Corda para se enforcar
O telefone da central da polícia tocou numa tarde de segunda às 14:30h. E ao ser atendido, do outro lado da linha uma mulher em prantos, desesperada, gritou que seu marido ameaçava se enforcar. Pedindo socorro o mais rápido possível, informou seu endereço antes mesmo de ser solicitado.
— Fique calma, senhora, uma viatura já está a caminho.
Muito depressa a atendente apertou um botão no telefone e acionou a linha da viatura da área. Então repassou as informações aos policiais e reforçou que a ameaça ainda não havia sido consumada e por isso era preciso rapidez.
Mas, infelizmente, por mais rápido que tenham sido, quando os policiais chegaram ao endereço, o homem já estava morto, pendurado pelo pescoço.
— Sinto muito, senhora. Já chamamos o IML... Chegamos tarde — disse um policial ao outro enquanto saíam da casa para conter a vizinhança.
A mulher, sentada no sofá da sala, abraçava o filho com força, mas não dizia nada, porque não conseguia. Só chorava e chorava forte, às vezes gritado, quando relembrava a cena. Já o filho, pobre menino, com a cabeça no peito da mãe, estava anestesiado e em um estado de completa solidão; seu olhar vago, fixo no corpo do pai, que via pela porta aberta do escritório. Seus pensamentos, embaraçados.
— Nós vamos superar, filho, a mãe ainda está aqui com você, tudo bem? — Pôs as mãos em volta do rosto do menino e colocou-o em frente ao seu: — Olhe pra mim, filho. Não fique assim, tá? Não chore, a mãe está aqui — voltou a abraça-lo com ainda mais força.
De repente, a maca de transporte do IML (Instituto Médico Legal) entrou pela porta da sala, sendo carregada por dois legistas vestidos de branco. A mulher apenas apontou o dedo em direção ao escritório.
Com as luvas postas, um dos legistas levantou a cadeira caída embaixo do morto e posicionou-a um pouco mais afastada. Quando subiu, ficou na altura do pescoço do homem. Então o legista que estava no chão levantou o corpo e o nó foi desfeito. O outro lado da corda estava atado a um ventilador de teto, e mais alto do que os legistas podiam alcançar.
— É preciso uma escada para desamarrar...
— Não é trabalho nosso... Segure firme e trave a maca... Isso. Agora feche o saco.
O maca passou pela sala e a mulher se levantou. Os legistas pararam quando ela se aproximou vagarosamente. Um deles abriu o saco.
— Por que você foi se matar? Me diz, por que fez isso com a gente? — Jogou-se sobre o corpo do marido mas foi contida imediatamente.
— A senhora pode nos acompanhar?
— Acho que... — sua voz estava embargada — Vou avisar meu filho... — quando olhou para o sofá, o menino não estava ali. — Espere só um minuto, só tenho que avisar... — deu alguns passos para trás e, num relance, num mísero segundo, enxergou outro corpo pendurado no maldito nó — Não! — o grito foi tão alto que os policias correram para dentro da casa. A mulher desmoronou no chão.
— O que aconteceu? — perguntou um policial.
— O filho... — respondeu um legista.
— Não pode ser. Temos de tirar aquela corda de lá. Arrume uma escada com algum vizinho.
Minutos depois, dois corpos estavam sobre duas macas. Mas a corda permanecia pendurada no mesmo local. Nenhum dos vizinhos tinha uma escada.
— Suba na mesa do escritório, ora. Deve ter sido assim que foi amarrada.
Nessa hora a mulher se levantou do chão e entre soluços e falhas na voz, conseguiu dizer para que não retirassem a corda. E quando correu para o escritório, os policiais a seguiram, temendo o pior. Detiveram a mulher em frente a cadeira.
— Acho melhor a senhora não ficar aqui. Esse ambiente...
— Eu não vou me matar. Só quero ficar no lugar onde meu marido e filho morreram. Só quero ficar sozinha.
Os policiais então concederam espaço e se afastaram do escritório. Mas, infelizmente, a mulher não teve escolha, e assim que subiu na cadeira e passou a mão pela corda, também se enforcou.
Quando, tardamente, um dos policiais tomou uma faca e subiu sobre a mesa do escritório... não deveria ter tocado na corda.