O Psicopata do Celular
Final
Patrícius Eulália ao retornar do fundo da casa pelo mesmo corredor, percebeu que uma janela poderia estar destrancada.
Não precisou forçar muito, o trinco de uma das folhas de madeira da janela cedeu quando Patrícius Eulália penetrou na casa. Trombou com o corpo de Xavier Xamã pendurado por um fio de arame galvanizado.
O arame estava amarrado numa vigota de madeira que passava pelo meio da sala, o telhado de barro, tinha algumas telhas de vidro, assim, apesar da casa estar toda fechada, havia luz em abundância no interior da sala.
Eulália observou que o arame iria continuamente apertar o pescoço de Xavier, pois foi feito um laço e aos poucos, de tanto apertar, logo começaria a sangrar, se o corpo não fosse retirado logo, possivelmente a cabeça se separaria do corpo.
Observando cuidadosamente a sala, Eulália percebeu que o computador estava ligado. Em poucos minutos, achou o programa do aplicativo. Pensou rapidamente e decidiu: enviou mensagens para as escolas sobre o aplicativo, para vários colegas usando o e-mail de Xavier e com a conta dele no Youtube, repassou o programa explicando para não baixarem aquele aplicativo.
Antes de sair da casa, Patrícius Eulália olhou minuciosamente o corpo do colega do irmão, pegou uma cadeira, subiu e olhou bem no rosto do falecido. A boca estava semicerrada. Com a lanterna do celular, olhou mais detidamente a língua, percebeu algo estranho preso entre os dentes de cima.
Patrícius pegou uma ramona do cabelo e puxou o que havia dentro da boca do enforcado, era um trapinho preto. Com cuidado, colocou dentro de um saquinho plástico, desceu da cadeira, colocou-a no lugar, aproximou-se da porta da sala e pelo vidro da porta, viu que a rua estava vazia. Abriu a porta lentamente e ao passar bateu a porta com um pouco mais de firmeza, assim a porta travaria por dentro.
Ao descer as escadas que chegavam no jardim, um brilho lhe ofuscou rapidamente os olhos. Patrícius retrocedeu alguns passos, agachou e viu um metal entre as folhas: era um alicate, pegou-o e levou consigo.
Quintino observava a casa do amigo, escondido num terreno baldio em frente. Esperou a irmã sair, aguardou por algum tempo no mesmo local e após uns vinte minutos, por meio de um instrumento adaptado, olhou tanto para direita quanto para a esquerda: a rua estava vazia, saltou facilmente o muro e rumou para casa.
Um instinto estranho, mas muito intenso perpassou por Eulália. Ao chegar em casa, foi direto para a área de serviço. Olhou dentro da máquina de lavar roupas, haviam várias peças de roupas. Tirou todas e repôs novamente na máquina, quando iria jogar uma calça de Quintino, percebeu algo no bolso de traz.
Dentro do bolso havia uma luva, neste instante, o coração dela bateu lentamente. Um sentimento triste lhe abateu com tal intensidade que começou a chorar baixo, com as lágrimas sulcando-lhe a pele do rosto. Eulália abriu todos os dedos das duas luvas, a ponta do dedo indicador direito estava rasgado.
A emoção e o medo de descobrir algo do irmão lhe machucava demais o peito. Pegou o pedacinho de pano que trazia no saquinho plástico, era o pedaço que faltava no dedo da luva.
A emoção, a tristeza e o desalento foi tanto que Patrícius Eulália prostrou-se sentada no chão. De costas para a porta, não ouviu nem percebeu que Quintino estava atrás dela: num movimento rápido, com o braço esquerdo, segurou o pescoço dela como se estivesse lhe dando um golpe de artes marciais e com a mão direita aplicou- lhe uma injeção.
A agulhada não doeu, pois, a melancolia lhe havia deixado em um estado de torpor, uma letargia absurda. Olhou para trás e viu na mão do irmão uma seringa com um restinho de um líquido esbranquiçado.
Eulália não ofereceu nenhuma resistência. O irmão lhe pegou no colo e levou-a até o seu quarto, colocou-a na cama, cobriu-a com uma colcha de retalhos e sentou se aos pés da cama olhando-a como se fosse carinhosamente. Eulália sabia que iria morrer rapidamente, o liquido era uma dose letal de barbital.
Patrícius Eulália chorou candidamente pelo irmão, pela indiferença dele para o mundo, pela sua insensibilidade com as pessoas, com os animais e com as coisas. Não lhe segurou as mãos, preferiu ficar naquele instante com ela mesma, com suas lembranças, suas alegrias. Reviveu cada sentimento de bem-estar que viveu, virou se de lado, colocou as duas mãos juntas por debaixo do rosto e dormiu.
Quintino olhou para o relógio que trazia no bolso da calça, foi até o quintal, pegou algumas ferramentas, retornou para o quarto dela. Puxou a cama para o lado e abriu um buraco no chão. Colocou o corpo da irmã dentro de um saco plástico muito resistente e fechou para não sair nem um mal cheiro.
Colocou o corpo na vala, a terra cuidadosamente por cima, pegou a cerâmica que havia retirado com todo o cuidado e assentou-as exatamente como dantes. Colocou a cama no lugar de sempre. O restante da terra, levou até o quintal, espalhou e jogou bastante água.
Quintino foi até o banheiro, tomou banho, vestiu seu melhor terno, seu sapato de cromo alemão. Certificou-se de que a casa estava toda fechada. Foi para o seu quarto, deitou-se na cama exatamente como viu sua irmã pela última vez.
Quintino até tentou chorar, mas nunca conseguiu. Tentou se arrepender, mas tudo era indiferente para ele. O que lhe incomodava era não entender por que ele era tão indiferente com tudo e com todos, que o sofrimento dos outros lhe causava um momento de paz, mas logo uma tormenta lhe assolava a razão.
Assim como Patrícius Eulália se foi desta vida, Quintino se foi também. O irmão morreu no trigésimo dia. Ele faleceu sem perder a consciência em nenhum momento. Não saiu da cama para beber ou comer, morreu exatamente como deitou na cama: deitado de lado com as duas mãos juntas debaixo do rosto.
Final
Patrícius Eulália ao retornar do fundo da casa pelo mesmo corredor, percebeu que uma janela poderia estar destrancada.
Não precisou forçar muito, o trinco de uma das folhas de madeira da janela cedeu quando Patrícius Eulália penetrou na casa. Trombou com o corpo de Xavier Xamã pendurado por um fio de arame galvanizado.
O arame estava amarrado numa vigota de madeira que passava pelo meio da sala, o telhado de barro, tinha algumas telhas de vidro, assim, apesar da casa estar toda fechada, havia luz em abundância no interior da sala.
Eulália observou que o arame iria continuamente apertar o pescoço de Xavier, pois foi feito um laço e aos poucos, de tanto apertar, logo começaria a sangrar, se o corpo não fosse retirado logo, possivelmente a cabeça se separaria do corpo.
Observando cuidadosamente a sala, Eulália percebeu que o computador estava ligado. Em poucos minutos, achou o programa do aplicativo. Pensou rapidamente e decidiu: enviou mensagens para as escolas sobre o aplicativo, para vários colegas usando o e-mail de Xavier e com a conta dele no Youtube, repassou o programa explicando para não baixarem aquele aplicativo.
Antes de sair da casa, Patrícius Eulália olhou minuciosamente o corpo do colega do irmão, pegou uma cadeira, subiu e olhou bem no rosto do falecido. A boca estava semicerrada. Com a lanterna do celular, olhou mais detidamente a língua, percebeu algo estranho preso entre os dentes de cima.
Patrícius pegou uma ramona do cabelo e puxou o que havia dentro da boca do enforcado, era um trapinho preto. Com cuidado, colocou dentro de um saquinho plástico, desceu da cadeira, colocou-a no lugar, aproximou-se da porta da sala e pelo vidro da porta, viu que a rua estava vazia. Abriu a porta lentamente e ao passar bateu a porta com um pouco mais de firmeza, assim a porta travaria por dentro.
Ao descer as escadas que chegavam no jardim, um brilho lhe ofuscou rapidamente os olhos. Patrícius retrocedeu alguns passos, agachou e viu um metal entre as folhas: era um alicate, pegou-o e levou consigo.
Quintino observava a casa do amigo, escondido num terreno baldio em frente. Esperou a irmã sair, aguardou por algum tempo no mesmo local e após uns vinte minutos, por meio de um instrumento adaptado, olhou tanto para direita quanto para a esquerda: a rua estava vazia, saltou facilmente o muro e rumou para casa.
Um instinto estranho, mas muito intenso perpassou por Eulália. Ao chegar em casa, foi direto para a área de serviço. Olhou dentro da máquina de lavar roupas, haviam várias peças de roupas. Tirou todas e repôs novamente na máquina, quando iria jogar uma calça de Quintino, percebeu algo no bolso de traz.
Dentro do bolso havia uma luva, neste instante, o coração dela bateu lentamente. Um sentimento triste lhe abateu com tal intensidade que começou a chorar baixo, com as lágrimas sulcando-lhe a pele do rosto. Eulália abriu todos os dedos das duas luvas, a ponta do dedo indicador direito estava rasgado.
A emoção e o medo de descobrir algo do irmão lhe machucava demais o peito. Pegou o pedacinho de pano que trazia no saquinho plástico, era o pedaço que faltava no dedo da luva.
A emoção, a tristeza e o desalento foi tanto que Patrícius Eulália prostrou-se sentada no chão. De costas para a porta, não ouviu nem percebeu que Quintino estava atrás dela: num movimento rápido, com o braço esquerdo, segurou o pescoço dela como se estivesse lhe dando um golpe de artes marciais e com a mão direita aplicou- lhe uma injeção.
A agulhada não doeu, pois, a melancolia lhe havia deixado em um estado de torpor, uma letargia absurda. Olhou para trás e viu na mão do irmão uma seringa com um restinho de um líquido esbranquiçado.
Eulália não ofereceu nenhuma resistência. O irmão lhe pegou no colo e levou-a até o seu quarto, colocou-a na cama, cobriu-a com uma colcha de retalhos e sentou se aos pés da cama olhando-a como se fosse carinhosamente. Eulália sabia que iria morrer rapidamente, o liquido era uma dose letal de barbital.
Patrícius Eulália chorou candidamente pelo irmão, pela indiferença dele para o mundo, pela sua insensibilidade com as pessoas, com os animais e com as coisas. Não lhe segurou as mãos, preferiu ficar naquele instante com ela mesma, com suas lembranças, suas alegrias. Reviveu cada sentimento de bem-estar que viveu, virou se de lado, colocou as duas mãos juntas por debaixo do rosto e dormiu.
Quintino olhou para o relógio que trazia no bolso da calça, foi até o quintal, pegou algumas ferramentas, retornou para o quarto dela. Puxou a cama para o lado e abriu um buraco no chão. Colocou o corpo da irmã dentro de um saco plástico muito resistente e fechou para não sair nem um mal cheiro.
Colocou o corpo na vala, a terra cuidadosamente por cima, pegou a cerâmica que havia retirado com todo o cuidado e assentou-as exatamente como dantes. Colocou a cama no lugar de sempre. O restante da terra, levou até o quintal, espalhou e jogou bastante água.
Quintino foi até o banheiro, tomou banho, vestiu seu melhor terno, seu sapato de cromo alemão. Certificou-se de que a casa estava toda fechada. Foi para o seu quarto, deitou-se na cama exatamente como viu sua irmã pela última vez.
Quintino até tentou chorar, mas nunca conseguiu. Tentou se arrepender, mas tudo era indiferente para ele. O que lhe incomodava era não entender por que ele era tão indiferente com tudo e com todos, que o sofrimento dos outros lhe causava um momento de paz, mas logo uma tormenta lhe assolava a razão.
Assim como Patrícius Eulália se foi desta vida, Quintino se foi também. O irmão morreu no trigésimo dia. Ele faleceu sem perder a consciência em nenhum momento. Não saiu da cama para beber ou comer, morreu exatamente como deitou na cama: deitado de lado com as duas mãos juntas debaixo do rosto.