A caixa de Lia
por Bruno Tavares
“Desde bem pequeno, eu queria que me assustassem. Acho que eu desejava um envolvimento emocional com algo que fosse seguro, algo de que pudesse me afastar.”
— Stephen King.
“Em nenhum momento me atreveria a abri-la. Minha mãe sempre diz que a curiosidade matou o gato, apesar de minha curiosidade estar me matando também”.
A caixa, de um tom vermelho sangue e com desenhos estranhos, tem algo maligno e misterioso. Quando fui buscá-la a pedido do meu tio César, não sabia de nada disso e só descobri, quando ele me ligou explicando. Disse-me que pertencera à sua falecida mãe, e que sempre sentia algo ruim vindo dela. Motivo de inúmeros pesadelos que tinha na infância. "Não entendo a razão de me mandar buscar isso. Talvez deseje destruí-la".
Em meus dezesseis anos de vida, nunca vivi algo parecido. A cada estação, fico cada vez mais assustada. Vejo vultos, escuto vozes; Algo como sussurros. Poderia dizer que são as outras pessoas no trem. Isso, se o vagão não estivesse vazio. Basta uma olhada ao meu redor para constatar; está totalmente vazio. Somente eu e esta caixa ocupamos o ambiente.
Finalmente estou na estação de casa e ao deixar o trem, a caixa parece mais pesada. Tenho a sensação de que está tremendo, como se algo estivesse louco para sair dela. A vontade era de jogar fora, mas o terror somou-se ao medo de tal ato me amaldiçoar. Não sei até que ponto o que eu havia escutado, era verdade ou não. Preferia não pagar para ver. Neste momento, passo por uma senhora que me lança um olhar ameaçador. Ela me encara, como alguém que sabe o que estou carregando aqui. Ao me aproximar da saída, ela me cumprimenta.
— Boa tarde menina. — Levo um enorme susto e fico completamente sem jeito, depois retribuo o gesto.
— Boa tarde, senhora.
"Preciso chegar em casa logo e me livrar disto", penso. Contudo, não sabia que o pesadelo havia apenas começado.
Vinte minutos de caminhada e finalmente estou meu ‘Lar doce lar’. A sensação de alívio é brutalmente interrompida, pela expressão de pavor do meu tio.
Eu podia ver o terror em seus olhos, quando botei o objeto na mesa da sala. O medo se intensificou dentro de mim também.
— Abra a caixa. — Ele me pediu. Não acreditei no que ouvi.
— Jamais! — respondi. — Essa caixa tem algo de ruim dentro dela. O senhor irá destruí-la.
— Não posso.
Neste momento, cheguei a pensar que meu tio César era tão maldito, quanto o objeto que havia trazido.
— Foi o que pensei. Eu sabia que você é medrosa. — Ele disse, rindo. — Não posso acabar com ela se você não abrir.
Olhei hesitante para ele, ainda sem acreditar no que me pedia.
— Seja corajosa e abra! Do contrário, será uma eterna covarde! — Foi o ultimato que culminou em minha mais assombrosa ação.
O que havia dito me encheu de raiva. Um sentimento profundo de curiosidade misturado com ódio brotou, e mesmo apavorada, eu jamais aceitaria tal insulto.
Abri a maldita caixa!
Click!
Enquanto levantava a tampa, podia ouvir risadas de deboche vindo de seu interior. Eu esperava as piores coisas; um bicho ou algo muito estranho e horrível que pudesse estar ali. Fotos de gente morta ou algo sinistro.
Para minha surpresa, havia apenas um pedaço de papel dentro. Meu tio César pediu para que eu pegasse, e assim o fiz, ainda sentindo raiva do insulto. Nele estava escrito: ‘Os piores monstros são aqueles que habitam sua mente. ’
Tão mal terminei de ler e ele gargalhava e apontando o dedo, me caçoava, dizendo que era para eu deixar de ser medrosa. Meu ódio triplicou por ser uma pegadinha. A vontade era de fazê-lo engolir a caixa e o papel.
— Não tem graça alguma, seu idiota! — Gritei e ele continuou a rir.
Após passar a raiva, já ao final do dia, meu tio havia ido embora e eu estava me preparando para tomar uma ducha, aliviada por tudo ser uma brincadeira. Acabei rindo depois e encarando tudo com leveza, afinal de contas, havia sim, aprendido uma lição.
Contudo, antes mesmo de tocar na porta do banheiro, ouvi um barulho forte. Pensei que fossem meus pais voltando das compras, todavia, não vi ninguém chegar a casa. Lembrei-me que havia deixado a caixa no meu quarto e ao chegar lá, para minha surpresa e pavor, ela tinha voltado para a sala.
Estava em cima da mesa, da mesma forma que eu havia colocado quando a trouxe. Não tinha tio Cesar ali. Da mesma maneira que havia ocorrido naquele vagão de trem, éramos apenas eu e a caixa amaldiçoada, novamente.
Para Monique Colin, minha amada.