Tic Tac
Ele não tirava os olhos do relógio de ponto digital, contando os segundos que faltavam para passar sua digital e ir embora do trabalho, encerrando mais um expediente. Tamborilava os dedos sobre a mesa que estava apoiado, batendo levemente o pé direito no chão. Os segundos restantes passavam diante de seus olhos, uma gota de suor escorria pelo seu rosto.
Todo dia era essa rotina, esse mesmo nervosismo para deixar sua digital gravada naquele aparelho. O problema maior era na entrada e na volta do almoço, quando atrasos não eram tolerados.
Luís estava terminando seu jantar, sentado em uma mesa na cozinha. Ele não vivia com ninguém, passava a maior parte do seu tempo sozinho. Se afastou de várias pessoas, mas era temporário, ele só precisava de um tempo. Enquanto comia, levantou de um pulo da cadeira, como se tivesse lembrado de que precisava fazer algo naquele mesmo instante, mas ficou parado encarando o nada. Por um momento, ele acreditou que estava atrasado e precisava passar sua digital no relógio de ponto. Percebendo aonde se encontrava e que era noite, ele relaxou e voltou a sentar, dando suas últimas garfadas na comida.
Nos últimos meses, Luís começou a fazer as coisas mecanicamente, desde escovar os dentes como até caminhar de volta para sua casa. Sempre contando o tempo que gastava para fazer suas atividades, tentando reduzi-los.
Números passavam por sua mente, sem nem mesmo ele entender o que significavam. Sentia-se pressionado por eles, como se fosse um servo deles.
Passando a mão por sua cabeça, ele notava o avanço de sua calvície, e sabia que não era devido sua idade, mas sim pelo estresse que tomou conta dele. Sua barba sempre estava feita, já que Luís era muito cuidadoso com ele mesmo e com suas tarefas.
Olhando pelo relógio da sala, ele via o tempo passar, esperando dar a hora dele se deitar na cama e dormir, ou tentar pelo menos, já que essa tarefa se tornou muito difícil para ele ultimamente.
Após se deitar, acabou adormecendo sem maiores problemas. Uma hora se passou, quando Luís acordou sobressaltado e com os olhos arregalados. Ele teve um pesadelo, onde corria para alcançar o relógio ponto antes que desse a hora limite, mas nunca conseguia chegar no aparelho, por mais que se esforçasse a distância não diminuía.
Levou alguns minutos para ele se recuperar, mas depois disso não conseguiu dormir mais, apenas ficou olhando para o teto contando os segundos que passavam, esperando a hora em que o despertador tocasse para iniciar mais um dia, tamborilando os dedos no peito com as mãos entrelaçadas.
O quarto foi clareando, o despertador tocou, Luís levantou e foi ao banheiro escovar os dentes e tomar banho. Depois de vestido, preparou seu café da manhã, pegou seus pertences do trabalho e saiu apressado para mais um dia.
Batendo os pés levemente no chão e tamborilando os dedos na mesa, Luís esperava obedientemente para passar sua digital, como um bom súdito, e encerrar mais um dia entediante de trabalho, começando a contagem novamente.