Os mortos da casa ao lado (revisado por Ligéia Nunes) (21/11/2010)
Will colocou a ultima caixa no chão, agora ele estava mais aliviado, terminara a mudança;
– Acabei, vou tomar um banho – disse ele se espreguiçando.
– Gostou da casa nova? sua esposa Ana perguntou
– Não é uma casa dos sonhos, mas da pro gasto, disse Will, zombando.
- Eu acho que esse lugar vai dar inspiração pra você escrever seu livro.
Will já ia subir as escadas quando Ana lhe falou isso.
- Meu último livro. Não esqueça, eu quero encerrar com chave de ouro, disse Will estufando o peito.
– Tem certeza de que vai encerrar? Você tem muitas idéias, não pode parar agora., Ana insistia. Will levou a mão ao rosto:
– Eu já escrevi muito, não quero escrever mais, e essa casa não vai me dar nenhuma inspiração, sabe porque? Perguntou, encarando a mulher.
– Não, não sei, você pode me responder? Ana perguntou irritada.
- Porque não há nada que me inspire nesta casa, é uma casa morta!
Will subiu as escadas em passos rápidos. Ana respirou fundo, contou até três e foi para a cozinha.
Depois do jantar, os dois foram para o quarto, Ana foi pra cama e Will pra frente do computador:
– Tenho que escrever algo, uma coisa simples. Quando Will ia começar a digitar, ouviu um barulho na janela. Ele se assustou, e todas as suas idéias se foram.
– Merda de vento! Praguejou. Voltou a se concentrar. 'Certo..., onde eu estava?' Coçou o queixo, respirou fundo e saiu do quarto, andou um pouco pela casa, deitou no sofá, ligou a TV. Acomodou-se, olhava para a tv sem prestar atenção no que via. Acabou cochilando. Foi acordado por batidas na porta. Will levantou assustado. ‘Quem será a uma hora dessas?’, pensou olhando para o relógio. 'Duas da manhã! Seja quem for, espero que tenha um bom motivo pra vir aqui nesse horário!'.
Will foi até a porta e quando abriu, deu de cara com a figura de um homem de baixa estatura usando uma jaqueta de couro. Ele tinha um embrulho em uma das mãos. Will passou a mão no rosto:
- Quem e você ? O homem estendeu a mão:
– Olá. Sou Hugo Mendes, desculpe o incomodo.
Will apertou-lhe a mão, os dois se encararam.
- O senhor vai achar estranho, mas isso aqui é para o senhor. O homem estendeu a mão com o embrulho.
– Eu não quero isso, eu não sei quem é o senhor ! Will começou a se estressar. –
Eu entendo perfeitamente, senhor, mas isso e só um presente, de escritor para escritor. Hugo tinha uma voz meiga.
– Não importa! Poderia ser o próprio Stephen King me entregando um pacote que eu ainda ficaria desconfiado ,tenha uma boa noite! Will bateu a porta na cara do homem.
Will foi acordado com um beijo de Ana:
– Bom dia! Querido, você tem que parar com essa mania de me deixar sozinha no quarto, disse Ana rindo.
– Querida, eu sou escritor. Escritores agem estranhamente,-disse Will, rindo.
– Eu entendo. Já preparei o café. Vou sair. Deixei uma coisa pra você sobre a mesa. Essas foram as últimas palavras de Ana antes de bater a porta.
Will continuou deitado, pensando na figura da noite passada. 'Quem será aquele homem? Isso está me dando uma inspiração! Levantou rápido e foi à cozinha tomar café. Viu sobre a mesa algo que ele já vira antes. Deixou o café de lado e pegou o objeto. Era um embrulho de forma quadrada. 'Não pode ser !, disse a si mesmo. Tinha um bilhete. Will pegou o bilhete e leu: "Ao escritor sem idéias. Faça bom uso disso que estou lhe dando".
Will riu, passando a mão no rosto, puxou uma cadeira e sentou., ele Ficou um bom tempo analisando aquele embrulho. Media cada centímetro. Sua mão coçou para abri-lo. Will parou, levantou da cadeira, foi ao telefone:
- Alô, Ana? Tem um embrulho aqui em casa
- Eu sei, tem seu nome nele.
- Foi você que deixou pra mim?
- Eu não. Deve ser algum fã seu que não quer que você pare de escrever.
- Está bem, Ana. Beijo.
Will voltou pra mesa, levou as duas mãos ao embrulho e abriu. O que ele viu não o espantou. Ele achou que seria algo mais estranho, mas era uma coisa bem familiar. Resumindo, algo com que ele estava bem acostumado.
-Um livro..., disse ele sem animo. Ele queria me dar um livro. O cara bate à minha porta às duas da manhã pra me dar um livro!
Will ficou tão frustrado que nem pensou duas vezes: jogou o livro na lixeira. Depois, voltou para o quarto segurando uma caneca de café bem quente e se pôs em frente ao computador. Ele tentava resgatar as idéias que lhe haviam fugido.
Nada mais vinha na cabeça. 'Já sei, andar faz bem'.
Will saltou da cadeira, pegou sua jaqueta e desceu as escadas. Antes de chegar à porta, viu pela janela o caminhão do lixo passando. Ele pensou em voltar pra pegar o lixo, mas desistiu e saiu de casa. Will andou até demais. Parou numa praça, sentou em um banco perto do chafariz; Observou os pássaros, os velhos jogando xadrez, as crianças correndo, mas nada o inspirava. Então, pensou: 'Quem sabe se eu der só uma olhada...'
Will correu em direção à casa. Ao entrar, deparou com Ana. Ela tinha sacolas de lixo na mão.
- Não joga nada fora! Onde está o embrulho? Will perguntou, meio ofegante. Ana apontou para uma das sacolas de lixo. Will procurou o livro, puxou uma cadeira e respirou fundo. O livro tinha a capa grossa, devia ter umas trezentas páginas, as folhas eram manchadas.
– Esta em branco!
Will olhou página por página. A única coisa escrita era o título na capa: "Os mortos da casa ao lado". Um título bem atraente pensou. Will saiu da cozinha e passou por Ana.
. – Vou escrever agora, por favor, não faça barulho!
Will tinha um brilho estranho no olhar.
─ Você está bem, Will? Ana perguntou, preocupada.
─ Estou ótimo!
Will subiu as escadas de dois em dois degraus, entrou no quarto, trancou a porta, fechou todas as janelas. Nenhuma luz entrava no quarto, a única luz era a do computador. Will puxou a cadeira, colocou o livro ao seu lado e estalou os dedos. Uma idéia louca veio em sua cabeça: 'Vou escrever ao estilo antigo!' Revirou a gaveta à procura de uma caneta. Will abriu o livro, preparou a caneta e começou a escrever; Ele parecia estar em seu melhor momento. Escrevia como nos velhos tempos. Idéias e mais idéias vinham em sua mente, sua mão não parava, ele foi criando personagem, criando mundo, ele não queria parar de escrever, mas foi obrigado, a tinta da caneta tinha acabado. 'Não, agora não! Eu não posso parar, eu tenho idéias, estou no meu melhor! Se eu terminar esse livro, eu termino com chave de ouro, dizia a si mesmo. Mas não tinha mais caneta. Ele procurou em todo canto. 'Eu não posso sair agora, se eu der um passo tudo acaba aqui! '
─ Ana! Arranje-me uma caneta agora! Ele gritava, mas Ana não respondia. 'Eu não posso sair agora'!
Will começara a ficar estranho mais estranho foi à atitude louca, enfiando a caneta em seu próprio braço a fazendo de faca, rasgando até sangrar! Com o próprio sangue ele começou a escrever o livro. Todo o chão ficara coberto de sangue. Will estava pálido, todo o seu corpo tremia, mas sua mão não parava de escrever. Will sentiu suas forças irem embora, sua vista foi escurecendo, seu corpo foi caindo e ele apagou por completo.
Will sentiu cutucado no ombro. Quando abriu os olhos, uma figura lhe encarava.
– Olá, Will. Vejo que não terminou o livro, mas deu muito sangue por ele. Pena que não foi o suficiente, disse Hugo ajeitando a jaqueta.
─ O que está fazendo aqui? Como entrou aqui?-
Will parecia não estar se sentindo bem.
– Eu entrei pela porta. A pergunta não é o que eu estou fazendo aqui, mas sim o que você está fazendo aqui. Will levantou-se cambaleando.
─ Eu estou na minha casa, saia agora! Eu nem sei quem você é!
Hugo riu.
– Nem precisa saber quem sou eu, nem de onde eu vim. A voz de Hugo era bastante fria, arrepiando Will.
– Ana... Onde está minha esposa?
Will passou por Hugo descendo as escadas, dando de cara com outro ambiente. Não era sua casa, aquele lugar era escuro e úmido cheirava a podre.
– Onde estou? Cadê minha esposa, minha casa?
Will foi ate a porta, mas ela não abria. Ele tentou de tudo, mas ela não abria.
─ Onde estou que lugar é esse? Ele gritava, mas não tinha resposta. Will achou uma janela, os vidros estavam sujos, com limos, encardidos. Ele limpou um pouco, com o lado de uma das mãos.
– Essa é minha rua, eu estou na minha rua!
Ele começou a esmurrar a janela com toda força. A situação piorou. Will viu Ana passar do outro lado da rua.
– Ana, eu estou aqui! Ana, aqui, olha pra cá, por favor!
Ele gritava desesperado. Ana começou a andar em direção a casa. Isso deixou Will mais aliviado, ele ia ser salvo. Mas algo estranho aconteceu.
Ana estava bem de frete à janela de Will, mas não o via.
– Ele não está aqui, está tudo escuro.
Ela gritou para alguém do ouro lado da rua. Will entrou em desespero.
– Eu estou aqui, Ana! Por favor, não me deixe! Ana, eu te amo, não me deixe! Will batia na janela.
– Desista, Will, ninguém vai lhe escutar, disse Hugo.
Will girou o corpo em sua direção e ficou pasmo com o que viu:
– Minha nossa! Quem são vocês, perguntou, a várias pessoas que estavam na sala, olhando para ele.
─ Todos são escritores, assim como você. Todos queriam terminar com chave de ouro, e terminaram, assim como você. O que importa no livro não é o começo ou o meio, o que importa é o final.
Os olhos de Hugo brilharam como brasa, os escritores caminharam em direção a Will.
– Não toquem em mim! Vão embora!
E aquelas pessoas continuaram a se aproximar, ignorando os desesperados gritos de Will...
‘Will nunca foi encontrado, seu livro foi publicado por Ana dois anos depois do acontecido e se tornou um best-seller mundial’.