Os moradores em mim

"Era uma vez uma casa pequena e torta a qual moravam dois inquilinos, uma criança e um monstro.

A criança era alegre e saltitante. Amava o canto dos pássaros, o sol matinal e correr pelos corredores. O monstro era arredio, calado, observador e mal humorado. Mas, mesmo sendo ambos tão diferentes, o monstro amava a criança como sua própria cria.

A criança gostava de todos os dias brincar no quintal da casa. O monstro, ficava da janela a observando. E, sempre que um estranho tentava se aproximar demais da criança; o monstro descia correndo e espantava o intruso.

Ela nunca gostava dessa atitude. Se sentia presa, sozinha e isso a deixa triste. Ela queria brincar com os outros. Correr livremente sem preocupação. Porém, o monstro nunca deixava. Ele era muito zeloso para com ela. Até demais.

A criança, pobre coitada, deitava no chão do quintal e ficava olhando as nuvens. Imaginava como seria vagar livremente pelo céu. Ou até, ir além dele.

Um belo dia, a criança decidiu fugir. Esperou o monstro adormecer, desceu devagarinho pelas escadas sem fazer muito barulho e foi embora.

Correu para o mais longe que pudera. Nesse dia, ela viu outros como ela. Pulou corda, brincou de amarelinha, jogou até bolinha de gude. Foi mágico!

Mas, a noite foi caindo, as outras crianças foram para sua casa e ela ficou só. O que fazer agora?

Voltar para seu lar seria encarar o monstro novamente e talvez ele a colocasse de castigo e nunca mais poderia voltar a sair.

Ela então bateu o pé. Não voltaria. Seguiria seu caminho até algum lugar. Talvez dormir na rua não fosse algo tão ruim assim, não é mesmo?

Vagou por bastante tempo. As ruas eram desertas, as sombras e os barulhos noturnos estranho lhe davam medo. Mesmo assim, prosseguiu.

Até que dois homens altos a abordaram.

Perguntaram se ela estava sozinha e o que fazia ali desprotegida. Ela então contou sua história. Pobrezinha; lhe disseram. Não fique assim, venha morar com a gente, nós vamos te abrigar. E, em sua inocência, ela confiou e foi. Um novo lar, uma nova vida, a sensação de ser livre, de ser comum. Como todos os outros.

Bem, infelizmente, não foi o que ela esperava.

Chegando no lugar, ela viu que não moravam só os dois estranhos altos. Haviam mais dois. E, pela censura do texto, não vou ousar contar o que bem fizeram com a inocente criança. Ela entendeu bem, da forma mais cruel possível, o quanto o mundo não é um conto de fadas. O quanto o mundo consegue apagar nosso brilho dos olhos. O quanto o mundo é injusto.

Quase raiando o sol, já sem forças e machucada, ela lembrou de sua casa. De o quanto estava arrependida de fugir. De o quanto era bem cuidada e protegida. E, desejou, se sobrevivesse; voltar para lá. Então, usou seu último vigor para gritar o nome do monstro. Houve um silêncio. Os homens riram. Debocharam que ninguém veria para salva-la. Que ela agora era deles.

Entretanto, das sombras, o monstro observava como sempre fizera da janela. Num salto, saiu dentre a escuridão abaixo da criança fraca e ensanguentada, rasgando as gargantas dos vis homens. Devorou cada carne, sugou seus sangues, roeu seus ossos. E, quando não havia mais nada deles, se voltou para o corpo quase sem alma. Ela nem conseguia mais falar. Ele a abraçou. O coração dela batia fracamente. Sua respiração aos poucos ia desaparecendo.

Então, ele a envolveu em seu manto, a guardou dentro dele para mantê-la viva e, retornara com ela para sua casa."

Thiago Justo
Enviado por Thiago Justo em 02/02/2021
Reeditado em 03/02/2021
Código do texto: T7174976
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