A Revolução dos Bichos

Ouço o vidro se estilhaçando e meu pânico aumenta consideravelmente. Eles estão perto de conseguir e eu não sei mais o que fazer. Vou para o quarto e me tranco em uma inútil tentativa me proteger, o ultimo pingo de esperança que eu tinha da minha família finalmente aparecer, se foi.

Hoje faz três dias, se minha família realmente fosse voltar, eles já estariam aqui. Agora só me resta esperar meu desumano fim.

Tudo começou na véspera do Natal, quando meu pais tiveram a ideia de passar o feriado na fazenda dos meu avos. Entramos no carro e iniciamos uma entediante e pavorosa viagem, a estrada de terra era irregular e difícil, parecia que estávamos indo em direção de uma caverna do século passado. As árvores nos abraçava com sua obscuridade penetrando-se como um vírus mais e mais na tentativa de matar qualquer resquício do mundo moderno.

Quando finalmente chegamos, meus avos nos receberam com um caloroso abraço. A fazenda era simples demais. Tinha animais demais. Uma plantação de maçã velha demais. A casa era amarela demais. Quente demais. Mórbida demais.

Por infortúnio do meu destino, meus avos deixaram para fazer as compras de Natal junto com meus pais. Eu odiei a ideia, ainda estava com enjoou da viagem de vinda, preferi ficar na casa dormindo.

Por incrível que pareça, foi o melhor sono da minha vida, mas acordei subitamente com os latidos dos cachorros. Aquilo estava ressoando na minha cabeça.

Tudo estava escuro, com exceção das luzes da varanda, através das cortinas escarlate da minha avó pude ver a cena mais horripilante da minha vida.

Os porcos estavam comendo um cavalo branco vivo, suas mordidas eram sujas e impetuosas. As vísceras do cavalo dançavam no chão em um plasmático tango. Cabeças e penas de galinhas voavam imaculadamente por todos os lados. O cachorro acorrentados eram jogados de um lado para outro em um possesso jogo de pingue-pongue, o barulho de seus ossos quebrando apertava meu peito.

Com um passo em falso para trás acabo derrubando o rádio empoeirado do meu avô. O barulho fez com que alguns porcos fossem atraídos para a casa. Seus olhos carregavam um vermelho infernal. Suas bocas grunhiam enquanto o sangue quente escorria por ela.

Tudo parecia errado demais. Pequeno demais. Vulnerável demais. Ouço o vidro se estilhaçando e meu pânico aumenta consideravelmente. Eles estão perto de conseguir e eu não sei mais o que fazer. Vou para o quarto e me tranco em uma inútil tentativa me proteger, o ultimo pingo de esperança que eu tinha da minha família finalmente aparecer, se foi.

Hoje faz três dias, se minha família realmente fosse voltar, eles já estariam aqui. Agora só me resta esperar meu desumano fim.

Enquanto o barulho das paredes quebrando era ecoado pela casa toda, tive um ultimo suspiro de discernimento. Todos os porcos estavam na frente da casa, tentando entrar para se alimentar de mim ou dilacerando os últimos animais vivos da fazenda. A janela do meu quarto era em direção á aquela plantação enorme de maçãs velhas.

Pulo a janela e corro. Corro o mais rápido que posso. Corro por mim. Corro por minha família. Corro pelos animais mortos. Corro por nossa ultima noite de Natal. No meio do caminho consigo ver o carro dos meus pais parado no meio da estrada, aquele pingo de esperança reaparece no meu coração e, impiedosamente, ele foge de mim novamente.

Os corpos da minha família estão em pedaços. O belo cabelo castanho da minha mãe agora está tomado por sangue. O casaco surrado do meu avô agora tenta segurar seus braços junto ao tronco. O colar de pérolas favorito da minha avó está fragmentado ao seu redor. O relógio vintage que dei para meu pai no seu aniversario agora pertence a uma mão sem dono.

O som dos porcos começa a aumentar. Eles farejaram meu cheiro. Farejaram meu medo.

Hoje faz três dias, minha família finalmente voltou. Agora só me resta esperar meu desumano fim.

Lena Gomes
Enviado por Lena Gomes em 29/09/2024
Código do texto: T8162929
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