Noite em Havana

[História anterior: "Luz y sombra"]

Um táxi deixou Alan Newton e Natalia Arboleda em frente ao Tropicana, no bairro de Marianao; por ser noite de sexta-feira, o movimento de automóveis desembarcando passageiros bem-vestidos estava acima da média. A ideia de seguir com seu plano original de jantar na afamada casa de espetáculos, ocorreu a Newton depois que Natalia lhe contara sobre o assassinato de Jack Powell, por chocante que tal decisão pudesse parecer.

- Se não posso confiar sequer na polícia local, e isso era algo que Powell já havia me advertido, melhor partir do pressuposto de que você tenha sido seguida - explicou Newton para sua acompanhante, quando ainda estavam no lobby do hotel onde se hospedara. - No Tropicana há muita gente, e será difícil que alguém se aproxime para ouvir nossa conversa em meio ao tumulto.

Ademais, pensou, enquanto seguiam para Marianao no táxi, ele despertaria muito menos atenção indo a um lugar público de diversão acompanhado de uma mulher jovem e bonita, comportamento típico de turista, e não de alguém que tem algo a esconder.

- Uma mesa para dois - informou ao maître que os recebeu na entrada do vasto salão Arcos de Cristal. O salão, uma maravilha arquitetônica onde cinco arcos concêntricos de concreto armado convergiam para um palco onde a orquestra tocava, estava bastante cheio, mas uma nota de cinco dólares ajudou a lhes conseguir uma mesa livre.

- O salão foi inaugurado ano passado, mas eu nunca havia entrado aqui antes - informou Natalia, olhando com admiração para o alto, onde podia-se ver a noite estrelada através de grandes janelas de vidro entre um arco e outro.

- É realmente magnífico - assentiu Newton, ao oferecer a cadeira para que a jovem se sentasse.

- Desejam um aperitivo antes do jantar? - Indagou um garçom que se aproximara da mesa.

- Um mojito para mim - solicitou Newton. - E você, Natalia?

- Um Pink Lady - especificou ela, retirando uma cigarreira da bolsa.

O garçom anotou os pedidos e partiu. Newton puxou o isqueiro do bolso do paletó e acendeu o cigarro da jovem.

- Não fuma? - Indagou ela, curiosa.

- Prometi a mim mesmo que, se sobrevivesse à guerra, jamais colocaria um cigarro na boca novamente - admitiu ele com um sorriso embaraçado, mãos entrelaçadas sobre a mesa. - Bom, estou cumprindo a promessa até agora.

- Você esteve na guerra... - repetiu ela, o cigarro entre os dedos longos.

- Foi quando eu e Powell nos conhecemos. Nos Fuzileiros - explicou. - Lutamos em Guam, contra os japoneses. E depois em Angaur... Powell salvou minha vida pelo menos duas vezes.

Ficou em silêncio, enquanto Natalia dava uma tragada.

- Deve ser difícil para você... não ter podido fazer nada para salvar seu amigo - ponderou ela.

- Ele me disse que estava tendo dificuldades com a investigação que fazia sobre fraudes nos cassinos em Havana - avaliou Newton. - Mas em nenhum momento aludiu à possibilidade de correr risco de vida.

- Talvez eu saiba um pouco mais sobre isso do que você, embora não muito - admitiu Natalia. - Jack estava trabalhando em colaboração com meu pai, Nicolás Arboleda, que é advogado aqui em Havana. Meu pai se dedica a causas populares, ajuda pessoas que não têm como arcar com custas judiciais, conhece muita gente enfim... inclusive do submundo do crime. Nós não estávamos diretamente envolvidos com a investigação de Jack, mas o colocamos em contato com pessoas que poderiam ajudá-lo a obter as provas de que necessitava. Aparentemente, ele chegou perto demais da verdade e isso incomodou alguém nos altos escalões da política local.

O garçom aproximou-se com uma bandeja e os drinques, que depositou sobre a mesa. Newton e Natalia pararam de conversar por um momento e sorveram um gole de bebida cada um. Em seguida, Newton indagou:

- De quem estaríamos falando, exatamente?

- De alguém ligado ao alto escalão, muito provavelmente - especulou ela. - O dinheiro da corrupção tem financiado o partido do presidente, e Jack parecia convencido de que boa parte dessas somas provinha dos cassinos, com jogos viciados e coisas do tipo. Embora eu desejasse que você fizesse isso, seria bastante perigoso tentar seguir os passos de Jack e descobrir quem está por trás de sua morte.

Newton fixou o olhar no rosto triste de Natalia.

- Mas nós precisamos saber, não é mesmo?

Ela balançou a cabeça, afirmativamente.

- Pelo Jack.

[Continua]

- [27-03-2020]