O Reencontro

NARRADOR: Nossa história começa em uma pequena comunidade no interior do Brasil onde fenômenos e situações ocorrem sem maiores explicações...

FILHA: Mãe !!! ocorreu de novo !!!! estava nos fundos da casa lavando as roupas que a senhora me pediu quando alguém chamou insistentemente na varanda. Vim ver quem era e não havia ninguém....

MAE: Olha filha, deve ser algum garoto querendo lhe pregar peças!!!!! Quando seu pai e irmão chegarem, vamos conversar com eles e verificar quem estar por traz dessas brincadeiras....

FILHA : Não sei não!!!! Não parecia ser voz de criança!!!! Parecia ser voz de pessoa mais velha, eu diria até de uma idosa!!!! O fato é que sempre que estou sozinha , ocorre algo dessa natureza!!!!! Mãe estou assustada !!!! não quero ficar mais sozinha aqui!!!!

MAE: Se acalme minha filha, você tem uma imaginação muito fértil!!!! Não há nada com que se preocupar!!! Você vai ver!!!! Esperemos o pessoal chegar e vamos tomar algumas decisões.Agora tira essa cara de preocupada e vem aqui me da um abraço. Me ajude a fazer o jantar que sua avó já esta chegando da cidade.

NARRADOR: A família Campos, composta de cinco pessoas: Um casal e seus dois filhos adolescentes e uma avó por parte de Mãe se mudaram para essa propriedade rural a quase oito meses e até então não haviam problemas...Mas, cerca de duas semanas atrás,começaram a ocorrer situações que os deixavam sem explicações: Em uma noite o filho do casal foi acordado por ruídos na cozinha ,semelhante aos que se faziam quando se ia colocar algo no fogo a lenha que tinham. Pensando ser alguém da casa, foi verificar e não encontrou ninguém, porem o fogão estava aceso.Pensou naquele momento que se tratava das brasas ainda quentes, que ao sabor do vento fez com que reacendessem o fogo!!!

NARRADOR: Em um outro momento,a filha do casal, ao arrumar as ferramentas do pai no galpão anexo a casa, uma das ferramentas caiu da mão e fez um pequeno corte na perna.Chateada e sem saber o que fazer para limpar o ferimento, ouviu uma voz que vinha de dentro da casa: Menina ! vai no quintal, atrás do Pé de Abacate tem uma plantinha, tira umas folhas dessa planta e machuca!! Coloque em cima do corte que amanha estará melhor!!

NARRADOR : Assustada ainda pelo acidente e imaginando se tratar da avó, foi rápido ao quintal e lá, atrás do pe de abacate haviam umas plantinhas. Retirou umas folhas, machucou na mao e colocou sobre o ferimento. Ficou ali sentada observando o efeito do medicamento.

Algum tempo depois ,eis que aparece a avó no campo visual da menina.....

FILHA: Vó!!! Oh vó!!! Que plantinha é essa que a senhora me falou? Gritou a garota ao enxergar a vó de longe.

Vó: Que planta ???? onde???

FILHA: Essa que a senhora me disse pra pegar aqui no fundo do quintal.....

Vó : Não pedi pra você pegar nada ai no quintal. O que é que houve? O que é isso na sua perna? (perguntou a avó se aproximando)....

FILHA: Machuquei-me no galpão de ferramentas e a senhora me disse que pegasse essa planta aqui e passasse no local que ficaria bom.

Vó: Venha cá minha filha!!!! Deixa-me ver isso ai.Que imaginação vocês, jovens, tem hoje... Vamos lá para dentro que vou fazer um curativo ai... Não fique pegando qualquer planta que você não conhece para colocar em ferimentos.... Nem todas servem ....

FILHA: Mas, vó a senhora disse.....Ah!!! Deixa pra lá....

NARRADOR: Aquele fato não saiu da cabeça da garota. Que a todo o momento se questionava...

FILHA: “ Hora, se não foi minha vó que falou, quem foi? E como ela podia saber que eu havia me machucado?”. Mistério....

VOLTANDO AO EPISODIO INICIAL....

MAE:Filha!!!! Vamos fazer o jantar..... Depois agente conversa sobre isso.....

NARRADOR: Mãe e Filha , fizeram a janta e aguardaram na varanda as pessoas restantes da família chegarem.... Não demorou muito tempo a avó chegou e minutos depois o pai e irmão da garota.....

NARRADOR:Após o jantar arrumaram tudo e , como de costume, foram para a varanda conversar....

FILHA: Pai !!!! tenho algo a contar....Houve hoje pela tarde .........

NARRADOR: A filha contou com detalhes o ocorrido.... Todos ouviram em silencio sem entender ainda como era possível. Moravam ali a pouco mais de oito meses e estavam praticamente isolados dos vizinhos....Alem do mais ,era a propriedade mais afastada do vilarejo e tinha um acesso difícil.

PAI: Filha , não se preocupe!!!! Amanha vou dar uma olhada por ai nos arredores para ver se acho algo.

AVO: Abraçando a neta disse - Netinha!!!!! Descanse!!!! não deixarei você sozinha.

IRMÃO: Maninha, amanha vou a cidade e passarei próximo ao escritório da imobiliária que nos vendeu essa propriedade!!!! Buscarei informações sobre nossos vizinhos. Por certo há alguém na região que esta brincando conosco!!!!

NARRADOR: A conversa descambou para outros temas e no instante seguinte estavam todos descontraídos, sem lembrar mais do ocorrido.....À noite chegou e todos se recolheram para dormir.....

NARRADOR: No dia seguinte, como prometido, o pai saiu em busca de evidencias da passagem de pessoas nas proximidades da casa.Do mesmo modo, o filho foi para a cidade prometendo averiguar por lá....

AVÓ:(chamando a neta e filha no canto....)- Esperei os meninos saírem para lhes contar algo..... Existe realmente alguém por aqui. Não sei onde mora, mas tenho a impressão que deve ser por aqui por perto. Trata-se de uma senhora ... Já tive umas duas oportunidades de conversar com ela.

MAE: Oh mãe!! A senhora já sabia? Porque não nos disse antes? Quem é? Mora onde?

AVÓ: Calma!!!! A primeira vez que a vi, estava chegando na entrada da propriedade, bem ali atrás daquelas pedras altas. Ela estava sentada colhendo flores. Pediu desculpas quando me viu e perguntou se podia colher....

MAE: Foi na quarta? Esse encontro foi na quarta? Responda-me mãe!!!! Foi no dia em que saiu pra comprar sementes para os meninos plantar?

AVÓ: Foi minha filha..... Paciência......Estou contando!!!!! Ela me disse que queria fazer uma visita a uma antiga amiga e queria agradar com aquelas flores. Não vi problemas algum no pedido que me fez. Cumprimentei-a deixei com a sua tarefa.... Porque a pergunta?

MAE: Porque naquele dia, depois que você chegou , no meu quarto, vi um ramalhete de flores na cômoda e pensei que fosse a senhora que havia feito e colocado ali.....

AVÓ: Nossa!!!! Você tem certeza? Não pode ser coincidência, não?

MAE: Não, mãe!!! Só eu estava em casa..... A senhora chegou muito tempo depois, lembra? Foi guardar as coisas no galpão e depois ficou no quintal limpando o terreno das folhas que caíram pela manha.... Fui ao quarto pra pegar algo que agora não me lembro. E ai vi as flores.... Ia lhe agradecer quando os meninos chegaram da rua....Terminei me distraindo.....

AVO: Bem ..... seja quem for, é muito simpática e agradável..... Tive outro momento com ela. Foi a uma semana quando estava indo à vila. Estava na carroça, na estrada que da pro rio, e ela apareceu me pedindo carona. Parei a carroça e aguardei ela subir. Conversamos sobre trivialidades, sobre o vilarejo..... ela parece conhecer muita gente por lá! Um determinado ponto antes de chegar à vila agradeceu e pediu pra descer.... Senhora muito simpática!!! Penseina ocasião.....

NARRADOR: As descobertas das três mulheres de que as ocorrências vivenciadas teriam uma mesma causa, deixou-as preocupadas e ao mesmo tempo cheias de curiosidades..... Mau esperavam o retorno do pessoal para colocá-los a par dos fatos.....Por certo haveria de ter uma explicação lógica para os ocorridos......

FILHA: (Ainda refletindo sobre o que ouviu da avó e percebendo a chegada do pai ao longe). - Pai!!!! E ai? Tudo bem? Achou alguma coisa???

PAI: Calma!!!! Que pressa é essa? Vamos para a sombra.... Esta um calor de rachar..... Deixa-me tomar um copo de água pra me refrescar......

MAE: (Voltando da cozinha com uma jarra de água) Aqui, beba com calma para não engasgar e sente ai para descansar um pouco.... Mãe contou-nos algo assim que você e Junior saíram que precisam saber..... Sente ai e ouça!!!!

NARRADOR: As três contaram os episódios que haviam ocorrido com elas e as impressões que achavam....

PAI:Muito interessante o que vocês me contaram mas sinto dizer-lhes que não há viva alma morando aqui por perto. A propriedade mais próxima daqui fica na curva do rio, já chegando na vila. Os moradores de lá, um casal jovem com um filho de colo, são filhos de pessoal da vila!!! Procurei algo que pudesse indicar pessoas nas redondezas, mas não encontrei nada....

AVO: E Junior???? Será que ele conseguiu alguma informação que ajude agente a entender o que esta ocorrendo? Vamos aguardar ele.....Torcer para que haja uma explicação lógica para o que esta ocorrendo.....

FILHA: Não morre mais Junior!!!!.... Estamos esperando você chegar....

JUNIOR: O que houve??? Porque vocês estão com essas caras?? Ocorreu algo??

PAI: Senta ai filho!!! ouça o que elas tem a dizer....

NARRADOR: Após alguns minutos as informações foram passadas e repassadas por todos ... e ,Junior, aproveitou e também relatou o ocorrido na cozinha completando assim, todas as ocorrências com os demais....

NARRADOR: Junior então começa a informar as pesquisas feitas na Vila.....

JUNIOR: Vocês sabem quem era proprietário dessas terras antes do senhor Antonio que nos vendeu? Segundo o pessoal do Cartório, nessas terras viviam três mulheres que atuavam na região como parteiras e curandeiras....... Não haviam médicos naquela época e todo parto ou remédios eram conseguidos mediante ajuda dessas mulheres.....Não havia a vila ainda....Estavam iniciando o povoamento da região!!!!

AVO: Mas, o que será que houve com elas? Será que esses fatos que estão ocorrendo tem haver com essas mulheres?

FILHA: Será que a casa é mau assombrada? Jesus Cristo!!!!!

MAE: Não se trata disso filha..... Por certo haverá uma explicação para tudo..... Só temos que buscar essas informações....

PAI: Vamos procurar na vila ou na região, pessoas que possam nos esclarecer sobre essas mulheres que viviam por aqui..... E, se por acaso, houver outro evento ou contato com essa senhora misteriosa, verificar se existe algum vinculo com as mulheres que aqui viviam e o que essa senhora deseja conosco....

NARRADOR: Naquele dia ninguém saiu mais de casa e,à noite , antes de dormirem, fizeram juntos uma oração pedindo proteção e esclarecimentos......Nos dias subsequentes, nada ocorreu e as rotinas da casa pouco a pouco retornaram a normalidade.....

NA VILA, UM DIA DE SABADO, TODA A FAMILIA JUNTA NO ANIVERSARIO DA VILA.

AVÓ: Hoje é um dia muito especial, é o aniversario do vilarejo e durante o dia inteiro vão haver vários eventos pela praça...Vou na capela assistir a missa. Quem vem comigo?

MAE : Vou com você mãe.....

FILHA: também vou.... Depois agente pode ir às lojinhas de roupas na praça? Tem muita novidade....

PAI: Prometi ao senhor Antonio, o exproprietário das terras que compramos que iria vê-lo assim que chegasse. Encontro com vocês na praça. (dizendo isso saiu como filho )....

NO ESCRITORIO DO SENHOR ANTONIO

NARRADOR: O Senhor Antonio é uma pessoa extrovertida, bem humorada,que trabalha no escritório de vendas de terras ligadas ao setor publico do estado. Sempre solicito, procura na medida do possível ajudar aos que buscam seus préstimos....

Sr.ANTONIO: Sejam bem vindos, meus amigos!!!! Espero ser útil a vocês. A história que vocês me contaram é impressionante!!!! Pensei muito!!! Fiz uma busca pela região mas,não se preocupem!!! Não revelei nada a ninguém. Agora encontrei uma família que esta aqui há muito tempo. Acredito que possam obter os esclarecimentos que necessitam.... Vamos lá?

PAI: Obrigado pela ajuda, estamos a sua disposição, vinhemos para isso!!!

Sr.ANTONIO: Essa família mora fora da cidade. Um pouco longe.... Vamos ter que ir na carroça...

PAI: Junior, é melhor você ficar e avisar ao restante da família onde irei... Eles podem ficar preocupados quando não nos encontrar na praça...

JUNIOR: Pai, também gostaria de ir com o senhor...Por favor!!!

Sr.ANTONIO: Deixa o garoto ir!!!! Vou avisar a minha senhora para dar o recado!!!! Vai ficar tudo bem. Vamos....

NARRADOR: Sr. Antonio e comitiva, saíram logo após instruções dadas à esposa do mesmo...

NARRADOR: já se passaram varias horas e ainda não haviam avistado a tal porteira de entrada da propriedade que iam visitar. O calor era muito forte...

PAI: Falta muito ainda? Estou preocupado com a volta... As meninas vão ficar lá na Vila nos aguardando ....

Sr. ANTONIO: Meu jovem, não se preocupe!!!! Hoje é dia de festa na Vila, e muitos eventos vão ocorrer ate a noite. Alem disso minha esposa já preparou acomodações para os senhores. São meus hospedes. Seus familiares estarão bem!!!!

PAI: Não sei como agradecer pelo que tem feito por nós, tem sido muito gentil e atencioso!!! Obrigado!!!

Sr.ANTONIO: É sempre um prazer ajudar as pessoas!!! Não tire esse pequeno mimo de um velho, na Vila não há muitas novidades e uma situação dessa merece toda a minha atenção!!!! Olha la´!!! Já chegamos.... Após aquelas arvores estaremos na propriedade da família Andrade.

NARRADOR: A família Andrade, uma das mais antigas da região , participaram da formação e fundação da vila. Família numerosa, composta de 14 membros, viviam ali desde que as primeiras casas foram erguidas. Graças a eles muitas tradições que ocorriam na região eram realizadas. Tudo para manter a historia viva da região e em função da vontade expressa da matriarca da família....

Sr.Antonio: Boas Tardes!!!! Ô de casa!!!! Podemos Entrar???

FAMILIA ANDRADE: Sejam bem vindos!!! Se aproximem!!! Venha tomar água e descansar um pouco ....

DECERAM DA CARROÇA E FORAM PARA SOMBRA NA VARANDA DA CASA.

FAMILIA ANDRADE: Como vai Sr. Antonio, quanto tempo? Vamos tomar um suco de frutas da região!!!! Vamos aproveitar esse momento e botar o papo em dia!!! Não é toda hora que recebemos visita!!!! Vó ..... Oh Vó? As visitas chegaram! A minha bisavó os aguardava desde cedo....

NARRADOR: A bisavó da família Andrade uma velhinha que tinha seguramente mais de 100 anos, nasceu na região e presenciou muitas mudanças ... Chamada a organizar quase que todas as festas da vila e principalmente para opinar em questões de relevância para a região , tinha uma influencia muito grande e poder de decisão nos rumos políticos da vila.....Apesar da idade, conservava uma lucidez e vivacidade muito grande.....

FAMILIA ANDRADE: Sente-se!!! Não fiquem acanhados!!! A casa é nossa!!!

NARRADOR: Após se acomodarem, foram feitas as apresentações.....

ENTRA A MATRIARCA DA FAMILIA ANDRADE

MATRIARCA: Sejam bem vindos meus filhos!!!!! Fizeram boa viagem???

Sr. Antonio: Boa tarde dona Dédé, muito me alegra vê-la assim tão disposta e feliz!!!! Esses são os amigos de que lhe falei.....

MATRIARCA: Sentem!!! Sentem!!!! Aceitam um cafezinho? Suco ou água talvez? (DISSE SORRINDO)...

MATRIARCA: Se aproxime filho.... (FALANDO COM O JUNIOR). Dê a benção a uma velha senhora.... que idade tem garoto?

JUNIOR: (SEM JEITO, ACANHADO) Boa tarde dona Dédé, sua benção!!!!

MATRIARCA: Adorei esse menino, viu que educação??? Deus lhe abençoe meu filho.... Venha e fique aqui ao meu lado....(FALOU DANDO UM PEQUENO SORRISO E MOSTRANDO A CADEIRA PARA JUNIOR).....

NARRADOR: Após se acomodarem, e de tomarem um suco de frutas. O pai da família Campos contou os fatos que ocorreram com eles e o motivo que os levava a procura-la....

MATRIARCA: Senhor Campos, não sei o que esta ocorrendo com sua família mas vou lhe contar fatos que ocorreram por aqui que podem elucidar suas inquietações..... Se acomodem todos que a história é longa......

MATRIARCA: Nasci em uma pequena casa à beira do rio. Muito próximo de onde a vila hoje se encontra.Fui uma das ultimas crianças que nasceram com a ajuda de parteira.....

MATRIARCA: Havia na região, três mulheres que se revezavam nos trabalhos de curandeiro, benzedeira e parteira... Naquela época não havia posto de saúde,remédios ou médicos na região....As coisas eram feitas em casa mesmo com o auxilio dessas pessoas.....

MATRIARCA: Minha AVÓ contava que eram três irmãs (Izabel, iracy e jacy).... Moravam em uma cabana pros lados da pedreira....Lá onde hoje o senhor mora.......Elas viviam dessas atividades... Minha avó contava que eram muito requisitadas na região... Se o individuo era picado por cobra, ou tava com dores no corpo por conta das mordidas dos insetos ou criança com mau olhado ou grávidas , lá estavam elas prestando atendimento...

NARRADOR: naqueles tempos em que a mãe de dona Dédé viveu quando criança, era muito comum o atendimento familiar, prestado por parteiras ou curandeiras. Era comum as crianças serem atendidos por benzedeiras.....E nesta região moravam então três irmãs, que se revezavam nas atividades de atendimento as pessoas das redondezas....Muito procuradas e respeitadas.....

MATRIARCA: Minha mãe Tinha por volta de 5 anos quando ocorreram fatos importantes na região.... Minha avó contou que houve um rigoroso inverno, com chuvas torrenciais que duravam dias..... Uma dessas chuvas , provocou a destruição de muitas casas que ficavam ao longo do rio.Inclusive fez com que meus avós viessem para Ca onde estamos ate hoje. Nossa pequena casa foi levada pelo rio também dias depois.....Muitas pessoas desapareceram naquela tarde noite terrível....

MATRIARCA: Naquele dia chovia muito e a Jacy, uma das irmãs, havia saído para um atendimento naquela manha não retornando mais..... dias e dias de buscas sem resultados....Meu avô foi um dos que liderou equipes de buscas a sobreviventes.....Alguns foram encontrados rio abaixo e outros ate hoje não se sabe o paradeiro..... Se não me engano, a Jacy ,que desapareceu naquele dia era a mais jovem entre as irmãs.....Uma perda terrível......

MATRIARCA: A Irma mais velha, Izabel, foi a que mais sentiu a perda..... Sentia-se culpada por não ter ido junto com a caçula. Acreditava que poderia ter evitado o fato se estivesse ao lado....

NARRADOR: Deprimida,Izabel passou a fazer os atendimentos em casa.Nesse mesmo período, construiu e colocou no ponto mais alto da pedreira, uma cruz e todas as manhãs recolhia pequenas flores e as colocava ao pe da cruz, na forma de ramalhetes, em homenagem a querida Irma. Iracy por sua vez, se desdobrava nos atendimentos às pessoas que não podiam se deslocar....às vezes chegava a beira da exaustão.... essa labuta perdurou por anos....ate que seu organismo não resistiu e veio a obto.....

MATRIARCA: Iracy foi enterrada no primeiro cemitério da cidade, junto com alguns dos construtores. Muito respeitada pelas suas atividades, Seu tumulo passou a ser visitado por romeiros que atribuíam a ela curas e graças alcançadas... Já Izabel ,então sozinha, revezava entre as visitas aos túmulos das Irmãs e os atendimentos em casa...

MATRIARCA: As visitas à vila foram ficando cada vez mais rara juntamente com os atendimentos..... Até que um belo dia cessaram por definitivo.... Ninguém soube ate então do paradeiro de Izabel..... Permanece um mistério ate hoje.....As terras ficaram por um bom tempo sem dono e depois que foram incorporadas ao poder publico, vocês são os primeiros moradores ....

APÓS RELATO DA MATRIARCA SEGUI-SE UM SILENCIO QUE SO FOI QUEBRADO MINUTOS DEPOIS PELA PROPRIA DONA DÉDÉ.

NARRADOR: Dona Dédé virando-se para os filhos mandou servir uns bolos para as visitas.... Após o lanche, o pessoal se retirou agradecidos pela acolhida e pegou o rumo da Vila. Teriam que apertar o passo para não chegar muito tarde da noite..... as revelações feitas pela Matriarca dançavam na cabeça do senhor Campos....

PAI: Relato surpreendente esse de Dona Dédé ... Será que os ocorridos La nas terras tem alguma relação? Preciso contar ao restante da família.....

Sr.ANTONIO: É meu amigo, muito a se entender..... Esse relato é fantástico!!!! Vivo aqui a tanto tempo e nunca tinha ouvido a história com tantas minúcias..... Sabia apenas da existência dessas irmãs que outrora prestou grandes serviços ao povo da vila.... Sei ate onde fica o tumulo de uma delas lá na vila.... É comum agente ir lá rezar quando tem alguém da família doente....

NARRADOR: O restante da viagem se deu em silencio, cada um envolto em seus pensamentos....

Sr. ANTONIO: Olha lá as luzes da vila!! Logo, logo estaremos em casa..... São lindas, não são??

JUNIOR: Muito bonitas seu Antonio, muito bonitas!!!!

Sr.ANTONIO: Animem-se garotos!! Vamos chegar tomar um bom banho e provar da deliciosa sopa da patroa!!! Dizem que levanta defunto!!!!! Teremos depois o restante da noite pra prosear!!!!

NARRADOR: E assim o fizeram....Chegaram, tomaram banho e após a deliciosa janta, foram para a varanda.... Seu Antonio então relatou de forma magistral tudo o que se passou com eles minuciosamente... Após a narrativa, todos se mantiveram pensativos...... Até que...

AVÓ: Pois bem, amanha quero conhecer esse tumulo da Iracy que esta na vila..... Sei que parece loucura, mas as respostas, se é que elas existem, só encontraremos lá em casa.... Retornaremos amanha e vamos nos organizar para buscar esclarecimentos!!! Por hora é melhor agente dormir que o dia foi cheio.....

NA MANHA SEGUINTE, NO CEMITÉRIO.......

NARRADOR: Todos sem exceção, vieram visitar o local onde as vestes carnais de Iracy foram depositados... Tratava-se de uma área simples com poucos adornos, quase que esquecida no meio do mato.... Sobrevivia apenas a lapide com o nome e um pequeno jarro de barro onde haviam flores depositadas pelos romeiros que ali passavam e que na gratidão de graças alcançadas e atribuídas a ela, rendiam agradecimentos.... Reinava um silencio e as famílias ficaram por alguns momentos imersos em pensamentos, aproveitando a paz e a harmonia que o ambiente externava....Por fim, eis que chegara a hora do retorno....

PAI: Precisamos nos por a caminho pois a jornada é longa e temos muito a fazer quando chegar....

NARRADOR: As famílias ali se despediram e cada uma retornou ao seu destino com renovados pedidos de cooperação e esforços para elucidar os fatos ate então conhecidos por todos...

DURANTE O TRAJETO PARA CASA MUITOS PLANOS SE DESENRROLAVAM

PAI: quando chegarmos lá eu e o Junior vamos à pedreira, lá na pedra alta, para ver essa cruz.... vocês dão uma olhadinha na vizinhança próximo da casa.... Ficamos ausentes quase dois dias e pode ser que tenhamos tido visitas....

AVÓ: Vou fazer os mesmos trajetos onde encontrei a senhora....Espero ter novidades....

MAE: (olhando para a filha) Ficaremos em casa e faremos uma verificação mais apurada das coisas....

NARRADOR: Chegando na propriedade se organizaram e cada grupo partiu para sua jornada....

NA PEDREIRA

PAI: Junior vamos subir por essa saliência. Parece que havia aqui uma antiga escada escavada na pedra....

JUNIOR: Pai olha aqui? Parece que tem um caminho pelo mato que vai ate La em cima.....Esta escondido atrás daqueles arbustos....

NARRADOR: Pai e filho seguiram pelo caminho encontrado ate a base da grande pedra..... O desafio era então subir ate o cume para alcançar o cruzeiro.... De onde estavam so dava para visualizar uma parte da cruz que se encontrava bastante desgastada pela ação do tempo......

PAI: Como faremos para subir? Não vejo nenhum acesso para o cume..... Como o pessoal subiu aqui?.....Se havia acesso, esse foi destruído a muito tempo......

JUNIOR: Pai !!!! oh !!! pai? Acho que havia uma escada improvisada deste lado...... vamos ter que escalar..... O senhor trouxe a corda? Vou ver se consigo subir por esse lado, aproveitando parte desse paredão.....Acho que é a melhor opção.....

PAI: Você tem razão.... Vamos tentar por ai......

NARRADOR: Depois de uma hora de escalada, pai e filho chegaram ao cume..... Lá encontraram o que poderia ser uma pequena capela feita com pedras... Ao lado desse agrupamento de pedras, erguia-se uma cruz e em sua base haviam flores depositadas.....Algumas inscrições ainda podiam ser lidas.... “para a querida Jacy, uma lembrança da sua eterna e doce presença entre nós...”

JUNIOR: Veja pai, olhe as flores, são recentes, alguém as colocou aqui......Como ??? Não vejo por onde subir se não por onde viemos....

PAI: É filho..... essa história esta cada vez mais envolta em mistérios...... Vamos olhar com calma..... Observe se há pegadas no entorno da cruz....

NARRADOR: ENQUANTO ISSO, NO SÍTIO.....

MAE: Filha , pega lenha no quintal pra ligar o fogo do fogão, pra gente fazer um café e botar algo pro jantar mais tarde... Vou abrir a casa para melhorar a ventilação. Ficou fechada dois dias....

NARRADOR: Enquanto a filha ia buscar a lenha, a mãe começou a abrir portas e janelas dos cômodos para melhor circulação do ar.....Ao chegar no quarto....

MAE: Ah!!!! Filha venha aqui rápido!!!! Oh!!!..... Meu Deus!!!! o que esta acontecendo???

FILHA: O que foi minha mãe? Que esta ocorrendo?? Encontrou a mãe sentada na cama....

MAE: (apontando pra mesinha de cabeceira) Olha!!!! Na mesinha.....As flores!!!! São novas!!!! Alguém as colocou ali hoje!!!!

FILHA: Tem certeza mãe? Como é possível??? Tudo fechado, não há sinais de arrombamentos....

NARRADOR: Mãe e filha se abraçaram e sentadas ficaram em silencio ate que......

ANCIÃ: Oh, de casa !!! Alguém ai? Oh, de casa!!!! Quem pode atender a uma pobre velha e cansada?? Alguém pode me servir um copo de água por favor??

NARRADOR: Mãe e filha pularam da cama como se tivessem sido mordidas por algo.....

FILHA: Valha-me Deus, quem será?? Agente faz o que mãe???

MAE: (após se refazer do susto) Não há de ser nada!!!.... Vamos ver quem esta na porta!!.....

NARRADOR: Eis que mãe e filha saem receosas para fora da casa..... E na varanda......

ANCIÃ: Que cara são essas?? Estão assustadas por quê??? Não mordo não!!!(disse a senhora com um sorriso bem humorado no rosto....

MAE: Desculpe senhora!!!! É que estamos tentando compreender algumas coisas que ocorrem por aqui....E chegamos da vila agora ....estamos cansadas.....

FILHA: A senhora quer se sentar? Quer um copo de água? Vou buscar...... Dizendo isso saiu pra dentro da casa em direção à cozinha....

ANCIÃ: (observando a garota) é um doce essa sua filha não é?? Parece ser uma garota muito agradável.... me lembra alguém que conheci a muito tempo....

MAE: (meio sem jeito) Ela é meu tesouro.... Sempre alegre....sempre disposta..... Só é meia assustada com coisas que não entende....

ANCIÃ: É normal minha filha....é normal..... (olhando para a fachada da casa) muito bonita essa fachada.... Pintaram de vermelho... Sabe? Vermelho é minha cor favorita.....

MAE: (Sentando em cadeira em frete para a senhora)... A senhora mora por aqui?

ANCIÃ: Sempre..... Mas, não fico muito em casa, sabe? Fico procurando meus parentes por essas bandas o tempo todo.....

NARRADOR: A filha voltou de dentro da cozinha com o copo de água para a senhora....

FILHA: A senhora aceita?.....

ANCIÃ: Se não for incômodo, poderia colocar aqui na mesa? Tomo já,já..... O que houve com sua perna? Tem uma cicatriz na coxa....

FILHA: Alguns dias atrás sofri um acidente, mas minha avó me ajudou a cuidar do corte......

ANCIÃ: Entendo....Olha!!!!Por essas bandas tem umas plantinhas que fazem verdadeiros milagres..... Olha ali na cerca!!!! Ta vendo aquele pequeno arbusto? Se você machucar as folhas novas daquela planta, essa cicatriz vai sumir rapidinho.....

FILHA: A senhora conhece plantas? Deve ser interessante saber lidar com elas... Sempre tive vontade de aprender sobre elas.... Desde pequena que fico pensando nisso.... Um dia vou trabalhar manipulando esse material....

ANCIÃ: Todas nós conhecemos..... todas nós conhecemos.....O pai do CEU nos deu esse dom... É só despertar .....

MAE: Não me leve a mal, mas a senhora me parece tão familiar? Não já nos vimos antes? Talvez na vila.....

ANCIÃ: Você sempre desconfiada hein??? Vim visitar umas pessoas por essas bandas que a muito tempo não via....Por certo já nos vimos..... Mas, me conte.... Qual a preocupação de vocês? Não vão me dizer que estavam com medo de mim..... Sou uma velha visitando parentes apenas....

MAE: Não, não nos leve a mal, trata-se de fenômenos que ocorreram por aqui algumas semanas e estamos tentando entender....

ANCIÃ: Se você me contar, pode ser que possa lhe ajudar.... Por que não tenta??? Adoro mistérios.....

NARRADOR: Os fatos foram contados para senhora que as houvia entre risos e consentimentos...

ANCIÃ: A história que você me contou é verdade.... Moravam aqui três irmãs .... Um dia a mais nova foi fazer um atendimento em propriedade depois da curva do rio e, naqueles dias, havia chovido muito... a ponte de madeira que era usada na travessia não resistiu com o peso dela e as forças das águas, cedeu e ela se afogou.Foi um momento de muita tristeza para as irmãs e para a comunidade que a conhecia.....Equipes de busca reviraram o leito do rio abaixo na tentativa de encontra-la sem sucesso.... O corpo dela estava em baixo da viga de madeira da ponte que cedeu. As águas do rio não conseguiu arrasta-la.Ficou sepultada naquele lugar.... Ela era tão meiga.... você garota, lembra muito ela.....

NARRADOR: Mãe e filha ouviam a narração da anciã quase sem respirar.....

ANCIÃ: Alguns anos depois a outra irmã, que também fazia atendimentos, adoeceu e veio a óbito. Ela era muito querida e a enterraram na vila em um terreno próximo a igreja onde costumava ficar quando ia a Vila...Ela gostava muito daquela área porque haviam muitas flores silvestres que exalavam um perfume muito agradável.Ela ficava horas ali sentada respirando cada momento...... A propósito, vocês possuem essas flores aqui.... Ali na entrada , depois da pedra , tem um canteiro cheio delas.....

FILHA:E a mais velha? O que ocorreu com ela? Porque ela sumiu?

ANCIÃ: Ela não sumiu..... Ela ficou sozinha, fazendo os atendimentos em casa mesmo e cuidando da propriedade e das coisas das irmãs...Os atendimentos é que ficavam cada vez mais escasso em função da dificuldade das pessoas vir e porque na vila já haviam médicos.....

MAE: Mas, ela desapareceu daqui e ninguém mais a viu.....

ANCIÃ: Ela nunca saiu daqui.....Sempre tomou conta da propriedade e das estufas de plantas das irmãs.....

MAE: Estufas de plantas? Tem mais de uma? Só conheço a que tem no quintal.....

ANCIÃ: Tem a que fica subindo a estrada, perto da encosta... Ta meio danificada por causa do deslizamento que houve muitos anos atrás. Você só consegue vê se chegar bem perto da encosta. O mato cobriu tudo ate a trilha que levava pra lá....

ANCIÃ: Gente.... ta ficando tarde e eu to ouvindo barulho de uma carroça vindo...Deve ser o pessoal que veio me buscar.... Deixa-me ir... (dizendo isso levantou da cadeira com uma agilidade impressionante....)

MAE: Aguarde os meninos chegarem, fique para o jantar..... Eles não vão demorar.....

ANCIÃ:Agradeço minha irmã, mas é chegada a hora de partir.... Mas ,não se preocupe, nos encontraremos de novo.....Fiquei muito feliz em vê-las..... Uma benção dos Céus..... Essa velha agora precisa descansar.....

MÃE: Espere!!! Vamos lhe acompanhar ate a porteira......Nos dê um tempo pra desligar o fogo...Vamos filha, me ajude a apagar o fogo... Rápido!!!! (Dizendo isso entraram mãe e filha para cumprir a tarefa)...

NARRADOR: Nesse meio tempo em que mãe e filha entraram, a Avó, pai e filho chegam quase que simultaneamente a entrada da propriedade..... Cansados, sentam na varanda para se refrescar......

AVÓ: Meninas, chegamos, cadê vocês???

JUNIOR: Pai!! Estou cansado.... Alguém quer água? Vim desejando beber um copo de água. Dizendo isso, pegou o copo que se encontrava sobre a mesinha e tomou ate o ultimo gole....

MAE: (vindo de dentro da cozinha) Que bom que vocês chegaram, já conhecem nossa vizinha??? Oh? cadê ela?

PAI: Cadê quem? Que vizinha? Você ta falando de que?.....

MAE: A senhora que estava aqui.. Estávamos conversando ate este momento....Fomos justamente desligar o fogão para acompanhá-la ate a porteira.

AVÓ: Filha!!! Sente um pouco aqui, e nos conte o que aconteceu na nossa ausência.....

NARRADOR: Mãe e Filha contaram tudo que ocorreu ate aquele momento....Sem ainda acreditar no que vivenciou.....

PAI: Acho que devemos ir nessa estufa que ela lhe falou.... Todos nós.... o que acham???

NARRADOR: Todos subiram na charrete e foram estrada acima ate o ponto da encosta. Apesar de morar já a alguns meses na propriedade, nunca tinham ido por ali, já que o caminho tinha sido destruído devido a um grande deslizamento de terra que houve....

PAI: Chegamos....Daqui em diante vamos a PE... Tomem cuidado!!!! Estamos muito perto da encosta!!! Se alguém escorregar cai.....

JUNIOR:Quer que eu vá na frente?

PAI: Vá Junior, depois vai sua mãe, sua Irma, sua avó e por ultimo eu. Cada um segura firme nessa corda!!!

NARRADOR: Após alguns minutos de descida, eis que chegam a uma pequena construção em ruínas escondida pelo mato e por restos de terra....

PAI:Não entrem ainda. Vamos observar o entorno... A estrutura não me parece segura.....

AVÓ: Ficarei aqui.... Estou muito cansada.... Descer por esse caminho exigiu muito de mim!!!

JUNIOR: Pai!!! Veja, tem um monte de anotações velhas La no fundo, na prateleira....

FILHA: Não dá pra arrastar aquele amontoado de coisas ali em cima daquele tapete? Pelo menos agente olhava aqui de fora sem correr riscos.....

PAI: Vamos ver!!!! Vou amarrar a corda na minha cintura e vou entrar... Vocês dois segurem na ponta... qualquer coisa me puxem...Entendido?

NARRADOR: Assim fez o patriarca da família, entrou e, com muito cuidado, foi se aproximando da área em que se encontravam as anotações..... com calma e paciência começou a puxar o tapete que se encontrava em baixo dos escritos deslocando-o lentamente e arrastando as anotações ate o lado de fora..... As três mulheres passaram a retirar a areia e pó que existiam sobre o material e a olhar com visível interesse.....

PAI: Junior, vou entrar de novo e verificar mais detalhado do outro lado... La me parece ter mais alguma coisa..... Fique atento....

NARRADOR: Na segunda vez que entrou, percebeu que haviam muitos utensílios de jardinagem e uma ampla cozinha no fundo.... Havia também, uma área que mais parecia ser feita de mesas estreitas e cumpridas....Provavelmente onde se preparavam ou manipulavam as coisas que iam ou saiam do fogo.....

NARRADOR: Do lado do balcão viu o que parecia ser o esqueleto de uma pessoa....Alguém havia morrido ali.... Pelo aspecto, já havia muitos anos ali.... Observando melhor percebeu que os ossos das pernas estavam quebrados.... Havia também, pendurada ao lado, uma bolsa de couro. Retirou a bolsa cuidadosamente e começou a se deslocar para a saída..... Nesse momento, ouviu-se um barulho muito forte, e quase que instantaneamente o teto começou a desabar.... Só teve tempo de chegar a porta... Se não tivesse sido rápido estaria ali, embaixo dos escombros que caíram.....

JUNIOR: Ainda assustado, observava o pai todo sujo de pó.... Foi por pouco..... Caiu tudo.... Não tem mais nada em PE....

MAE: Se machucou? O que você fez? Quer matar agente do coração? Não faça mais isso..... Olha!!! ninguém entra mais ai....

AVÓ: Gente!!!! Gente!!!! Vamos embora.... esses materiais que estão aqui no tapete, agente envolve melhor pra não molhar se chover e depois pegamos para analisar..... Por hora, já tivemos muitas emoções por hoje....

NARRADOR: Passado o susto, todos retornaram a varanda da casa em silencio.... e, após alguns minutos sentados......

FILHA: O que é isso ai pai? Que bolsa é essa? Tava lá na casa?

PAI:Foi a ultima coisa que peguei antes do desabamento... Estava junto ao esqueleto de alguém que morreu por lá.... Tome, olhe!!! Para ver o que tem dentro... Por hoje já chega de aventuras....

MAE: Filha!!! Vamos todos tomar banho, comer alguma coisa, que logo,logo vai anoitecer..... mais tarde , com calma, agente vê o que tem ai.....

NARRADOR: Assim foi feito... Tomaram banho, e comeram tranquilamente.... Após colocar as coisas da cozinha em ordem, foram para a varanda, conversar sobre tudo que havia ocorrido com eles ate então....

FILHA: (abrindo a bolsa de couro) Olhem, tem um nome quase que apagado aqui.... Parece ser .... IZABEL!!! É a bolsa da Izabel, a Irma que tinha desaparecido..... É verdade o que a senhora nos falou mais cedo, ela nunca saiu daqui.... Tem um caderno aqui dentro......

NARRADOR: Todos visivelmente interessados voltaram as atenções para o livro de Izabel.... Agora teriam chance de entender alguma coisa do que aconteceu por ali....

(LEITURA DO LIVRO DE IZABEL)

A quem possa interessa, sou Izabel, a primeira de uma família composta por três irmãs. Nossos pais eram agricultores e morreram muito cedo, deixando-nos órfãos... Muito cedo aprendemos a nos cuidar.... Aprendemos um pouco de cada coisa.... Nossos mãe era parteira e benzedeira e nosso pai entendia muito de plantas medicinais.... Aprendemos muito com eles...Graças a Deus.....Seus ensinamentos foram de grande valia... É a base de nossa sobrevivência..... Instalamos-nos por essas terras numa tentativa de recomeçarmos as nossas vidas... Começamos nossos atendimentos aqui, nessa pequena cabana ao PE da encosta..... Não tínhamos recursos para construir em um outro lugar....O fato é que aos poucos fomos nos tornando conhecidas na região e em troca de materiais e Mao de obra, construímos lentamente a nossa casa em um local mais seguro. Deixamos este ambiente aqui como uma lembrança dos dias iniciais que passamos....Boa parte das anotações feitas por nossos pais e posteriormente por nós mesmas ficaram guardadas por aqui...

N a nossa nova residência, tudo era lindo. Jacy tinha seu próprio quarto, Iracy o dela e eu o meu.... Revezávamos em atendimentos domiciliares e nos preparos dos xaropes tão importantes para a população local.... Vivíamos em harmonia..... Felizes...... Agradecidas a Deus e aos nossos ancestrais por nos guiarem e iluminarem ate então....

Foi ai que começou os revezes da vida.... Jacy tinha saído para atender uma parturiente prematura e na noite anterior havia chovido muito.... Pedi a ela que me aguardasse que iria com ela.....Ela por sua vez, preocupada com a minha saúde, que não andava boa naqueles dias, em função de forte gripe adquirida em semanas anterior de muito trabalho e pouco descanso, acordou mais cedo do que o normal e saiu a caminho sem me avisar.... Nesse dia acordei com um sentimento de angustia, com o coração apertado... Cheguei a comentar com a Iracy...Que muito prática, dizia:” deixa a menina andar com as próprias pernas Izabel, você com esse jeito de mãe de todos esta impedindo a Jacy de se desenvolver... Ela tem que experienciar e ter suas próprias conquistas....” O fato é que aceitei os argumentos de Iracy e fui fazer uns xaropes que me haviam solicitados na vila....

A trágica noticia nos chegou à noite, quando o pessoal da vila nos informou do ocorrido.... Algumas pessoas estavam sobre a ponte improvisada sobre o rio e esta não aguentou o peso e veio a cair... Entre as pessoas que estavam lá a Jacy era uma delas... A violência das águas arrastou tudo que pode.... Algumas foram encontradas logo em seguida no rio abaixo e outras so alguns dias depois.... O corpo de Jacy não foi encontrado pelas equipes de busca.....Havia desaparecido sem deixar rastros.....

Ficamos abaladas: Eu e Iracy. Um turbilhão de sentimentos nos assaltava. Era como se uma parte de mim tivesse sido arrancada....Tempos difíceis!!! .... Em fim, tínhamos que continuar nossas atividades...... Eu, atendendo em casa e Iracy se desdobrando entre uma visita e outra.

As nossas vidas ficaram um pouco vazias sem a presença de nossa caçula..... Mas o contato com a população carente que nos procurava nos alimentava e nos fortalecia...... Alem disso, todos os dias colocávamos flores , como forma de homenagem, colocávamos umas flores no pe de um cruzeiro erguido no alto da grande pedra lá na pedreira. Erguida pelo pessoal que trabalhava por lá na época... Alguns anos se passaram desde o episodio da Ponte.

Já não recebíamos tantas visitas como antes. Haviam poucas pessoas a visitar.... Sobrevivíamos basicamente das medicações que fazíamos a partir das ervas que cultivávamos....

Passávamos mais tempo cultivando plantas e testando os princípios ativos do que em atendimento externo.... Tínhamos mais tempo para conversar.... Pensar.....

Mesmo com poucos atendimentos dava para viver sem problemas....Uma bela noite, conversando com Iracy uma idéia quase que simultânea nos assaltou..... Vamos procurar o corpo ou o que restou dele no leito do rio da nossa querida Jacy. Iríamos ocupar nosso tempo ocioso nessa busca.....Essa atitude nos revigorou e deu um animo a mais.....

Começamos nos dias subsequentes a por em pratica a ideia..... Eu, passei a correr o rio nas proximidades da ponte e Iracy nos povoados ao longo do rio.

Menos de um mês, eis que conversando justamente nas proximidades da ponte velha onde houve o acidente, encontramos o pingente que Jacy usava..... Nossa mãe, deu a cada uma das filhas um pingente com uma cor especifica.... O de Jacy era azul, a Iracy verde e a minha vermelha......

Ao encontramos o pingente fomos mais a fundo na verificação, e descobrimos os restos mortais de Jacy em baixo da viga principal que havia desabado por ocasião do acidente..... Foi uma mistura de sentimentos muito grande, entre risos e choros , fizemos nossas orações de agradecimento por ter finalmente encontrado...Um peso tinha sido tirado das nossas costas.Nos sentíamos leves.... Nessa noite, voltamos para casa felizes e pela primeira vez, dormimos bem.....

A nossa rotina permaneceu a mesma.... Fazíamos os atendimentos e os preparos das medicações....Estudávamos nas horas vagas.... Cuidávamos das plantas medicinais que tínhamos plantado nas estufas.... Começamos a montar um acervo de tudo que tínhamos desenvolvido... Guardávamos tudo na primeira morada, lá na encosta.... Já haviam muitos livros organizados por tipo de doenças que tratamos ao longo dos anos.... Tudo ia bem.... Ate que a Iracy caiu doente....Uma infecção nos pulmões que tirou sua vitalidade numa velocidade assustadora... De tudo fiz para combater a enfermidade, mas a infecção foi mais forte..... Não havia medicamento conhecido que eu não usasse no tratamento.....Nada surtia efeito..... Dormia pouco em vigília constante ao lado da cama.....

Uma dessas noites.... Iracy dormia um sono mais tranquilo.... Havia administrado umas ervas novas que encontrei no campo...Estava animada com os resultados.... Ai, vi a Jacy.... Não acreditava no que via mas meu coração se encheu de alegria, ela ficou ali sorrindo pra mim por um tempo...Momento depois acariciou o rosto da Iracy do mesmo jeitinho que fazia quando em vida.... Foi uma visão maravilhosa.... Chorei e agradeci a Deus pelo presente recebido......

Adormeci como a muito tempo não ocorria..... Sonhei com elas ,e, em meus sonhos Iracy aparecia radiosa e linda... Me dizia que não me preocupasse com ela que era necessário o que estava ocorrendo....Que a Jacy já alguns dias nos visitava e que veio acompanha-la de volta para casa....Nos abraçamos e assim permanecemos por um bom tempo..... No dia seguinte, acordei tarde e fui ao leito de Iracy encontrando-a já sem vida.... Percebi naquele momento que fora uma despedida e ali fiquei por um tempo.....

Nos dias que se seguiram, fiz o enterro, com o auxilio do pessoal da vila, no local que ela sempre ficava quando ia à vila.... Sempre cercada de flores .... Recolhi seus pertences e guardei o pingente que nossa mãe nos tinha dado quando em vida.... Voltei para casa e prometi a mim mesma não mais sai dali, ate o momento de nos reencontramos.... Tinha firme certeza que seria ali....

Os anos se passaram, as pessoas passaram a não ir mais lá ... Muitos por conta da distancia e outros porque a vila havia crescido e já existiam profissionais médicos residentes no local......

Vivia minha rotina entre o cultivo das plantas, e do que produzia para minha subsistência.....

Comecei a organizar nossas anotações da mesma forma que antes quando Iracy ainda era viva.... Tinha tomado a decisão de retirar tudo da casa da encosta e trazer para essa outra.... Era mais seguro e mais perto... Não havia mais sentido ficar por lá.. O mato já havia tomado conta do local e o perigo de deslizamentos estava ficando mais frequentes....

Uma semana de chuvas ocorreram e em função disso resolvi retirar as poucas coisas que ainda tinham por lá alem das nossas anotações..... Comecei a organizar tudo em cima de um tapete para fazer uma triagem e depois retira-los de La quando parte do barranco cedeu e derrubou a viga principal da casa. Quase não tive tempo para me esquivar..... Sai viva, mas a viga ao partir veio de encontro ao meu corpo e tive as pernas fraturadas. Sem poder andar, so me arrastando, fiz o que pude para prolongar meus dias aqui..... Quando percebi que havia a possibilidade de não sair dali viva, decidi escrever essa ventura para aqueles que em algum momento pudessem chegar aqui, conhecer e fazer bom uso do material que reunimos.... Dentro da sacola estão os nossos pingentes, lembrança viva do amor e carinho dispensados pela nossa mãe.... Aqui ficarei como prometido ate o retorno de minhas irmãs.... Com amor, Izabel.....

NARRADOR: Após a leitura, todos visivelmente emocionados, de forma espontânea, fizeram fervorosa prece em homenagem as irmãs e se recolheram em silencio , cada um envolto em pensamentos.....Naquela noite, viva luz emanava das estrelas que banhava aquela propriedade de forma especial.....