A MALETA PRETA - 01

     Acordei com um cheiro forte de fumaça. Meu corpo todo está muito dolorido. Abro os olhos aos poucos. Meu pescoço dói muito. Meu rosto está grudado nas costas do assento do banco do passageiro de um carro. Acho que as duas pessoas, um casal, que estavam no banco da frente estão mortas. Está escuro, meus olhos estão se acostumando à situação ainda, mas percebo que o fogo vem do motor.

     Estou apertado, quase que preso entre o banco detrás e as costas do banco do passageiro. Se não fosse o cinto de segurança, eu teria sido arremessado para fora do carro, com certeza! Tem uma maleta preta, no estilo daquelas usadas por espiões nos filmes, presa no meio do painel do carro, ou melhor, no que sobrou dele.

     De repente, quase como um flash, sinto que devo proteger aquela mala com a minha própria vida. Sinto uma grande tristeza, um sentimento de perda muito grande pelas pessoas que morreram ali na minha frente, mas não consigo lembrar quem são!

     Junto todas as minhas forças para sair de onde estou e alcançar a maleta. Ouço sirenes e vejo aquela luz azul e vermelha intermitente se aproximando. Estaria a salvo, finalmente?

     Quando por fim a puxo com a mão, escuto um estampido. Um vulto que ainda não consigo identificar está atirando em mim! Ouço o zunir dos projéteis passarem próximos da minha cabeça. Ouço gritos em minha direção, palavras de ordem, mas não estou escutando muito bem, o barulho do fogo consumindo o carro e os tiros não me permitem distinguir o que é.

      Consegui sair do veículo e fui direção à mata. Se eu tentasse me abrigar no automóvel seria uma questão de tempo até ou ser consumido pelas chamas ou ser atingido pelo atirador. Tento correr, mas minhas pernas foram afetadas pelo acidente. Meu calcanhar dá uma fisgada toda vez que dou um passo, mas sigo mancando assim mesmo.

     Ao me distanciar um pouco mais mata adentro, pude ouvir com nitidez o que estavam falando:

     - Cerquem a área, ele não tem como fugir!

     Quem fala tem autoridade, comanda com convicção. Acho que é um tira. O que eu fiz de errado para ser perseguido pela força policial?

     O vulto que atirou em mim, enquanto eu tentava alcançar a maleta, não parecia vestir uma farda e as luzes das sirenes ainda estavam distantes. Será que era realmente a polícia? Haveria outra pessoa tentando me pegar? Por quê?

  Os fachos de lanternas logo se multiplicaram. Pude ouvir os passos atravessarem vigorosamente o mato alto. Por ironia do destino, consegui ouvir o barulho de um curso d’água ali perto. As lanternas, mesmo que de longe, permitiram-me enxergar que por ali passa um rio, a uns 5-6 metros de altura abaixo dali. Não sei se o rio é fundo o suficiente. Valeria a pena saltar?

     De repente, um facho de luz me cega. Ouço o comando claramente:

     - Parado! Deixe a maleta no chão e mãos para o alto!

     Contudo, antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, ouvi mais alguns tiros. Não sei quem estava atirando em que. Agarrei a maleta, pulei no rio e rezei para continuar vivo.

 
Manassés Abreu
Enviado por Manassés Abreu em 24/07/2019
Reeditado em 15/05/2020
Código do texto: T6703735
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