A insólita presença no cemitério
Ana e Suzane eram grandes amigas, desde os tempos de infância confidenciavam inocentes segredos, brincavam e faziam planos para o futuro. Em suas mentes criativas muitas aventuras eram cuidadosamente criadas, as quais sempre tinham os finais mais surpreendentes, e claro, felizes.
A vida, infelizmente, não é tão cor-de-rosa quanto as meninas acreditavam. Os anos foram passando, a adolescência chegou. Ana continuava com sua vida simples, sem grandes pretensões. Filha única, tinha todos os agrados possíveis. Bonita e delicada, logo arranjou um namorado com quem pretendia em breve casar-se.
Suzane era o oposto de Ana. Menina não tão doce, almejava crescer na vida, ter uma profissão importante, levar uma vida diferente da que tinha até então. A simplicidade não era algo que definitivamente a agradava.
Filha de pais muito humildes, a sorte não a agraciava. Beleza, tinha, porém a rudeza em seu olhar e a revolta por ter uma vida tão dura não a fazia sorrir, o que de veras a atrapalhava muito, assim, não tinha namorado.
Certo dia a família recebeu uma nova oferta de emprego. Trabalho pesado em uma marcenaria. Não seria fácil, deveriam morar nos fundos do estabelecimento para cuidar do local, visto não ser muito bem localizada e sempre havia tentativas de invasão ao local.
A princípio a dúvida surgiu, mas devido as atuais circunstâncias a família de Suzane não podia recusar a oferta, sendo que o salário razoavelmente bom os ajudaria e muito naquele momento de dificuldade.
O dia de se mudarem chegou. Muita coisa iria mudar na vidas daquelas pessoas. Se instalaram na pequena casa com dois quartos nos fundos da marcenaria. Qual a surpresa de Suzane quando viu Ricardo, o dono da marcenaria. Homem alto, bonito, em torno de seus quarenta anos, aparentava bem menos. Foi uma obsessão instantânea. A rude garota não queria nem saber se Ricardo era casado, tinha filhos ,nada disso a impediria de tentar conquistá-lo a qualquer custo.
Os dias passaram e como era de se esperar Ricardo não resistiu aos jovens encantos de Suzane que não impôs limites para encantá-lo.
Meses e meses de um relacionamento proibido. Suzane pretendia tirar alguma vantagem, não financeira, mas ela queria ter o prazer de vê-lo refém de seus caprichos e disponível sempre que ela assim quisesse. Logo a relação que era secreta passou a ser propositalmente escancarada por Suzane, claro, situação desmentida cinicamente por Ricardo. A essa altura Ana que era sua única amiga, que ainda suportava suas loucuras, começou lentamente a se afastar, o que deixou Suzane ainda mais revoltada. Em sua visão ninguém a entendia, ninguém se preocupava com seus sentimentos. Esse sentimento a fez ir mais longe. Ameaças à família de seu amante começaram a ser feitas e Ricardo não estava nada satisfeito com isso. Tentou por fim ao relacionamento, entretanto, ele não sabia que seria tão difícil.
Amanda, a esposa de Ricardo sabia que algo estava acontecendo, desconfiava de Suzane, mas não sabia o que fazer. Era uma pessoa bastante fria, não agia por impulso, dessa forma, qualquer ato seu seria muito bem pensado. Então, decidiu esperar pelo desfecho da história e resolveu que só agiria se fosse realmente necessário.
Em uma manhã de domingo Suzane não hesitou em bater na porta de Ricardo. Assustado, o amante saiu correndo puxando-a pelo braço antes que sua mulher percebesse algo. Saíram pelos fundos para não serem vistos e foram a uma pequena praça ao lado da casa, não havia movimento algum, e ali puderam conversar. Uma inesperada novidade abalou as estruturas de Ricardo, Suzane estava grávida, sim e não era mentira. O homem enlouqueceu, não podia concordar com aquilo! E agora, o quê fazer? O que seria de sua vida? De seu casamento? De sua reputação? e seus filhos o que iriam pensar? E a família de Suzane? Não, isso não estava nos planos dele, definitivamente.
Por uma semana esse "problema" tirou o sono de Ricardo. Amanda sentia isso e sabia que algo tinha a ver com Suzane, só podia.
A próxima sexta-feira seria um feriado e a família de Suzane foi dispensada do trabalho, assim resolveram viajar para rever alguns parentes, no entanto, claro, Suzane não quis ir. Ficou sozinha. Ricardo e Amanda não quiseram viajar, apenas mandaram seus filhos para a casa da avó, que morava em um bairro vizinho.
O dia amanheceu, em outra cidade Ana levantou-se cedo para uma caminhada, como sempre fazia quando tinha oportunidade. Ela estava viajando com o namorado, tinham ido pesquisar casas para comprar, pois havia decidido se casar em breve e naquela cidade seu futuro marido iria trabalhar. Porém, saiu sozinha para a caminhada, pois ele sequer havia acordado. Quando estava retornando resolveu cortar caminho, esse trajeto passava por um pequeno cemitério, bem antigo, praticamente desativado. Ali descansavam apenas figuras importantes da região, túmulos antigos e mal conservados, apesar da importância de seus moradores. Ana não gostava nem um pouco de cemitérios, mas naquele dia ela sentiu como se algo a convencesse a entrar. Pensou, achou melhor não, estava voltando a caminhar, quando deu mais uma olhada, e lá estava alguém. alguém que não lhe era muito estranho. Olhou mais um pouco e reconheceu. Era ela, Suzane, sim Suzane estava lá. Mas o quê sua amiga estava fazendo ali? Então Ana resolveu ir ao seu encontro, já que ela estava bem na porta de entrada. Quando Ana atravessou a rua em direção à entrada do cemitério Suzane se distanciou um pouco, Ana a chamava, mas a moça não respondia. Ana já estava indignada com a brincadeira, Suzana sabia que ela tinha medo, então porquê estava fazendo isso? Quando Ana chegou na entrada olhou atentamente, e lá no fundo do cemitério entre os túmulos estava Suzane e ao seu lado um pequeno bebê com uma aparência muito estranha. Ana não acreditou no que estava vendo, questionou o que estava acontecendo e sem dizer uma única palavra, apenas com um olhar triste e distante Suzane desapareceu em meio aos túmulos e estátuas caídas de anjos e santos.
Ana por um momento acreditou ter tido uma ilusão, mas ao mesmo tempo era tão real, ela não entendia mais nada. Voltou correndo para o hotel onde estavam hospedados. Guilherme, seu namorado estava estupefato frente ao seu notebook, onde via por meio de um site a triste notícia de que um incêndio criminoso, o qual não deixara evidências de seu autor, havia feito uma vítima fatal em uma casa simples ao lado de uma marcenaria, e a foto de Suzane ao lado da reportagem, não deixara dúvidas...