{in}feliz Natal

Paul odiava fervorosamente a hipocrisia familiar no Natal. Parentes que se acham melhores do que você pelas costas vindo na sua casa gastar a sua comida e sugar o bem-estar. Os filhos pequenos invadindo barulhadamente a cada cômodo, sujando, às vezes quebrando algo de valor. Aquele tio pançudo fazendo piadas mais inconvenientes a cada latinha de cerveja. Aquela tia fofoqueira infestando a casa com a cigarreira nervosa porque ela e a sua mãe devem se dar bem pois afinal Natal é união. Aquele primo que tem se dado melhor na vida do que você. E Paul, que só desejava paz silenciosa após um ano exaustivamente frustrante. Fora demitido de dois empregos e desempregado por mais da metade do ano tivera que trancar a faculdade pois seus pais desistiram de ajudar o futuro dele quando as suas expectativas nele iam ralo abaixo. A depressão de Paul havia piorado, as medicações não o sustentavam mais e isso era visível nos seus olhos caídos. Uma música natalina começou lá embaixo se mesclando à barulhos infantis, e Paul desejava mais o silêncio improvável. As horas até a ceia e até a tarde do dia seguinte quando finalmente iriam embora e haveria silêncio de novo se arrastavam como a um andarilho desidratado caminhando no deserto. Nem mesmo os calmantes fizeram Paul dormir até a ceia, acordou abrupto com o pirralho do primo correndo aos gritos pelo corredor. Silêncio. Apenas silêncio, por favor. Quando desceu, avistou a mesa com uma ceia mais farta do que seus pais gastariam com ele. Havia um tom penoso nos olhos de cada um quando viram a Paul, com certeza seus pais já haviam lhes contado sobre o ano que ele tivera. A sua mãe, provavelmente, enquanto se vitimizava. Paul se sentiu longínquo sendo arrastado para trás de volta ao quarto mas foi coagido puxadamente pelo tio já levemente alterado da bebida à mesa. Paul pensou que não poderia piorar, mas piorou quando o tio começou a se vangloriar sobre o primo. “Conta aí do estágio que conseguiu, filhão,” e o primo detestável começou a tagarelar orgulhosamente sobre os benefícios do estágio caro que conseguira sempre mirando a Paul como uma lâmina. Piorou quando o cujo tio expôs na mesa que sabia sobre a situação de Paul e os incentivos à la coaching vieram em seguida. “Você tem que erguer a cabeça, Paul, a vida é dura mas depende só de você, depressão não é pior do que uma conta vencida,” e Paul tentou reagir com um sorriso falho enquanto as suas entranhas tremiam. Silêncio. Apenas silêncio, eu imploro. Piorou mais quando o primo caçula se virou a Paul, “não pode ser um perdedor assim, Paul!”, ele exclamou risonho. Aquilo trincou a Paul internamente e ele sentiu um zumbido ensurdecedor nos sentidos enquanto o seu tio tentava vergonhosamente corrigir o garoto. Paul entreolhou a todos naquela mesa contendo os seus risos, e não lhe importava se eram vergonhosos ou com um fundo de verdade, e naquele momento, Paul desejou que todos eles morressem. Irado, Paul se levantou abruptamente rangendo a cadeira e se rumou escadas acima enquanto o observavam sem reação. A porta do quarto se estatelou, e Paul se silenciou com mais calmantes enquanto chorava no travesseiro com uma lâmina atravessada no coração. Poderiam morrer. Poderia a tudo se desvanecer porque não lhe importava mais. E assim Paul se desvaneceu num sono profundo, até ser acordado por um tilintar agudo lá embaixo. Já era de madrugada, e a casa estava em puro silêncio. E então o cujo tilintar mais uma vez. Paul se levantou descalço e rangeu a porta do quarto ao abrir e procurar o que poderia ser. Mais uma vez entoou. Era na sala de estar. Paul se rumou silenciosamente até a escada, avistando a árvore de Natal cintilando na escuridão. Ele desceu se esforçando para não ranger as escadas, e paralisou-se ao avistar pelas luzes nos sofás da sala a cada um dos seus parentes invívidos postos sentados lado a lado com os olhos esbugalhados e línguas para fora, e em frente a sua mãe, enquanto a ajeitava como aos demais, uma criatura de costas alta demais trajando a um longo manto vermelho rubro como sangue rasgado e sujo do que parecia ser piche se arrastando ao chão e um longo gorro da mesma cor e situação que se arrastava às costas até ante ao chão. O aroma pútrido e ferroso era insustentável. Paul não sentia a seus nervos para ser capaz de reagir. Talvez tenha sido um ofego da sua própria respiração, pois a cuja criatura virou-se à ele vagarosamente. Não havia forma contendo aquele gorro a não ser um par de cavidades rubras como as vestimentas no lugar dos olhos. A criatura levantou a um dos braços revelando-se negramente peludo com compridas unhas pontiagudas também rubras apontadas a Paul enquanto no seu pulso sinos enroscados e enferrujados se bateram tilintando lhe anunciando. O espírito inverso do Natal. Aquele que não deve ser desejado nesse período. E Paul havia desejado. Ante a Paul tentar reagir gritadamente com a última força de suas entranhas, a cuja criatura avançou-se contra o jovem envolvendo-no em suas vestimentas como ao Papai Noel ensacando a seus presentes e a última coisa a que Paul ouvira foi o tilintar daqueles sinos. E então silêncio. Completo silêncio. Paul acordou assustado em suor quase caindo da cama. Era de noite. A noite da ceia. Ouviu a mesma música natalina de antes começar lá embaixo, e se rumou corridamente pelas escadas. Todos estavam lá postos à mesa da maneira que Paul havia sonhado e fitando ele com aquele mesmo olhar penoso. Naquele momento, Paul sentiu o inverso do que havia desejado mais cedo e se sentiu aliviado ao vê-los e ao barulho. Tentou esboçar um sorriso trêmulo enquanto o seu tio se levantava para coagi-lo a ir se sentar. Então, Paul ouviu àquele tilintar mais uma vez, e entreolhou ao seu punho direito, vendo um pequenino sino enferrujado enlaçado nele. E Paul soube naquele momento que estaria fadado a sempre repetir o que havia desejado naquele dia num loop como aquela bola de cristal à qual estava preso enquanto as garras rubras daquela criatura a circulavam de novo e de novo se divertindo pelo o destino cruel de mais um dos milhares na sua coleção que desejaram similarmente o que Paul quis na véspera de Natal. Esse seria o preço que Paul pagaria, todos os dias seriam aquele Natal que ele não pôde simplesmente tolerar até terminar no dia seguinte, pela eternidade.

ilLoham
Enviado por ilLoham em 13/12/2019
Reeditado em 01/11/2023
Código do texto: T6818068
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