A MISTERIOSA VILA 30 DE VOLTA A FORTALEZA

Enquanto caminho sobre o estreito cais de madeira, um turbilhão de perguntas me invade. Como estaria Asgard? Vivo? Morto? Como seria chegar novamente naquele lugar tenebroso? Será que teria que carregar este fardo maldito para sempre? Será que nunca descansaria? Relâmpagos na minha mente, iluminam nuvens negras revelando silhuetas demoníacas e tempestuosas.

Embarco no Gaivota, e vou direto ao porão, a criatura demonstra satisfação ao me ver. Soltei as amarras e naveguei em direção a Faroé. O mar conserva sua solidão, conheço suas faces e seu frágil humor. Enquanto seguia para o meu destino, noites profundas de dúvidas me assolaram. Três dias depois da minha partida, chego ao minusculo porto de Faroé. O céu ainda mostra aqui e acolá, algumas brechas azuis entre as nuvens escuras.

Atraco com relativa dificuldade, pois as correntes do fiorde são de uma força tremenda, elas se deslocam entre os contrafortes das montanhas, é preciso algum cuidado. Olho em volta, tudo está como antes. As imagens se projetam em minha mente, como sombras das luzes de velas ao vento, e as velhas cicatrizes ardem como se quisessem reabrir. O lugar em nada mudou, o velho galpão e a carruagem ainda são os mesmos, até o quartinho no fundo onde me refugiei por uns dias, conservam a mesma aparência.

Não demora, escuto uma tosse e um pigarreado. Sua voz é inconfundível.

- Quem está aí?

– Sou eu, Aros, já me esqueceu velho? - Respondo.

Ele pigarreia novamente, saindo detrás da pilha de madeiras no canto do galpão e diz.

- Oi rapaz, por onde andou? soube que lutou bravamente e resgatou Isabelle.

Senti um alívio, e o interpelei.

- Quem lhe disso isso velho? Por acaso que Asgard esteve aqui?

Ele olhou para mim de cima abaixo e disse.

- Em carne e osso.

Expirei com força o ar dos pulmões, como se naquele momento tivesse retirado das costas uma tonelada de pescado. Apertei sua mão calejada pelo contato da cordas e da brida dos animais. Lembramos do nosso encontro a tempos atrás. Mas, eu precisava encontrar Asgard.

- Vamos aos acontecimentos. - Disse ele.

E passou a narrar os fatos. Enquanto se recuperava dos ferimentos, Asgard lhe contou. A batalha da Ilha do Urso cobrou-lhe um preço bem alto. Asgard e seus guerreiros, derrotaram muitos dos maléficos soldados do mal, mas não venceram a contenda, as criaturas eram superiores em números, e isso custou a vida dos seus guerreiros e quase a sua. Ele havia perdido um braço e um dos olhos, mas não a tenacidade e a alma.

Não consigo figurar meu desespero.

Nossa conversa prolongou-se quase o dia todo, falei também sobre a criatura que estava em meu poder, e minha intenção de entrega-la a Asgard.

O velho achou prudente deixa-lo passar a noite no barco, para evitar o risco da fera escapar e atacar alguém nas redondezas, ou ser vista, e isso não seria bom, pois comentários correm depressa e alcançam grandes distancias. Então, combinamos ir ao encontro de Asgard no dia seguinte, antes do amanhecer. Cansado, me joguei na cama, exausto dormi como um urso fugindo do inverno. Quando os primeiros raios da luz, atravessaram as frestas do velho telhado, levantei e fui até o barco buscar o cão. O velho se admirou com a imponência, e a incompreensível aparência do animal. Atrelados a carruagem os cavalos bufavam inquietos e nervosos, a presença da criatura os incomodava, rapidamente coloquei-o dentro da cabine, e amarrei sua corrente ao estribo de ferro da carruagem.

Bebemos uma caneca de café forte, e saímos em direção ao desfiladeiro. Durante a nossa caminhada, lembranças desfilavam em minha mente. O encontro com aqueles seres malignos ainda povoavam meus pensamentos. A despeito de termos conversado muito no dia anterior, seguíamos em total silencio, até chegarmos ao desfiladeiro. Assim que chegamos estrada estreita entre os paredões, o velho brecou carruagem e disse:

- Asgard me pediu lhe deixar aqui, não sei como chegará até ele, mas deve ir só.

Tive um mau pressentimento naquele momento, mas me recobrei rapidamente, afinal estava indo ao encontro de Asgard, o guerreiro a quem devo a vida.