Get Carver

Nathaniel Carver não era exatamente um dos meus presidentes preferidos - e acho que minha opinião era compartilhada por uma expressiva maioria dos meus concidadãos - mesmo aqueles, como eu, que eram jovens demais para lembrar como havia sido de fato a administração Carver. Foi o que descobri quando levantei o assunto certa noite, enquanto compartilhava a mesa de jantar com a mulher que me alugara um quarto em sua casa, Irma Serrano.

- Carver... - resmungou ela, ao saber da foto emoldurada do ex-presidente no escritório de contabilidade onde eu começara a trabalhar. - Eu não teria nada contra Walton, ou até mesmo Koch... mas Carver? Difícil lembrar de alguma coisa boa que aquele sujeito tenha feito.

- Mas também não me lembro de ter lido nada de especificamente ruim contra ele - redargui. - A senhora poderia ser mais específica, do porquê as pessoas em geral não gostarem de Carver?

- Carver não foi eleito - declarou abruptamente Irma. - Quer dizer, ele foi eleito vice-presidente... mas quando o presidente Bauer ficou doente e morreu, ele assumiu a presidência. Ninguém queria realmente Carver, acho que nem Bauer, mas teve que aceitar por conta dos conchavos políticos que fez para ser indicado presidente.

- Parece que a senhora sabe um bocado sobre Carver - comentei, surpresa.

Ela assentiu com a cabeça.

- Trabalhei num comitê da campanha presidencial de Bauer. A gente torcia o nariz para o Carver, mas o chefe do comitê nos lembrava que o presidente não iria ser ele. Infelizmente, não foi o que acabou acontecendo...

Recordei as minhas leituras do ensino médio:

- Sei que Carver foi muito criticado por ter nos envolvido na guerra do Vietnã; há quem atribua a ele a nossa derrota...

- Carver se enfiou onde não era chamado - atalhou acidamente minha senhoria. - Mas os problemas com ele começaram antes de se tornar presidente; quando era senador, fez parte da Comissão Parlamentar de Investigação de Atividades Antinaturais.

- Sempre achei que essa comissão era uma coisa boa - ponderei. - Afinal, se investigavam atividades antinaturais...

Irma Serrano me lançou um olhar torto e se serviu de purê de batatas, antes de responder:

- Eles acusavam qualquer um de atividades antinaturais, bastava que representasse alguma ameaça aos interesses de Carver e seu grupo. A comissão até pode ter tido alguma boa intenção no início, mas ficou tão escancarada a parcialidade, que acabou caindo em descrédito. Carver sumiu do radar e passou uns bons anos sem aparecer na mídia, mas ninguém se esqueceu dele... até o dia em que, para surpresa geral, foi indicado como vice na chapa de Bauer.

Peguei mais um pedaço de rosbife e uma generosa porção de ervilhas, antes de indagar:

- Imagino que devem ter perguntado a ele sobre a comissão.

- Sim. E ele disse que aquilo eram águas passadas, mas negou que houvesse cometido qualquer irregularidade, mesmo com muita gente tendo ido à imprensa denunciá-lo.

- Pesado isso - comentei, concentrando-me em comer as ervilhas e o purê nos minutos seguintes. Finalmente, depois de tomar um gole d'água, perguntei:

- Mas a senhora falou em conchavos políticos... acha que Carver pode ter chantageado Bauer, por conta de algo que descobriu na época da comissão?

A senhoria deu de ombros.

- Sei lá, Kolaiah. Mas acho que não é essa a pergunta que você deveria estar se fazendo.

Ergui os sobrolhos em expectativa; ela me encarou, muito séria.

- A pergunta é: por que Carver não se candidatou à reeleição?

- E qual é a resposta?

Irma Serrano deu uma risadinha, também enchendo um copo com água.

- Se eu soubesse, seria uma mulher rica, minha querida.

Bebeu metade do copo, antes de completar:

- Ou talvez estivesse morta. Vai saber.