Aconteceu no Coliseu
Rômulo o filho mais velho de uma família de tradição católica, era o único que costumava ler sobre tudo que falasse ou ensinasse sobre espiritismo. Muitas foram às vezes que se aborreceu por estar lendo algum desses livros, mas nunca abriu mão de lê-los. Quando perguntado o porquê dessa obsessão, justificava-se dizendo que era preciso ter conhecimento de onde vinha ao nascer, e para onde iria após a morte. Achava que os padres escondiam muita coisa e na sua opinião era pouco elucidativo o que diziam a respeito desse assunto. Frequentava a igreja mais porquê seus pais o levavam, todavia sempre deixava claro que quando fosse maior passaria a frequentar um centro espírita. A família convivia com essa queda de braço religiosa, mas no restante gozava de perfeito equilíbrio.
Seus pais nunca deixaram de viajar durante as férias e lá estavam eles, José e Maria, traçando planos para as próximas férias da família. Tinham em mente de que nesta viagem pela Europa passariam apenas dois dias em Roma. Lá pretendiam visitar dentre outros locais, o Vaticano e o Coliseu.
Assim que Rômulo ficou sabendo, ponderou que gostaria de não ir a nenhum dos dois locais.
José não entendeu e quis saber por que. Seu filho não titubeou e respondeu com a convicção de quem sabia o que estava falando: “Pressinto que se eu entrar em qualquer um desses lugares vou morrer como nas outras encarnações”.
Seus pais acharam graça e até interessante tal justificativa para não viajar. Certos de se tratar apenas de uma imaginação fértil de um garoto de quinze anos, seus pais continuavam tentando dissuadi-lo de desistir do passeio, entretanto Rômulo teimava em não querer ir, porém a insistência foi tanta que conseguiram convencê-lo ao contrário e ele acabou concordando, todavia deixou claro que só iria viajar com eles se naqueles dois lugares ele não precisasse entrar. Ficando então combinado: – Em princípio Rômulo não precisaria entrar naqueles dois lugares, só se mudasse de ideia e resolvesse visitá-los por iniciativa própria.
As férias chegaram e a família partiu para a Europa. Visitaram Portugal, Espanha e França. Até esse momento tudo ia às mil maravilhas, porém era chegada a hora de resolver o que fazer, pois estavam a caminho de Roma e Rômulo continuava irredutível na sua posição. Estaria com eles em Roma, mas não visitaria aqueles locais.
Assim que chegaram à cidade, como eram muito religiosos, procuraram uma igreja e pediram ajuda ao padre. Este, assim que tomou conhecimento da dificuldade que estavam enfrentando, conversou longamente com o menino. Nessa conversa fez ver a ele que aquele seu pressentimento de que morreria não tinha fundamento, e afiançou de que ele poderia visitar qualquer um dos locais, que nada, absolutamente nada, iria acontecer com ele. Tudo não passava da sua imaginação infantil. Padre Eustáquio se prontificou a acompanhá-los nas visitas se assim ele se sentisse melhor.
Confiante na palavra do padre, Rômulo resolveu junto com ele e seus pais conhecer os locais, e a conselho deste, que começassem pelo Vaticano, pois lá estaria bem próximo de Deus. Conheceriam a igreja de São Pedro, a Capela Sistina e com um pouco de sorte ouviriam a palavra do Papa. No dia seguinte então visitariam o Coliseu e caso ele ainda achasse necessário à presença do padre Eustáquio, não teria nenhum problema, pois o mesmo também havia se prontificado em acompanhá-los. Assim, naquele dia mesmo estiveram no Vaticano visitando e conhecendo tudo a que tinham direito, e para alegria de todos nada aconteceu a Rômulo. À tarde passearam em outros pontos turísticos e a noite combinaram que no dia seguinte todos visitariam o Coliseu, desde que o padre os acompanhasse.
A manhã estava tão radiante que até chamou a atenção de padre Eustáquio, levando-o a comentar com a família.
- Vamos aproveitar bem. – Falou o padre. – Esse tempo limpo possibilita mais clareza em visualizar alguns detalhes nos subterrâneos, principalmente onde ficavam as jaulas dos animais, as celas em que ficavam os cristãos aguardando a hora de enfrentarem os gladiadores ou de serem devorados por leões, bem como as galerias de acesso necessárias aos serviços do anfiteatro.
Rômulo entrou no Coliseu ao lado de sua mãe. Seu pai e irmãos, do padre Eustáquio, que como todo bom italiano ia descrevendo o local e narrando os possíveis acontecimentos do passado. Empolgados com a visão interna do Coliseu, seus pais e os dois irmãos não notaram a ausência de Rômulo que ficara para traz parado no meio da arena. Ao darem falta dele, olharam à volta e o avistaram mais atrás, estava paralisado. Voltaram na sua direção. A transformação sofrida por Rômulo deixou a todos preocupados, que sem saber o que estava acontecendo lhe perguntavam o que ele estava sentindo.
- Eu não estou sentindo... Estou é vendo uma apresentação com bigas e gladiadores bem ali, no meio da arena. – Rômulo falava e apontava para o local onde supunha estar vendo ou realmente via tal apresentação.
- O que você diz ver não pode ser possível, pois não está acontecendo nada, meu filho. Até porquê nem existe mais a arena, só ruínas. – Padre Eustáquio tentou tranquilizá-lo.
- Não só é possível, como inclusive vejo varias pessoas apavoradas... Parecem ser cristãos, os que acabam de entrar na arena. Padre! Estou me vendo... Sou um dos gladiadores na biga...
- Tudo não passa de imaginação sua. Melhor, uma fantasia. Vamos continuar com a visita, que logo isso passa.
- O que vejo não é uma fantasia, padre, mas sim uma carnificina. Acabo de me ver degolando um dos coitados... Nossa é um jovem como eu... O que fiz? – Rômulo estava transtornado.
- Não diga bobagem, meu filho. Nós vamos é sair daqui, isto não está lhe fazendo bem. Vamos, rápido, ele está muito agitado. – Determinou sua mãe.
Nesse exato momento surgiu do nada um rapaz desconhecido com uma adaga na mão, e sem que eles esperassem a enfiou nas costa de Rômulo e fugiu, desaparecendo no meio dos turistas que ali estavam.
- Avisei que eu não podia entrar aqui, agora é tarde demais... Estou morrendo...
Com a antiga arma cravada nas costas, Rômulo, ferido de morte, caiu ao chão já meio desacordado. Sua mãe desesperada o amparou nos braços e antes que ele desse o último suspiro pode ouvi-lo consolá-la.
- Não se culpe, eu já sabia que isso ia acontecer, agradeça ao Padre Eustáquio por ter me ajudado a cumprir minha missão... Não fosse ele eu teria fracassado.