O relógio II
Naquela casa cor de rosa, antiga, surge alguém – uma mulher, vestia negro.
Lúgubre olhar. Dei-lhe boa noite, disse a ela: ----- Vim aqui te fazer uma visita, visita breve.
Ela: ------ Obrigada... É noite, vá embora. Melancólica noite esta, volte outro dia.
Disse à mulher: ----- Está bem, irei embora, voltarei amanhã, à noite.
Sorriu fria, alma fechada. Sorriso estranho, fúnebre.
Me encarou. E disse: ------ Sim, pode vir amanhã, quando a noite começar
Irei esperá-lo.
Sim, voltei, regressei no outro dia, quando as trevas escureceram a rua.
Ela, mulher, me abriu a porta. Nesse momento ouvi trovões, relâmpagos. Entrei, ela de vestido roxo.
---- Sente-se – me pediu.
Sentou-se ela ao lado – e novamente ouvi aqueles ruídos, do antigo relógio, na parede. Também a velha moldura lá, no mesmo lugar, a foto de uma mulher.
Perguntei àquele ser estranho, a mulher: ----- Quem é essa, essa da foto?
------- Uma irmã, seu nome era Ester. Morreu. De pneumonia, já faz um ano.
----- Qual teu nome? Ela quis saber.
Não respondi de imediato, fiquei em silêncio. De repente senti temor, algo querendo me paralisar, creio, aquilo seria medo, pavor, horror.
A mulher a me olhar, olhar sem vida. Alguma coisa a pairar no ar, sensação mórbida. Ali, ao meu lado.
----- Meu nome é Boanerges.
De novo, lá fora, vindo dos céus, os raios, relâmpagos. Isso me amedrontava. A rua deserta.
Mas ela, rosto pálido, parecia nada sentir, nada a tocar-lhe a alma. Friagem, secura nas emoções.
----- E tu, qual teu nome? Perguntei-lhe.
Levantou-se. Não respondeu.
------ Venha aqui – pediu-me. A acompanhei pelo corredor.
Abriu a porta de um aposento. Disse-me: ----- Entre, descanse um pouco, ali na cama, até os trovões cessarem.
E chovia forte.
Entrei, deitei, ela fechou a porta. E desapareceu, silenciosamente, caminhando pelo corredor, a mulher de vestido roxo.
OBS: O conto terá continuação, em breve. Grato pela leitura. SH.