PARALISIA
Ela acordou ofegante às 3 horas da manhã. Seu caso da noite passada ainda estava deitado ao seu lado, seus pensamentos não estavam alinhados, mal sabia o que estava fazendo naquele quarto de motel.
Com muita dificuldade tentou abrir os olhos, mal conseguia fazer tal esforço físico, sempre teve dificuldades para dormir, e confiar nas pessoas era algo impossível para a pequena Any que viveu toda a sua infância em um verdadeiro inferno. Filha de pai alcóolatra e mãe prostituta, desde cedo aprendeu a viver sozinha e entendeu que confiar era algo inadmissível, que sempre daria errado e assim a pequena criança tornara-se uma atraente mulher.
Conhecedora de suas artimanhas femininas Any sabia conquistar o que queria, por esta razão vivia sua vida cara à custa de homens ricos e poderosos. Mas, ninguém conhecia o vazio que ela sentia, ninguém conhecia os pensamentos tortuosos que a atraente Any fazia crescer no íntimo de sua alma.
Por esta razão, fazia da bebida a sua parceira de vida e das drogas sua grande amiga. Se pudesse, caro leitor compará-la a alguém esse seria Lord Byron, aventureiro, orgulhoso, irreverente, melancólico, misterioso e conquistador que desafiava as convenções morais e religiosas da sociedade. E assim como Byron, uma aura de mito foi sendo criada em torno do nome de Any Saltman.
Cercada pelos sete pecados capitais, Any era a luxuria personificada, mesmo não tendo religião ela acreditava em céu e inferno, de tal modo sabia que o lugar de fogo e enxofre seria sua morada eterna.
Não se pode dizer que o estilo de vida da pequena garota não teve resquícios de sua torpe família. Mesmo quando pensou ter encontrado um lar feliz, a garota de 11 anos teve sua virgindade “arrancada” por aquele que dizia ter encontrado uma filha. Triste fim. Suja, sentindo-se a escória da humanidade, a garota fugiu e aprendeu a usar seu corpo em “benefício próprio”.
Deitada naquela cama de motel, a avassaladora e sensual Any sentia-se como a garota de outrora: suja, indefessa e inocente. E o homem com quem acabara de transar não sabia sequer o seu nome.
Não podia se mover, não conseguia mais respirar era como se o sopro de vida indigno que lhe foi dado fosse sugado por algo. Uma presença maligna era cada vez mais forte naquele cubículo.
Pensou em gritar, quem sabe aquele homem desconhecido poderia ajudá-la. Gritouuuuu! A voz não saía, como se suas cordas vocais nunca fizessem parte do seu corpo. Pensou... que triste fim para a sua vida leviana.
Com um esforço tremendo conseguiu abrir os olhos, pairando-os sobre o pequeno quarto de motel, ao erguê-los para o espelho, teve a pior experiência de sua medíocre vida, um ser sobrenatural estava sobre seu corpo.
Any não estava no REM ou Rapid Eye Moviment como os especialistas do sono afirmam ser um dos estados do sono onde ocorre os sonhos mais vívidos, caracterizado por rápidos movimentos aleatórios dos olhos e paralisia dos músculos, para que não interpretemos o sonho. Era real, era infernalmente real.
O Clonazepam não mais servia, mesmo fazendo uso oral ininterrupto, acredito ser graças ao álcool e uso constante de drogas. Naquele quarto era apenas ela e aquele demônio horrendo. Não era nada parecido com a tela pintada por Henry Fuseli, onde ele fez uma representação da paralisia do sono. O globo ocular da pequena Any era o reflexo do pavor e do espanto, tentou pensar em algo bom e fugir daquele lugar terrível, não! Não consegui lembrança sequer de algo que lhe representasse o bom, o agradável.
Sem perspectiva de sucesso, a vaidosa Any encara o seu demônio olho no olho e teve a revelação final, ele veio buscá-la. Pouco a pouco a vida se esvai, como uma centelha apagando, até não sobrar mais nada...