O monstro de cada noite...
Há algo de sobrenatural no medo. Uma paralisia, um sufocamento exausto de quem luta contra o escuro. As mãos suadas, trêmulas e que tateiam o ar em busca de algo em que possa se agarrar e se salvar do desconhecido. Suando, com olhos arregalados e nu da cintura para cima, Celso se arrastou até a janela do sobrado. Ali, naquela imensidão de mato e barulhos guturais, procurou um rosto que lhe pudesse auxiliar, mas nada além de bois, vacas, pasto e grilos. Inalou o ar da noite e, novamente, tentou se concentrar em combater a sua angústia de estar naquele lugar mal assombrando por ideia totalmente sua e teimosia exclusiva de sua consciência pesada. Aquele prédio bonito pertencia a sua família e achava um pecado deixá-lo se desfazer pela ação do tempo e dos cupins, mas o medo. O medo congelante de ouvir as almas se esgueirando pelas pestanas da casa, balançando as cortinas, quebrando objetos lhe dava cada vez mais a certeza que o certo era seguir os conselhos de sua mãe e vender aquele amontoado de cimento para qualquer aventureiro que se dispusesse a pagar um preço justo.
- Bobagem, Celso. - Disse a si mesmo na tentativa de se convencer que tudo aquilo não passava de objeto de sua imaginação. - Espíritos não existe! - Colocou a cabeça entre as mãos e voltou para a cama. Sentou ali, na escuridão, e ficou se mexendo por longos minutos até seu coração se acalmar e começar a bater no ritmo certo. Tanto tempo ficou nesse labutar, que os pássaros começaram a trazer os primeiros raios da manhã e cobrir de luz as trevas assombrosas do casarão. Celso olhou as sombras dançando através dos móveis e respirou fundo. Superara mais uma noite, mas não sabia por quanto tempo resistiria àquela tortura. Levantou, refez a cama em que quase não dormira e caminhou para o chuveiro.