o segredo da torta

*{obs; conto inspirado por uma de minhas músicas favoritas, “Girl With One Eye”, da banda Florence + the Machine.

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Um dos contratempos temerosos a um vendedor é o de que surja um concorrente à curta distância. E tal infortúnio decaiu sobre Lucy que vendia tortas caseiras de batata doce em um ponto na rua mais movimentada de seu pequeno vilarejo que com esforço e sorte se tornou um tanto popular e com os lucros enchendo as cestas não faltaria mais os remédios caros que ela provia ao seu irmão caçula adoentado e que tal fora um dos motivos para começar a vender. Até que Angel se pôs à poucos metros de Lucy em uma quente manhã para vender do mesmo mas tortas de maçã. Lucy fora consumida por um imediato fervor trêmulo ansioso quando chegou ao seu ponto e lá avistou a Angel já vendendo para um de seus clientes. Os instintos de Lucy imediatamente premonitaram que uma seca recairia sobre a sua tenda, e por tanto, Lucy assistiu prostrada aos que deviam ser os seus lucros deslizando de si naquele mesmo dia enquanto seus clientes passavam diretos pela mesma a ignorando ávidos até Angel. Ao chegar em casa e se deparar com seu irmão sorridente mais estável das dores por causa dos remédios, Lucy se avulsionou temerosa. No dia seguinte, como prevera, Lucy se desfalecia mais da agraciação sortuda que escorregava de suas mãos e enchia mais as de Angel. As moscas pousando em suas tortas premonitavam o inevitável. Por quê? O que havia nas tortas de Angel para tanto e tão fácil? Seria algum encanto daqueles olhos de burca azulados e os cabelos loiros cacheados? Seriam os olhos de peixe morto castanhos e os cabelos ruivos desgrenhados de Lucy menos atraentes? Tortas são todas com similar massa. Seria apenas a vida cruel desferindo mais um de seus golpes abusivos? Cujas indagações emergiram em lágrimas enquanto Lucy observava a uma de suas clientes mais assíduas comprando de Angel e ignorando a sua existência. Ao voltar para casa mais cedo por desistência e se deparar ao seu irmão em prantos pois os remédios haviam acabado, a avulsa em Lucy eclodiu ao seu coração em uma lâmina. “Nós teremos que tirar da comida então para comprar os remédios,” a mãe de Lucy resmungou chorosa por um olhar melancólico farta daquela vida de viúva pobre quando a filha confessou com lágrimas engasgadas que não havia ganho o suficiente nos últimos dias. Consequentemente, Lucy também acabaria sem sustento para tortas. Lucy sentia seu espírito se rasgar manchando sua dignidade.

À tardinha seguinte, enquanto Angel caminhava de volta para casa sorridente com seu cesto de tortas vazio e os bolsos cheios admirando as galáxias noturnas se pontando pelas montanhas e respirando a relva com sua ventania, se atentou a um tom súbito em sua retaguarda, algo avançava em sua direção e, ante a se virar arrepiada em sua espinha, a última cena que Angel avistaria fora um golpe turvo reluzente de um cutelo ao seu crânio frontal que demasiada a força desferida escapuliu respigando a um de seus olhos daquele céu azulado límpido.

A mãe de Lucy acordou assustada, por instinto, e avistando imediatamente a um clarão conhecido da luz do celeiro pela janela, se correu até ao caçula e, o encontrando em sono profundo, avançou atrás de Lucy e, não estando em seu quarto, se rumou ao celeiro baforando o ar gélido, se deparando a Lucy com um avental e roupas manchados em sangue ao lado de um enxuto saco grande pingando pela beirada de uma velha mesa enquanto acometia um cutelo avermelhado à uma carne demasiada branca já com muitos pedaços esquartejados. Lucy se virou lentamente a sua mãe, delineando um sorriso arfante pelo esforço. Sua mãe instintivamente se rompeu em um arrepio espinhoso, havia algo sombrio sobre Lucy, em seu olhar de burca escurecido. Ante a sua mãe resmungar, Lucy se adiantara retrucando autoritária de que havia roubado carne pois descobrira uma nova ideia e portanto continuariam com o sustento anterior. Sua mãe, farta e conivente, desistira e apenas retornou casa adentro.

Corridos um par de dias, enquanto os cidadãos e a polícia se indagavam sem sucesso à procura de Angel que desaparecera com suas saborosas tortas, os aldeões se alegraram quando se depararam a Lucy bem cedo em uma manhã conseguiente vendendo a tortas graúdas que agora exalavam a um aroma salgado agradável. “São novas tortas, de carne moída,” Lucy apresentava. Um por um, seus antigos clientes retornavam. E mais ávidos no dia seguinte, trazendo a novos clientes. Em uma semana apenas Lucy ganhara quase o que conseguiria em meio mês árduo, tanto que sua mãe e seu irmãozinho a ajudavam a trazer novas remessas de tortas.

Ao final daquela nova primeira semana, ante a ir embora, Lucy fitou por aquele mesmo olhar de burca escurecido ao ponto agora vago adiante que pertencia a Angel, e delineou a um riso arfante. Lucy descobrira o que havia de tão chamativo nos ingredientes que compunhava a Angel, e ainda havia mais deles para suas novas tortas por algumas semanas. Angel era uma garota corpulenta.

*I said,

“Hey, girl with one eye, get your filthy fingers out of my pie;”

I said,

“Hey, girl with one eye, Iʼll cut your little heart out ʽcause you made me cry.”

ilLoham
Enviado por ilLoham em 09/12/2019
Reeditado em 01/11/2023
Código do texto: T6814715
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