Sabrina Sobreira - Sombras
Eu vou contar a história de uma menina e sua mãe extremamente rígida.
Bom, essa menina morava com sua família: pai, mãe e irmão em uma casa, relativamente, grande, comum, como qualquer outra...
Mais um dia amanhece, era uma manhã de sábado; hoje sua mãe havia lhe dito que teriam um jantar especial por causa de um tipo de feriado religioso que sua mãe seguia à risca. Júlia queria muito aprender mais sobre a religião de sua mãe para ficar mais próxima dela, pois elas não tinham um relacionamento muito bom. Ela estava muito animada e logo avisou aos seus amigos:
— Gente, eu vou ter um jantar muito especial com a minha família. Estou muito feliz com isso!
Todos eles vibraram junto com ela, pois sabiam como a religião era importante para Júlia. O dia foi passando e ela não via a hora de finalmente jantar. Fez tudo que podia para o tempo passar mais depressa, leu, estudou, jogou, conversou com seus amigos, e finalmente estava começando a escurecer. Ela costumava ajudar em casa com algumas tarefas, mas acabou se esquecendo, então assim que lembrou foi correndo fazer. Quando Júlia estava descendo as escadas do seu quarto se deparou com uma cena um tanto quanto peculiar, sua mãe em pé com uma tesoura na mão cortando uma mecha de cabelo do seu irmão e colocando no velho vaso no centro da mesa de jantar, que quando ela olha mais atentamente, está com um lápis e uma pena dentro.
— Mãe? – Chamou Júlia, enquanto se aproxima curiosa. Ela fala baixo, porque não queria atrapalhar a concentração de sua mãe.
— Sim, querida? Sua mãe responde em um tom de voz normal, mas sem tirar os olhos do vaso, enquanto joga as mechas castanhas de seu irmão.
— Está tudo bem?
Ela pergunta tentando entender o que está acontecendo.
— Está tudo bem, querida, não se preocupe.
A mãe diz, finalmente olhando nos olhos da filha.
— Já terminou suas tarefas?
Ela pergunta, com cara de quem já sabe a resposta.
— Ainda não, mas tô quase. Julia diz tentando disfarçar.
— Hum, ok... — ela não caiu nesse papo furado — Termine logo, em breve vamos jantar.
O tom de sua mãe é firme, quase como de um general, mas isso desperta em Júlia uma empolgação enorme em terminar logo seus afazeres.
"Primeiro tirar o lixo", ela pensa. Ela tira os sacos de lixo das lixeiras do banheiro e cozinha e começa a levar para a aérea em frente a piscina, afinal, o lixeiro não passa no fim de semana. A parte externa da casa é muito bonita, tem uma piscina rodeada de uma grade branca, azulejo, algumas árvores não muito altas e uma pequena lavanderia que ocupa o fundo inteiro do quintal, mas a noite, com esse ambiente escuro, desperta um certo "medinho". Júlia coloca as sacolas dentro de uma espécie de caçamba que eles têm, e quando está de costas, ela automaticamente se sente observada. Um frio na espinha, um arrepio... "Pai nosso que estais no céu...", ela começou a rezar.
— Aaaaaaaaa!
Ela grita, mas não muito alto, correndo para dentro de casa.
Depois de arrumar seu quarto, ela desce de novo e dessa vez seu pai está sentado na mesa de jantar lendo um de seus livros intelectuais e sua mãe está conversando com seu irmão, ela se aproxima deles para participar da conversa.
— Terminei minhas tarefas mãe.
Ela diz animada
— Ótimo, então podemos começar — Sua mãe responde em um tom sério. — Bom, para podermos jantar todos, ficamos sem conversar com nenhum amigo ou..
— Como assim? — Júlia a interrompe — Eu conversei com meus amigos hoje.
— Quantos? — Sua mãe pergunta.
— Dois, eu acho — ela diz receosa.
— Nesse caso você não vai poder comer com a gente — Diz a mãe.
— Ah, tudo bem — ela fica decepcionada, mas tenta não demonstrar. — Eu esquento a comida de ontem e..
— Não, você não vai comer aqui! — Sua mãe diz antes dela terminar a frase — Você vai comer na nossa casa antiga.
Júlia começa a sentir o ar sumir dos seus pulmões, ela perde o controle da própria respiração e começa a chorar.
— Não! Por favor! Lá não! – Chorando cada vez mais e com menos ar.
— Querida, acho que ela não precisa... — O pai de Júlia finalmente se pronuncia, com um tom pacífico na voz.
— Ela não pode comer aqui! Vai, Júlia! Agora! — Sua mãe grita.
Júlia, ainda chorando, pega seu prato de comida e sai de casa. "Tá tudo bem, não vai acontecer nada" Júlia fica tentando se convencer que não tem nada errado, mas ela se sente observada e com uma sensação de morte eminente.
A antiga casa da família de Júlia fica a poucas casas da atual, eles se mudaram quando ela ainda era criança, mas Júlia se lembra vividamente dos horrores que viveu naquela casa. Os vultos de madrugada, os barulhos de portas e janelas abrindo, e o constante sentimento de não estar sozinha. Embora sempre dissesse que era apenas sua imaginação, a menina tinha certeza de que havia algo muito errado lá, e que de forma alguma seria uma boa ideia ir lá sozinha, mas ela não tinha opção.
Júlia sobe até o seu antigo quarto que ficava no sótão. Quando ela entra, automaticamente começa a ver muitos vultos como se fossem um milhão de fantasmas ao seu redor, até que ela começa a ter um ataque de pânico e desmaia.
A menina acorda com a sua comida toda espalhada no chão e meio atordoada, ela se levanta indo em direção a uma grande janela que tem no sótão, ela costumava se sentar lá pra ficar mais calma e olhar as estrelas. Até que de repente, enquanto estava de costas olhando a janela, ela sente uma dor fortíssima perfurando suas costas, e quando ela se vira ela vê um homem completamente encapuzado, com uma máscara e roupas pretas, ela sente sua visão escurecendo, mergulhando no vazio.