueira seria vitorioso.