Conto Incompleto - Conto com o Feedback de Vocês :)
É engraçado como o som da respiração ecoando no silêncio absoluto pode ser aterrorizante. E assim foi mais um dos seguidos pesadelos que vinha tendo nesta semana.
Me via no começo de um corredor. Ouvia o gotejar de água em algum lugar. Comecei a andar na única direção que me era possível. A falta de luz me fazia estar atenta a qualquer movimentação. Meus pés estavam descalços, o que não ajudava, já que sentia a água sobre aquele chão de concreto.
O gotejar ficava mais nítido a medida que avançava. A minha ansiedade e meu medo se contradiziam. No momento que queria descobrir de onde vinha aquele som, pensamentos brotavam me dizendo que era melhor retornar e tentar escapar daquele lugar estranho. Continuava a andar em passos lentos até que senti uma dor terrível na sola do meu pé esquerdo. Me abaixei para ver o que era, e assim que toquei pude noticiar o sangue. Tinha pisado em um caco de vidro e com um só puxão removi, exclamando de dor. Assim que me recuperei da dor, me ergui por completo e o gotejar não chamava mais minha atenção, pois podia ver que no final do corredor que antes estava completamente escuro, uma vela repousava sob um castiçal dourado que emitia uma luz
quase forte o bastante para ser comparada com o fogo. Andei mais rápido até a vela e o seu castiçal. Estava tão hipnotizada com sua beleza que a dor do meu pé recém cortado não tinha grande relevância. Estava a um palmo do meu objetivo quando de repente senti um peso no meu ombro. Olhei de lado e conseguia ver uma mão horrenda, com
aspecto azulado e unhas tão grandes que chegavam a me furar um pouco. A mão me gelou até a espinha e quando ia me virar para olhar, acordei com falta de ar e suando frio. Olhei ao redor daquele pequeno quarto, voltando para a realidade e fui com o coração apertado ver o horário. 3:00 am. Especificamente era esse horário que vinha
acordando nos últimos 4 dias que estava ali. Coincidência ou não, sempre que chegava próximo da hora de dormir eu já temia que teria pesadelos como esse, mesmo assim, acabava caindo no sono. Dessa vez, já acordada, decidi levantar e ir lavar o rosto. Eu estava passando uma temporada na casa dos meus avôs, no interior de São Paulo.
Quando eu digo interior, falo interior mesmo. Sem internet e longe de tudo aquilo que lembra a cidade. A falta da conectividade já não era o fator mais preocupante para mim, e sim de que a casa mais próxima a dos meus avós se encontrava a 10 km dali. Além disso, aquele lugar era perfeito para habitar um dos cenários das histórias de Stephen King. A casa, típica do século XVIII, tinha chãos de madeira, e inúmeras janelas que para mim tinham mera utilidade estética. Os quartos eram afastados demais, e os corredores continham fotos dos meus antepassados, tão aterrorizantes, que sentia seus olhos pousarem sobre mim quando caminhava pela casa.
Assim que me encaminhei para a cozinha, ouvi o miar do gato velho da minha vó. Era um gato de estatura média, cor de café, que desde que me entendo por gente estava morando naquela casa. Realmente acreditava que gatos tinham sete vidas pois aquele era tão velho que já devia estar vivendo a sua última.
Peguei um copo de vidro do armário que abriu com um ranger tão ensurdecedor que só não acordou ninguém pois meus avós tinham sono de pedra. Assim que peguei a água para beber decidi me sentar, já que sabia que não queria dormir de novo após o ocorrido. Arrastei uma das cadeiras, tomando todo o cuidado para não fazer nenhum ruído. Me sentei e reparei que a janela ao lado da pia estava entreaberta. Um leve vento entrava por ela, e podia ver toda a escuridão que o lado de fora daquele casebre revelava. Fiquei encarando por tanto tempo que meus olhos começaram a brincar comigo - muito provavelmente por conta do sono - algo estava se mexendo entre a plantação dos meus avós. Era distante, mas conseguia ver o chacoalhar do trigo. Poderia ser apenas o vento - pensei - até que decidi fechar a janela por completo. Me aproximei e num último lance de olhar vi uma figura entre o trigo. Tinha a estatura de um adulto, longos cabelos pretos, e usava uma capa preta por toda a extensão do seu corpo. A figura olhava em minha direção quando fez um gesto de silêncio com os dedos, e pude reparar as mãos azuladas e horrendas. Nesse momento eu estava segurando o copo em uma das mãos, mas o susto foi tão grande que cai para trás, levando o copo junto. Meus avós, apesar do sono pesado, acabaram acordando com tamanho barulho, acendendo todas as luzes.
-Você está bem, querida? - disse minha avó com a voz rouca e quase inaudível, me ajudando a levantar enquanto meu avô, no seu silêncio habitual, pegava a vassoura para limpar os cacos do copo.
-Estou sim vó - respondi ainda que tentando entender se o que tinha acontecido era mesmo real - Acordei de um pesadelo pra tomar água e acabei tropeçando - Dei um risinho passando a mão no cabelo, que era o que eu fazia quando estava nervosa, enquanto ainda mantinha os olhos na janela, que agora se encontrava fechada pelas
cortinas floridas da minha vô.
-Bom, está tarde - minha vó olhava o relógio antigo, cerrando os olhos para tentar desvendar os ponteiros - Vá para a cama Amélia, e seu vô e eu limpamos aqui, está bem?
Meu avô tinha saído da casa para pegar a vassoura. Me perguntava se a criatura ainda estava lá, mas aparentemente meu avô voltou apenas com sua aparência rabugenta de ter acordado no meio da noite.
Voltei para cama, mas sabia que não teria sono para aquela noite. Passei pelo corredor dos quadros horripilantes dos meus familiares. Evitava olhar para as inúmeras janelas, mesmo as que levavam para cômodos do interior da casa. O meu medo de ver aquela criatura crescia. A mesma criatura do meu sonho se mostrava presente na plantação dos meus avós. Dei um beliscão no meu braço para certificar-me de que estaria em mais um pesadelo, mas para minha infelicidade, estava 100% acordada e tudo aquilo era real.