Semana em Cárcere

OITO DIAS ANTES

Júlia, uma adolescente de quinze anos, estava indo na casa de sua amiga de classe, Paula, todas as noites daquela semana, para estudarem juntas, pois estavam na semana de provas. Ás vinte e duas horas seu irmão Carlos, de vinte e dois anos, que trabalhava de motoboy em uma lanchonete, vinha buscá-la para levá-la para casa, e logo em seguida voltava para o trabalho.

Naquela quinta-feira, Carlos ligou para a irmã dizendo que tinha várias entregas para fazer e que não poderia buscá-la. Ela teria de voltar para casa a pé e sozinha. Mas a distancia era pequena, apenas alguns quarteirões. Então Júlia imaginou que não tinha nada de mais. Viviam numa cidade pequena e pacata.

As amigas se despediram com um abraço e Júlia seguiu o caminho para casa. Olhou para o céu, viu aquela lua cheia linda, e imaginou que se tivesse ido de moto com seu irmão, não contemplaria aquela bela vista.

Pegou então seu celular para checar suas mensagens e viu que não havia nada de novo. Olhou para o céu novamente, mas agora uma nuvem rosa tampava a lua. Naquela parte da rua, os postes estavam sem luz, e não havia movimento de pessoas. Foi aí que um carro preto de vidros negros parou ao seu lado, a porta de trás abriu-se e um homem de capuz preto apontou-lhe uma arma dizendo:

-Entre no carro agora, guria, e em silêncio!

Ela entrou desesperada, e notou que o motorista e o homem que estava no banco da frente também usavam capuz preto. Ela levou uma pancada na cabeça com a arma e desmaiou.

SETE DIAS ANTES

Na casa de Júlia, seus pais Hélio, de cinqüenta anos, e Ana, de quarenta e oito, além do irmão Carlos, estavam desesperados com o desaparecimento da menina. Já haviam ligado para os hospitais locais e para a polícia perguntando sobre Júlia, mas não tiveram nenhum retorno.

Carlos chorava dizendo:

-A culpa é toda minha, se eu tivesse ido buscar minha irmãzinha, ela não teria desaparecido!

O pai tentou consolar o jovem:

-Não é culpa sua, filho. Como você iria imaginar que aconteceria uma coisa dessas? Por favor, não sinta-se culpado.

De repente o telefone tocou e Hélio correu para atender:

-Alô

-Quem fala? –dizia uma voz grave.

-Aqui é Hélio.

-Você é pai da Júlia?

-Sim, sim. Quem é você? Tem noticias da minha filha?

-Sim. Sua filha foi seqüestrada. Eu sou um dos seqüestradores. Mantenha a polícia fora disso, queremos dez mil reais para libertar a guria.

-Minha filha está bem?

-Ainda está inteira, mas se você vacilar ela vai sofrer. Ligarei novamente para informar onde você deve deixar a grana...

PLACK, TUU TUU TUU TUU – E o homem desligou o telefone.

QUATRO DIAS ANTES

Júlia estava num pequeno quarto sem janela. Ela já não tinha noção certa de quantos dias se passaram. Três dias? Quatro dias? Tudo que via eram paredes mofadas, um piso de chão batido e no teto uma lâmpada que não funcionava.

De vez em quando um homem de capuz preto abria a porta do quarto, dava a ela alguma coisa para comer e a levava ao banheiro. Ele perguntava como ela estava, se sentia alguma dor, se havia conseguido dormir. Dizia que logo isso teria fim.

Ela sentia saudades da sua família, dos amigos. E no seu íntimo não conseguia sentir ódio daquele homem de capuz. Ela sentia pena dele, imaginava que ele não era uma má pessoa, sentia vontade de conversar com ele, mas não tinha coragem.

DOIS DIAS ANTES

O telefone tocou e Hélio atendeu.

-É o pai da Júlia?

-Sim

-Você já tá com a grana na mão?

-Tô sim.

-Então amanhã ás onze horas da noite em ponto você vai deixar a grana bem embalada num papelão no passeio ao lado direito da saída da garagem do shopping da cidade. Depois vá embora logo. Eu ligo se correr tudo como planejado.

-E minha filha está bem?

PLACK TUU TUU TUU

O homem desligou o telefone.

ONTEM

Ás onze da noite Hélio dirigiu até o local combinado e deixou o dinheiro embalado com papelão e fita adesiva no local certo. Voltou para casa e esperou. Á meia noite o telefone tocou e ele atendeu:

-Alô

-Você agiu certo, coroa. Amanhã ás sete horas da noite iremos deixar sua filha na rodovia, a cinco quilômetros a frente da saída da cidade. Vá sozinho. Se envolver a polícia ela morre.

-Sim. Ok.

HOJE

Júlia estava sonolenta quando foi deixada na beira da estrada. Parecia estar sob efeito de algum calmante. Aquilo era para ela um pesadelo.

Então ouviu um grito vindo do lado oposto da rodovia de mão dupla, uma voz familiar chamando pelo seu nome. Ela reconheceu a voz, era seu pai.

Emocionada, foi ao encontro dele que a esperava de braços abertos, chorando. Mas na emoção do momento, a garota se esqueceu de olhar para os lados ao atravessar e foi atropelada por uma carreta que passava por ali acelerando.

Seu pai foi ao seu encontro, mas se certificou que a menina já estava sem vida.

EPÍLOGO

Após o ocorrido a polícia inicia uma investigação do caso, e três dias após o enterro da garota, dois guardas abordam seu irmão Carlos na rua montado em sua moto e dizem:

- A casa caiu. Você está preso!

FIM

Higor Santos
Enviado por Higor Santos em 16/02/2019
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