A fervura da noute...
Dona Eustáquia vivia com aquele rol de filhas solteironas à sua volta, e era uma co-existência pacífica em que lhe cabia, na condição de matriarca, rara vez ministrar alguma sentença aplacatória de ânimos.
As moças eram costureiras, ou empregadas em lojas que ao invés de sonharem com um passeio a Miami, ficavam mais felizes e seguras, quando Hollywood é que ia à busca delas, nas telas...Guedes, à época, não passava de um pirralho da vizinhança, amarrado nas peladas rueiras...
Homens, aliás, eram mantidos a boa distância, tanto dos olhos, quanto das bocas das moças. Dona Eustáquia, tão-somente, é que se valendo de sua generosidade natural e temor ao Pai, é que recebia, com autoridade, algum pedinte - geralmente conhecido - e lhe fornecia um alimento, uns trocados, e até algum remédio.
Um dia, numa visita inusitada, um cidadão, ainda não conhecido, adentrou o alpendre e pediu alguma roupa usada, para si próprio. Sem aparentemente se incomodar com a intrusão, dona Eustáquia, compadecida, bradou:
- Ô moço, aqui nesta casa não tem homem não, só mulheres...!
As filhas, que dos fundos ouviram Dona Eustáquia, desconfiadas que o seu pronunciamento poderia abrir um flanco perigoso à segurança do lar, sussurraram uníssona e pressurosamente à mãe:
- Quê isso mãe, como é que a senhora diz isso...colocando a gente a perigo...?
Dando conta imediata de seu faux pas, Dona Eustáquia reagiu, falando mais alto ainda, para desencorajar qualquer reação adversa do pedinte:
- É moço, de dia não tem mesmo homem nenhum na casa, mas chega de noite, ferve...
As moças que antes ousaram, desta vez, apenas coraram...