O sítio do tio - Parte I

Foi no século passado, no interior do Ceará, o jovem Eduardo, de quartoze anos, fora convidado por sua tia para passar as férias escolares em seu sítio. Elizabeth, ostentando das suas cinco décadas de vida, teve a ideia de juntar seus sobrinhos e sobrinhas para que pudessem, juntos, confraternizar com o seu filho Maurício, de treze anos.

Ao cair da tarde, Eduardo se despediu de seus pais e subiu com sua tia na carroça para a viagem. Pelo caminho os dois conversaram, Elizabeth disse ao sobrinho o quanto o seu filho estava ansioso para recebê-lo. Enfim, de manhazinha chegaram em Quixeramobim, foram para o Sítio Américo, Maurício os receberam com uma abraço bem apertado. Ao fundo, vendo de longe, estava Leônidas, já com os seus 56 anos, encostado na porta entreaberta, com sua cara fechada, infeliz.

Eduardo guardava em seus pensamentos que tinha medo do tio, já ouviu de seu pai que Leônidas já foi feliz um dia, mas desde que perdeu a sua mãe, num acidente, ficou assim. Foi numa sexta-feira, em plena noite silenciosa, o lampião se desprendeu do teto da casa de Maria, causando um incêndio, a velha senhora morreu ali; Leônidas, a partir do momento que soube da notícia, nunca mais sorriu.

Se aconchegaram na casa, tomaram café da manhã, uma tapioca amanteigada com um copo de leite. Elizabeth avisou a eles que sairia novamente ao entardecer para buscar as gêmeas Eunice e Arícia. Pela manhã, Maurício mostrou as partes do sítio para o primo, conversaram bastante o dia todo, fazia tempo que não se viam, não demorou e o céu veio a escurecer, Elizabeth aprumou-se para sair novamente, despediu dos mais novos e, claro, do marido, frio e ríspido como sempre. Maurício e Eduardo viam a imagem de Elizabeth sumir lentamente no caminho, ela iria demorar um pouco menos desta vez, as duas gêmeos moravam em Quixadá, e, pela proximidade e caminho cortado, seria mais rápido.

Os dois estavam bem ansiosos para que elas chegassem o mais rápido possível, Eduardo, virando-se para trás, viu seu tio entrar na casa, engoliu em seco, acabara de cair a ficha que estavam os dois sozinhos com o tio, o qual tem medo. Seu primo notou o semblante de preocupação estampado no rosto do mais velho e perguntou-lhe se estava tudo bem, foi respondido apenas por um "sim".

Voltaram a andar pelo sítio, na janela, Leônidas via os dois, seus anseios perversos reverberavam pelo quarto. A verdade é que não conseguia mais resistir a tudo que vinha passando, a insanidade lhe dominava por inteiro, desde que viu a imagem de sua pobre mãe carbonizada, naquele fatídico dia...

Nessa noite descontará tudo que guardou por todos esses anos.

Rodrigo Hontojita
Enviado por Rodrigo Hontojita em 21/04/2020
Reeditado em 22/04/2020
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