O Assassino

Desta vez ele esperava conseguir mata-lá. Era a décima tentativa sem sucesso. Só pode ser conspiração do universo, pensava ele. Já lhe haviam pago pelo serviço, mas ela sempre lhe escorregava das mãos. Não deveria haver erro. Ele conhecia a rotina dela melhor que o próprio marido. Sabia até os dias de TPM. Tinha o histórico de saúde completo, os hobbys preferidos, lugares visitados frequentemente. Mas, a mulher tinha um santo forte. Não morria! Sempre surgia um imprevisto. O rifle emperrava e perdia-se o momento do tiro, o suco envenenado era repentinamente atingido por uma bola e encharcava o chão. Nem mesmo o atropelamento deu certo, a mulher sobreviveu. Descarga elétrica!? Falhou! Asfixia!? Falhou! E enterrar viva!? Até isso falhou! Quando ia levar o corpo adormecido para a cova, deparou-se com o cemitério repleto de policiais que faziam uma busca no local. Teve que deixar a mulher numa calçada qualquer. Seria ele tão incompetente assim, ou apenas a hora dela que ainda não havia chegado? Um serviço que lhe parecia tão simples, sabia fazer de olhos fechados. Sempre certeiro, nunca dava problema, até agora. Mais de trinta anos de experiência, como pupilo do melhor assassino de aluguel que ele poderia conhecer, o Sr Chon Yang, claro que não é seu nome verdadeiro. Sentia-se envergonhado. Pertubado. Quase desesperado. Já esgotava-lhe as ideias. Que diria ao sindicato!?” Toma aqui o dinheiro de volta, a mulher não morre”. Seria ridicularizado, e desintegrado. Falar nisso, até ao ácido a indivídua sobreviveu. Fugir e deixar ‘pra’ lá!? Nem pensar! Seria mais caçado que marfim de elefante. Foram categóricos: Ela precisa morrer! Era uma importante empresária, tinha ligações duvidosas com inúmeros políticos e até juízes. O clichê de sempre, ‘pra’ variar. Mas parece que tinham algo a mais contra ela. Não haviam dito, mas ele, esperto como era ou como achava que era, deduziu que seria por conta de documentos e fotos que ele havia encontrado no apartamento dela. Quem deixa arquivos carimbados com um “super secreto’ enorme e em vermelho debaixo da cama!? Que ridículo! Tinha algo a ver com a máfia russa e chinesa, então com certeza de qualquer forma ela já seria morta mesmo. Isto o tranquilizou, aliviava o peso na consciência. Já que tinha que ser, que fosse ele o carrasco a cumprir este tão nefasto serviço ao destino, por um bom preço claro. Enfim, só restava ir ‘pro’ pub e encher a cara ‘pra’ ver se vinha alguma ideia. Nada! Então, numa manhã resolveu sair sem rumo pelos arredores do grande conjunto de edifícios empresarias do Grupo HEROS. Caminhando sem pressa, se deixando distrair pelo movimento local dos transeuntes, ciclistas, homens, mulheres, pais que passeavam com seus filhos por ali. Era uma área bonita, com várias vias de acesso e jardins. Bem instagramável, como dizem. De repente, um grito agudo e barulhos de gente correndo lhe trouxeram de volta a realidade. Foi ver o motivo de tanto alvoroço. Um grupo de pessoas estavam em volta do que parecia ser um corpo no chão, ele foi abrindo espaço entre as pessoas ‘pra’ conseguir ver melhor. Ficou perplexo quando reconheceu o corpo. Era ela. Mais ainda quando soube como aconteceu. Segundo os comentários dos curiosos, ela tropeçou nos próprios pés, caiu e bateu a cabeça no meio fio, na área leste do jardim Azul. Traumatismo craniano. Puro e simples. Do jeito mais natural possível. Só podia ser muita palhaçada do destino. Agora ele estava realmente ferrado. Já tinha dado destino ao dinheiro recebido, com mulheres, dívidas, armas e munições. Mal se virou ‘pra’ ir embora, o telefone vibra e uma mensagem aparece na tela: Tem 24h ‘pra’ nos devolver tudo. Mais um clichê, parece aqueles filmes de ação sem muita criatividade. Só restava uma coisa a fazer: sumir! Se ele conseguisse. Esgueirou-se pela multidão e rumou-se para o desconhecido. Assim pensava ele, coitado. Dois dias depois, acharam um galão com um líquido viscoso e malcheiroso, foram fazer o teste, coitado. Era ele, ao menos o que restava dele. Jogaram fora, no ralo do necrotério mesmo. Assim, puro e simples. Um a menos ‘pra’ prender!