O garoto novo
Emmanuel, o novo aluno da turma de Mariana, desceu de uma velha perua em frente ao colégio. Acenou para a motorista, uma senhora simpática de cabelos grisalhos, e entrou portão adentro. Acenou para Mariana, que deixou a rodinha de amigas e se aproximou dele.
- Era a sua avó? - Indagou a garota, que não escondia seu interesse pelo recém-chegado.
- Não - riu Emmanuel. - Minha mãe!
- Ah... desculpe - murmurou Mariana, baixando o olhar. - Não quis lhe ofender.
- Tudo bem - Emmanuel não parecia ter se incomodado com o comentário. - Muita gente pensa a mesma coisa, quando vê meus pais. Eles já tinham passado dos 50 e não tinham filhos quando eu nasci.
Mariana ergueu os olhos para o rapaz, surpresa.
- Sua mãe teve você com mais de 50 anos de idade? Ela fez algum tratamento de fertilidade, contratou uma barriga de aluguel...?
- Nada disso - assegurou Emmanuel. - Até onde eu sei, foi um parto normal. Se bem que minha mãe é muito religiosa e acredita que minha concepção foi por algum milagre...
- Entendo - redarguiu Mariana, sem realmente saber se a história tinha algum fundamento. O sinal de entrada das turmas soou e a conversa foi interrompida.
* * *
No intervalo entre as aulas da manhã, Mariana observava Emmanuel jogar bola no pátio do colégio com outros garotos. Sua amiga Antonella aproximou-se dela.
- Você virou olheira de time de futebol? - Indagou com ar de ironia.
Mariana não acusou o golpe.
- Esse garoto, o Emmanuel, é muito bom. Os outros só conseguem parar ele na falta.
- Se ele continuar jogando bem assim, daqui a pouco vai estar cheio de candidatas à Maria-chuteira - avaliou Antonella de modo crítico.
- Eu não vou ser uma delas - replicou Mariana com firmeza. - Mas tenho o direito de achar que ele é um bom jogador, não acha?
- Claro, claro - Antonella ergueu as mãos num gesto apaziguador. - Mas eu vi vocês dois se falando hoje de manhã, na entrada.
- É que tem alguma coisa nele que me deixa curiosa - admitiu Mariana. - Algumas coisas, aliás. Hoje eu vi a mãe dele mais de perto, e ela é bem mais velha do que as nossas mães... tem idade para ser avó do Emmanuel, aliás.
Contou à Antonella o que Emmanuel havia lhe dito, mas a amiga deu de ombros.
- Não leve isso muito a sério. Ele pode ser adotado, e os pais inventaram essa história bonitinha de milagre.
- Que coisa horrível de dizer - Mariana repreendeu a amiga. - Eu não duvido da fé de ninguém; essas coisas realmente podem acontecer, sua ateia.
- Claro que podem - ironizou Antonella. - Há várias histórias assim na Bíblia. Mas você poderia tentar descobrir qual igreja eles frequentam... já que são tão religiosos assim...
- Por que está falando isso? - Inquiriu Mariana, testa franzida.
- Emmanuel não parece alguém criado por gente muito religiosa - replicou Antonella. - Aliás, você sabe, ele é um dos que mais questionam a professora de religião durante as aulas.
Mariana teve que reconhecer que isso era verdade, o que só tornava as coisas ainda mais estranhas.
- [Continua em "Comunhão"]
- [21-09-2023]