Alomorfia

Diante de um banho, exausto, mentando a mente súbita, do delicado mentar, proseando, recitando poéticas aquém de poemas não recita. Revisitando meus receios intelectuais, junto a minha ira em vista da normalidade descabível de um sujeito que não se sabe onde e o porque, apesar que do mesmo se sabe onde, e de quem há o porquê. D'água cautelosa, tocando tal rapsódia aquática, alimentada pelo movimento tão descuidado do tão desengonçado humano.

Ah... o banho! Diante-dos-diantes, deparei com o mais mal-apanhado ser, asqueroso inseto repugnante, abjeto, nauseante, repulsivo e deletério! Não havia falta de criatividade para matá-lo e logo desovar sua carcaça da pequena janela, que dava de acesso ao telhado, que do telhado fosse o restaurante… Para que pudesse saciar a fome de um pombo desnutrido, que sem hesitação, faria o tal enterro celestial, sim! Sim! Violentamente! Mas, por um momento... momento humano, senti inteligência naquele bicho, que andava lentamente, analisando meus olhos, meu corpo nu que pouco se mexia, sabendo que eu era um bicho maior, ou talvez quem sabe, bem mais que um colosso, um tirano hostil que daria fim a sua consciência breve de tanto desespero e estratégia e vontade, na hostilidade do tudo! Do tudo! Andava lentamente, através da minha normalidade, estrategicamente, em direção ao ralo, ao ralo, porque, acredito eu, geralmente é dali que sua dor alivia, é dali que poderia andar normalmente sem pensar em sobreviver!

Fico estático, e o bicho repete, continuo o meu banho e o bicho rasteja... Chegando ao ralo, o ralo estava fechado, logo procurou o plano B, rastejando, rastejando, rastejando... Tive empatia! Numa curta/longa distância, abri o ralo, sem alamar muito, para que o mesmo pudesse continuar sua vida vivida, ou pensada... E o bicho ali, sabendo que meu banho demorado acabaria brevemente, caçava alternativas de disfarce, logo, quando deparou que o ralo esteve aberto, correu brevemente ao sentido oposto, achando que eu estava tramando uma, pois o mesmo é acostumado com o sofrimento, nada mais! E foi ali... Ali que me vi no bicho, me transformei no bicho, e procurava saída, e queria escapar, pois, senão, senão serei um banquete para pombo! Pombo! Pombo desnutrido! Sinto dor só de imaginar, cada bicada daquele sórdido pombo, ou até mesmo antes, uma grande pancada na cabeça... Minhas vísceras expostas, a cara de nojo do grande bicho tirano, e sendo jogado como quem não deveria ter nascido por quem não deveria ter nascido!

Otávio M Alves
Enviado por Otávio M Alves em 29/01/2021
Reeditado em 29/01/2021
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