A enésima potência do amor

Eles precisavam compor um novo final, agora baseado em um inédito desfecho, exatamente num teatro barato, o último ato para sua nebulosa relação desventurada!

O encontro entre dois mundos, tão repletos de indistinções. Não era o calor do sol que se dissipava sobre o carro que os aquecia, havia uma chama que emanava de seus corpos, formando labaredas, capazes de incinerar aquele minúsculo espaço.

Os dois ficaram lá por alguns minutos. Quando olhava para seu rosto, os lábios dela irradiavam uma energia disforme, espécie de luz resplandecente a contemplar esse momento jubiloso. A cada segundo, o jovem fazia elegia ao tempo, implorava aos céus que o deixasse passar um pouco mais devagar. A garota apertava seu braço ferozmente, forma encontrada para consentir suas tolas investidas, enquanto ele sussurrava em seu ouvido, que se lhe fosse permitido a graça, faria desse único instante, uma espécie de fenda, entregando a sua alma para ali ficar aprisionado pelo resto do toda eternidade, vivendo e revivendo essa maravilha!

Toda a amostra de aprumo lentamente foi se esvaecendo e sorrateiramente derivando em uma necedade, experimento muito mais ousado de transfundir o sangue dela para seu próprio coração e enfim voltarem a ser um só, quando há muito se difundiram e que careciam se unir novamente. A cada toque e gesto, era imperceptível o seu poder de acalentar seu íntimo de todos os agravos ocasionados pela vida. A agudeza daquela conjuntura só não era maior que o amor a animar seus corações. De alguma forma, o entusiasmo sensível não cabia em seus corações e se propagava a vagar pelo espaço, não amplo o suficiente para abstê-lo.

No fim, se renderam outras tantas vezes ao carma dessa paixão, cada saliva contida em um daqueles longos beijos molhados, derramava um pouco de sua essência a se espraiar em meio a todos os infortúnios contidos, um punhado de tristes recordações que compunha aquela malfada história. Isso porque há momentos em que as pequenas lembranças podem ser mais dolorosas que o fato em si. Ambos lembravam que durante dias anteriores, para que prevaleça o bem, estavam matando um ao outro em seu âmago, um duplo assassinato no relacionamento, significando a morte previamente anunciada de um dentro da cabeça do outro.

E quando à tarde começava a cair, era hora de dar novamente vazão as agruras que permeavam sobre suas vidas, sabiam que não podiam esperar que mais uma bela manhã ensolarada aflorasse sobre eles, tão pouco, que dos céus raiassem nuvens coloridas a contemplar toda essa decadência conjugal.

E assim ela partiu sem olhar para trás, não esperasse dela outro beijo ou que voltasse a alimentar esse louco desejo, apenas um último momento para apreciar, uma despedida improvisada, jogo de cena inspirado na inventabilidade ilusória, sempre elevado a uma enésima potência.

PS: Baseado naquela manhã em que fingiram, fabulando ser algo que nunca foram!

Rafinha Heleno
Enviado por Rafinha Heleno em 05/06/2020
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