O Aniversário
A ENCOMENDA
As horas demoravam para passar enquanto ele ficava de olho na rua e no relógio da parede. Um, dois, três segundos: assim, bem lentos se passavam. O ponteiro parecia fazer sua função com bastante má vontade. O sol parecia estar mais quente que o normal, pois nunca nascia do lado leste - para onde a janela estava posicionada. Porém, naquele dia, desde os primeiros minutos da alvorada, nascera - como que por birra.
Quando o camião dobrou a rua à esquerda, uma emoção correu-lhe o peito. Ele parecia emocionado. O momento de espera pela encomenda já havia cessado. Entusiasmado, saiu correndo pelo quarto, atravessou o corredor, abriu a porta da sala e desceu pela escadaria em direção ao portão. Quando os carregadores ainda estavam a abrir as portas traseiras do camião, ele já esperava com o portão aberto.
A encomenda não era muito pesada, porém era grande: só fazia peso com alguém dentro. Eles subiram a escadaria sem muito esforço e adentraram a sala. A única dificuldade foi posicionar a encomenda no meio da sala. Ao fim, um dos carregadores interrompeu o silêncio:
- A gente pode pegar os cavaletes? Quero dizer, a gente já pode deixar tudo preparado?
Augusto apenas assentia. De tão entusiasmado que estava com os preparativos. Parecia muito feliz. Posicionou as flores ao redor da encomenda e fez café para os entregadores. Por fim, deu-lhes um agrado em espécie e viu o camião afastar-se pela direita, através da janela. As horas haviam passado: uma hora e meia desde que chegaram os entregadores.
OS CONVIDADOS
Sentou-se ao sofá e buscou em uma gaveta da mesa de centro uma agenda telefônica. Os nomes e números, escritos a lápis ou a caneta, estavam em ordem alfabética. Augusto ligou para cada um dos listados. Fazia-o com uma gentileza inexplicável. Demorou bastante no telefone, pois havia quase duzentas pessoas naquela agenda. A cada uma delas ele começava parcimoniosamente a charla, bastante calmo. Depois, ia explicando os detalhes para todos. A todo momento, Augusto bebericava um pouco de água. Queria que todos os seus convidados fossem celebrar aquele momento consigo. Havia vários familiares, alguns amigos, outros colegas, outros apenas conhecidos. Fez questão de que todos se lhe fossem prestigiar. Esqueceu-se de ninguém, muito pelo contrário: dias antes havia invitado até os vizinhos - mesmo aqueles as quais nunca nem um bom dia havia trocado.
- Haverá café e bolo para todos na cerimônia - garantia ele às pessoas - que ficavam embasbacadas com o repentino convite.
A CELEBRAÇÃO
Augusto havia deixado o portão aberto para quem quisesse entrar. Era o dia de seu aniversário: sete de julho. Apesar de anunciar a todos sobre a cerimônia que daria, não havia música tocando ou qualquer clima de festa. Muito pelo contrário, o cheiro de cera queimada vindo de velas estava bastante forte. Ao chegar à porta, todos deparavam-se com um caixão no meio da sala, várias coroas de flores ao redor do esquife e Augusto - ainda a respirar - dentro do ataúde.
- Meu sonho é ser velado vivo - dizia ele às pessoas enquanto falava ao telefone no dia da ligação. - Será a maior festa de aniversário da minha vida!
Mais de duzentas pessoas compareceram ao aniversário fúnebre de Augusto: algumas diziam que ele tinha um gosto muito peculiar para celebrações; outros achavam aquilo de extremo mau gusto. A mãe de Augusto chegou a passar mal ao ver a enorme cruz colocada à cabeceira do esquife e seu filho dentro. Teve de ser conduzida a um pronto-socorro.
Não sobrou café nem bolo, porém Augusto pusera-se bastante feliz com sua festa de aniversário.