UMA HISTORINHA NADA FOFA
Carla e Gustavo amavam uma noitada daquelas, mas nunca se pegavam. Eram apenas bons amigos. De repente no fervor da balada Gustavo tascou um beijo em Carla e foram para um lugar mais escondido dos outros se agarrar.
Depois de todo o fervor da volúpia e do álcool que os dominavam, Carla resolveu em falar com seu amigo para leva-los pra casa:
- Tá louca, menina? Eu te levo. Eu to de boas.
- Cê tá na nóia mesmo, né meu. Como você vai me levar pra casa? Você também bebeu.
- Relaxa. Só bebi uma latinha de Pitu. Você que entornou tudo!
- Caraca! Isso vai dar merda, Gustavo. Vamos falar com o Guilherme. Ele nem desconfia da gente.
- Falar com teu ex? Tá chapada ou quer cem reais?
- Ele não é meu ex, pô. A gente só ficou por um mês. Era só lance.
- Ó, cala a boca e vai lá pra fora. Vou pegar o carro.
- Mermão, isso vai dar ruim e não to nem aí pra ti.
- Calma. O que tinha que ser dado já foi.
- Ah muleke trouxa! – falou Carla entendendo a ironia.
Chegando no carro, Carla deitou no banco da frente e Gustavo dava partida:
- Fica de boa aí que eu vou devagar por um atalho que não tem ninguém. Pela pracinha que dá na estrada de terra.
- Ih. Sei não hein. Aquele local é terra dos 3D.
- 3D. Que desgraça é 3D, menina?
- Delinquência, despacho e desova.
- Mano, cê viaja com força. Deve ter bebida aguardente da privada.
Enquanto Gustavo dirigia pela estrada de terra no escuro, onde o mato e as arvores cercavam o trajeto, que mais parecia uma trilha de parque ambiental do que um atalho pra casa, ele sente uma leve tontura e sem querer soltou o volante. Carla estava desligada e zonza também não tinha percebido.
De repente quando Gustavo segurou o volante mais uma vez e abriu os olhos só deu tempo de ouvir o grito e o estrondo do pára-choque batendo em algo sólido e curto. Ele freiou bruscamente fazendo Carla bater a cabeça no banco:
- Qual foi, caramba. Tá tirando? Que parada é essa aí?
- Cala a boca, Carla. Acho que deu ruim, meu.
- Ah, pelamor! Comprou a carta nas Casas Bahia é?
- Shhhh. Cala essa boca, caramba. Parece que atropelei um animal aqui.
- Vish – Carla riu em voz alta acendendo um cigarro – vou nem descer pra ver. Não gosto de ver bicho morto todo estrupiado. Dá nojo.
Quando Gustavo se deu conta, viu que era um senhor de idade que fora atropelado, bateu a cabeça numa arvore e morreu na hora com o impacto.
- CARLA! CARLA! Mano, ferrou! Ferrou! Ferrou!
E muitos palavrões ele falava com as mãos na cabeça andando de um lado para o outro.
Carla desceu do carro após estranhar o amigo com um ar de assustado e o rosto pálido.
- Que horror – Carla gritou levando as duas mãos ao rosto – Meu Deus. Eu não quero ser presa não. Que horror! Que merda! – e descambou a chorar falando palavrões.
- Carla, fica quieta, meu. Pega o vovô de um lado que eu pego de outro.
- Ficou louco? Vai fazer o quê?
- Menina, escuta aqui – falou apontando o dedo na cara dela – eu não to a fim de ser preso e virar mulher de bandido na cadeia, entendeu? Você também não está com vontade de tomar uma surra e ter o rosto estampado num jornal da Globo ou da Record por ter matado um velho. Então para de reclamar, cala essa sua boca e me ajuda a enterrar o velhinho.
Horrorizada com aquilo, mas convencida pelos argumentos do amigo, eles entram na mata adentro carregando o corpo do idoso.
Quando soltaram o corpo no chão no meio do matagal arborizado naquela noite fria onde nenhum som se fazia, a não ser o deles se perdendo no mato, encontraram no bolso do idoso uma arma.
- Com certeza o vovô tava tomando conta de alguma fazenda de alguém por aqui. – disse Carla
- Mano, não interessa. Vamos tratar de enterrar o corpo aqui mesmo.
- Eu hein?! Eu não. Nem pá tem aqui.
- Ué, o que foi? De safada virou donzela? Pode tratar de me ajudar a fazer um buraco com as mãos mesmo. – falou com voz arrastada Gustavo.
- Se liga, muleke otário. Minhas unhas são grandes. Se alguém achar uma unha minha aqui vão me investigar. Se vira aí.
Irritado Gustavo começa a cavar a cova com as mãos mesmo. O barro estava úmido.
No momento em que ele estava terminando de cavar, ouvir o barulho de um carro com sirene chegar ao local.
- Caraca, é a polícia. Ferrou! Ferrou! Já era tudo! A gente tá frito! – dizia Carla assustada.
Gustavo ia colocar o corpo do idoso no buraco e deixar aberto mesmo, quando o barulho de alguém no meio do mato apareceu com uma lanterna surpreendendo eles:
- Parados os dois! – gritou o policial com a arma em punho.
Carla correu pra dentro do mato deixando Gustavo sozinho com o policial que voou pra cima dele armado dando tapas.
- Ah, então te peguei no flagra né, seu trouxa!
- Não, senhor. Foi um acidente. Eu juro eu posso explicar... – gaguejava Gustavo chorando de medo diante do brutamonte que era o policial.
- Vai chorar agora na cadeia filho da...
Um disparo se ouviu. O policial caiu no chão. Morto.
Gustavo se virou e viu Carla tremendo, segurando o revolver que caiu do bolso do idoso:
- Agora temos dois cadáveres. Vamos enterrar os dois e dar o fora daqui.
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Após ler tudo, a professora chamou Carolzinha na sua mesa. Ela estava corrigindo as historinhas de cada criança para colar no mural da escola como trabalho de literatura infantil. Carol veio mancando por causa dos pinos da sua perna:
- Oi, fessora. Gostou?
- Menina, o que você tem na cabeça? Não posso colocar uma história dessas no mural da escola. De onde você tirou isso?
- Ah, Fessora. É que... sei lá. Eu pensei em algo mais real.
- Real? Você chama essa loucura horrível que você escreveu de real? Isso é pior que fantasia!
- Ah, mas a historinha não ficou boa, Fê?
- Menina, se você continuar a escrever histórias desse tipo vou falar com seus pais, entendeu?
- Mas professora... eu...
- Nada de mais. Pode tratar de escrever outra.
Carolzinha voltou para a sua carteira triste e começou a escrever outra história.
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Em casa, a professora vai pro quarto e ficou olhando a foto do pai, ex-caseiro, e do marido ex-policial, ambos encontrados mortos num matagal há 8 anos atrás, onde ninguém até hoje descobriu os assassinos.
Uma homenagem a escritora CAROL GALVÃO.
Leiam suas obras e entenderão.