Nono, Nonó, ou Nonô...?

Ao Doutor Agenor Cançado é, entre outros feitos, atribuída a proeza de haver salvo das chamas a imagem de Nossa Senhora do Pilar, quando do incêndio da Igreja-Matriz de Pitangui em 1914. Ato mais que de coragem, pois muita gente comentava que a referida imagem, em situação normal de transporte, requeria a força combinada de quatro homens.

Agenor, em plena juventude então, tornou-se figura benquista, abraçou a medicina e continuou a viver na Velha Serrana, salvando vidas, consolando e até apadrinhando. Um de seus afilhados é o José Rodrigues Santiago, o Zé do Vô, ou simplesmente Vovozinho, fllho de um Zé Vovô, nascido, se não me falha ou desfolha a memória, em 1932. Sem jamais sair da cidade, Vovozinho foi barbeiro por décadas a fio e na aposentadoria toca um barzinho modesto adjunto à sua residência que sempre foi no Beco dos Canudos e só deixou de sê-lo, quando o dito e bendito Beco passou a ser designado Rua Chiquinho Teodoro, numa homenagem da Câmara de Vereadores a um dos próceres do serrano torrão de Pitangui.

E foi justamente de Vovozinho que ouvi a revelação de sua afilhadagem ao

Dr Nonô Cançado e, mais interessantemente, de uma revelação que o padrinho, já bem avançado em anos lhe fizera:

- José, veja você, cliniquei a vida toda nesta cidade e vou lhe dizer: não fosse eu ter uma horta no quintal, teria morrido de fome, inanição fatal.

E o dito Doutor Nonô Cançado hoje dá nome à minha rua, ou seja à ruela onde me criei, desde mudado do Brumado para Pitangui, em junho de 1958. E que nem rua era então, mero beco sem saída, à qual Papai com sua expediência para definições - antes que os edis do burgo se interessassem por aquele pedaço de chão - apodou-o Segunda Travessa São José. E por quê? Pela razão singela de que, saindo do largo de São José, onde há uma mais que centenária igrejinha, já havia uma primeira travessa, essa sim, mais antiga e com saída para a rua da Paciência, e que mais tarde viria a ganhar foro de nomeação, também em homenagem a outra notável figura da cidade, o músico Quito Nunes.

O nome sugerido por Papai não pegou formalmente. Beco-sem-Saída era forma mais explícita, e pronto. E quando o beco foi finalmente aberto, e virou rua, aí foi mano Beu que o pé bateu: queria porque queria, e até plaquinha fez para nomeá-lo singularmente Avenida Mao Tse Tung. A moção não chegou aos ouvidos dos nobres edis, que optando por uma solução doméstica, homenagearam o Doutor Nonô Cançado. E as duas placas metálicas que ocupam início do citado trajeto, aproximam-se bastante do intenção dos legisladores municipais: uma delas lê Rua Dr Nonó Cançado e a outra, Dr Nono Cançado. Falhou, tá falhado...

Mas com pelo menos uma horta, modesta, de nosso lado.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 25/11/2017
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