O Fantasma de Hitler

A guerra terminara, mas o espectro de Adolf Hitler ainda rondava as ruínas da Alemanha. Os escombros ecoavam os horrores de um passado recente, e as ruas de pedra, cobertas de cinzas e sangue seco, ressoavam os lamentos dos que sobreviveram, em busca de um fio de justiça para sua dor. Alfred, um comerciante simples de olhos azuis, vagava entre esses destroços, ainda alheio ao terror iminente.

Era um antigo morador daquela cidade afastada de Berlim, dono de um pequeno negócio onde tentava reconstruir a própria vida. Contudo, o tumulto da guerra espalhara pessoas desconhecidas pela região, substituindo velhos conhecidos por rostos novos, com marcas do sofrimento e da desconfiança. Para esses recém-chegados, Alfred não era apenas um comerciante: ele parecia uma viva reencarnação de Hitler. A semelhança era tão perturbadora que até a voz de Alfred, rouca e firme, lembrava os discursos do ditador, o que gerava arrepios e revolta onde ele passava.

À medida que o rumor se espalhava, a rua foi tomada por uma turba crescente de homens e mulheres, crianças, jovens e idosos – uma multidão irada, unida em sua sede de justiça, composta por judeus, católicos, protestantes, muçulmanos, budistas, esotéricos, filósofos e livres-pensadores. Cada qual, à sua maneira, nutria o mesmo ódio pela figura que via em Alfred: um homem cuja aparência parecia trazer de volta o mal absoluto.

“Hitler, chegou seu fim!” gritavam alguns. “Você matou muitos – hoje não escapa da morte!” Outros erguiam os punhos e clamavam: “Você não vai fugir, cão sádico!” Alfred, desesperado, erguia as mãos num gesto de súplica e tentava gritar, sua voz soando incrivelmente similar àquela que um dia arrastara multidões ao caos. “Por favor, ouçam-me, sou Alfred, apenas um comerciante!” Mas as vozes em fúria mal o deixavam ser ouvido.

Entre os presentes, famílias inteiras lembravam-se dos mortos, dos desaparecidos, e dos anos de sofrimento. Um sentimento de vingança irrefreável tomava os olhos de cada um, e até as crianças, levadas pelo fervor, gritavam contra aquele homem que parecia encarnar o próprio demônio. “Assassino! Monstro!” vociferou uma mulher, com a face coberta de lágrimas e ódio. “Você matou inocentes! Morra, cão velho!”

Naquele momento, Alfred sentiu que sua morte era inevitável. Ele não era apenas um alvo de linchamento, mas o receptáculo de uma dor coletiva que a multidão não conseguia mais conter. Na tentativa de manter a sanidade, Alfred insistia: “Hitler está morto! Eu sou Alfred! Sou apenas um comerciante tentando sobreviver! Não me matem!” Mas a turba avançava, sedenta de justiça, um mar de braços e punhos cerrados que se aproximava, quase tocando a morte.

No meio do caos, um observador mais racional percebeu o risco de uma tragédia e correu até uma loja próxima, onde, através de um telefone antigo, chamou a polícia. As sirenes começaram a soar, afastando parte da multidão. Os policiais intervieram a tempo, salvando Alfred das mãos vingativas, embora até mesmo as autoridades hesitassem, ao primeiro olhar, diante de sua semelhança com o tirano que levara o mundo ao colapso. A investigação rápida confirmou sua identidade como cidadão comum, afastando a turba enfurecida.

Alfred escapou da morte, mas o horror permanecia no ar. Para os presentes, ele era o fantasma do mal, uma figura amaldiçoada, destinada a carregar para sempre a face e a voz do homem mais odiado da Alemanha.

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JUNIOR OMNI
Enviado por JUNIOR OMNI em 26/10/2024
Reeditado em 26/10/2024
Código do texto: T8182794
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